quarta-feira, março 23, 2011

QUE ESPERANÇA?


Na terrinha que me viu crescer havia uma expressão: “Que esperança.” Era um desespero! “Vamos lá?” “Que esperança.” “Posso?” “Que esperança”. Criança que ouvisse dessa (des)esperança podia tirar o cavalo da chuva. Eu não entendia muito bem essa coisa de cavalo na chuva, mas que esperança? Parece que ninguém também sabia. Um dia, caipira emprestado, eu selei o zaino e, na porteira do curral, esperei pelos filhos que ainda apertavam os arreios dos animais. Um chuvisco de molhar bobo começava a incomodar, e eu chamei: “Vamos lá?” Mas que esperança? Quando puxei o cavalo para debaixo do telheiro, foi que atentei: perdida a esperança, só resta tirar o cavalo da chuva.

A questão é que esperança não é coisa que se perca; ou tem ou não tem e, se tem, não perde. Ninguém pode perder o que não tem. Num destes dias, esperando a patroa, na calçada em frente de um armarinho, senti os primeiros pingos da chuva anunciada e resolvi entrar no carro. É claro que, quanto a ela, não tenho jamais de tirar o carro da chuva. Depois de 45 anos, a confiança em que ela cuida de não demorar (é um pé lá outro aqui) é maior do que minha paciência. Foi ela mesma que me ensinou, certa vez, quando me ouviu dizer “estou perdendo a paciência”: “Você não pode perder o que não tem”. Você entendeu? (Não vá dizer “que esperança”.) Esperança que é esperança é feita de certeza, confiança, paciência, tudo bem ajustado como deveriam ser arreio de montaria ou mecânica de carro.

Se me perguntassem o que considero ser o aspecto mais sensível do processo de aconselhamento bíblico, eu diria: a esperança. Davi, no Salmo 20, encorajando o coração atribulado, falou da segurança e do socorro de Deus, da aceitação que sempre achamos nele, e da esperança da realização dos nossos desígnios segundo sua vontade. Ele disse: Uns confiam em carros, outros, em cavalos; nós, porém, nos gloriaremos em o nome do Senhor, nosso Deus. Eles se encurvam e caem; nós, porém, nos levantamos e nos mantemos de pé (vv. 7-8). O que pode ser percebido, aí, é que a esperança, entre a certeza da fé e a atuação do amor, é o elemento que fortalece o coração para as transformações que Deus intenta para nosso caráter (“nos gloriamos em o nome do Senhor”).

Isso é tratado por Paulo, em Romanos 5.1-5. Uma vez seguros no socorro provido na justificação em Cristo, temos paz com Deus (aceitação) e, pela fé, certeza do acesso a essa graça. Assim, gloriamo-nos na esperança da glória de Deus (v. 2c). Os conceitos de glória e gloriar devem ser bem entendidos. O Antigo Testamento usa palavras que os associam ao “peso do Senhor” e “brilho do Senhor” e “beleza do Senhor”; o Novo Testamento emprega palavras que falam do “brilho do Senhor”, “iluminação do Senhor”, e virtude do Senhor comunicada aos que são chamados a participar de sua própria natureza (cf. 2Pd 3-7). Paulo continua, dizendo que, na tribulação, o processo de reflexão do caráter de Deus é exercitado na perseverança (em obedecer à sua vontade revelada), realizado na experiência (aplicação dos seus mandamentos e promessas) – tudo motivado pela esperança que não confunde, porque o amor de Deus é derramado em nosso coração pelo Espírito Santo (v. 5; cf. Rm 15.4).

Tem muita gente querendo tirar o cavalo da chuva. Dizem: meu marido, minha esposa, meu filho, meus pais, minha igreja, meu problema, meu pecado: “que esperança!” Uns dizem que acabou o amor que jamais acaba (1Co 13.8), outros, que está chegando ao fim a paciência que jamais tiveram, e outros ainda, que não conseguem perseverar no bom caminho ou vencer tentação ou provação. O que esse povo precisa é de uma experiência com a bondade de Deus que o leve a obter da sua Palavra o motivo de uma esperança realista (cf. 1Pd 2.1-5). Uma esperança de sol e chuva: de glória que brilha mais do que o sol do meio dia e que cai em graça como chuva na sede da terra.

A Bíblia diz: Não vos sobreveio tentação que não fosse humana; mas Deus é fiel e não permitirá que sejais tentados além das vossas forças; pelo contrário, juntamente com a tentação, vos proverá livramento, de sorte que a possais suportar. Portanto, meus amados, fugi da idolatria (1Co 10.13-14). Ora, Deus é quem socorre, liberta, transforma, capacita, fornece recursos e dá força – crer menos do que isso configurará idolatria.

Uns confiam que o pecado lhes proporcionará a recompensa que esperam, que o divórcio lhes trará a liberdade que desejam, que o conselho dos ímpios os levará a bom termo, que a própria vontade os conduzirá à vitória; outros, que não haverá poder que os ampare ou que os transforme ou que controle a situação. Tudo isso é idolatria de quem pensa menos de Deus e muito do homem. Só há uma maneira para vencer essa idolatria, e essa é uma de desesperar da esperança, quer otimista quer pessimista, para esperar no Deus dos céus contra toda esperança da evidência terrena (cf. Rm 4.18).

Lembre-se sempre desta declaração de Paulo: Estou plenamente certo de que aquele que começou boa obra em vós há de completá-la até ao Dia de Cristo Jesus (Fp 1.6); e disto: Estou plenamente certo de que aquele que começou boa obra em vós há de completá-la até ao Dia de Cristo Jesus; e disto: Estou plenamente certo de que aquele que começou boa obra em vós há de completá-la até ao Dia de Cristo Jesus. Essa esperança certamente nos ensinará e capacitará para a lida com cavalos e carros e com as pessoas e o nosso próprio coração.

Wadislau Martins Gomes.

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