sábado, maio 25, 2013

TEMPO FINDO, TEMPO CHEGANDO...

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Uau!  Que dez anos incríveis!  Esse foi o pensamento que não me saiu da cabeça durante todo o dia de ontem...  Um dia diferente dos outros desta semana, e, de certo modo, diferente dos últimos mais de 3.000 dias. Acordei um pouco mais tarde (diferente do madrugar que marcou os outros dias desta semana).  Não cheguei ao escritório assoberbado e nem correndo para entrar em classe... Haviam apenas algumas poucas pendências que precisaram de atenção... Não encontrei coisas esperando solução, e sim rostos amigos com expressão agridoce, metade carinho, e a outra metade saudades -- pelo menos era assim que meu coração olhava para os colegas do CPAJ com quem investi os últimos 10 anos de ministério institucional.

O dia anterior já tinha sido cheio de emoções.  Cedinho eu já havia entrado em sala para dar a aula final da matéria Identidade Eclesiológica, da Pós-Graduação em  Revitalização e Multiplicação de Igrejas -- um tempo tocante com pastores-alunos queridos e minha última aula ministrada como diretor do CPAJ. É claro que passei do tempo, assim, depois de me despedir dos alunos meio que segurando as lágrimas (tanto por causa do meu sentimento "de despedida",  quanto por ter ouvido os pastores-alunos falando de coisas profundas do coração, corri com meia hora de atraso para a última reunião da Câmara de Pós-Graduação do CPAJ--outra reunião de despedida...

Cheguei ao meu escritório e lá já me esperavam pacientemente os irmãos-colegas. Comecei a reunião ainda como presidente.  Depois de uma oração pelo pastor Valdeci Santos, falei algumas palavras de agradecimento aos colegas -- sentimentalidades autenticas que não vou tentar reproduzir aqui, mas deixo apenas na lembrança daqueles irmãos que significam tanto para mim. Agradeci porque foram instrumentos da graça de Deus em minha vida... De lambuja eu conto para vocês aqui apenas duas partezinhas: buscando alívio no humor, eu agradeci porque nestes anos todos eles sempre acabaram deixando o seu diretor "bem, na fita"; e aí emprestei algumas partes de uma canção para expressar como me sinto quanto àqueles irmãos -- a tradução dessa canção eu transcrevi abaixo para vocês terem um "peek":

 
You Give Me Strength (Snow Patrol)
 
Hoje tive de segurar as lágrimas
Porque não sei nem começar a dizer
Como vocês afetaram esse "menino"
Nos últimos dez anos ou mais
 
Amigos, juntos vimos de tudo,
De triunfos a tombos,
E mesmo quando tivemos nossos ossos quebrados,
Nossos corações estiveram colados.
 
O tempo escorre, com suas mãos cansadas,
Nas nossas mãos cansadas,
Ainda teremos muitos anos até Aquele dia,
E ainda teremos muito mais a dizer...
 
Vocês me dão força,
Uma força que sozinho nunca tive,
Quando as coisas ficavam bagunçadas
E eu meio que perdia o rumo,
Vocês me tiravam e moviam
Daquelas situações escuras...
Não tive dúvidas,
Quando pude ver seus rostos.
 
Amigos, juntos vimos de tudo, 
E quando as coisas não faziam sentido,
Vocês ajudaram a iluminar o caminho
E encontrar a beleza ao final...
 
Então me deixem elevar vocês,
Como vocês me elevaram,
O tempo é demais para não dizer,
Vocês precisam saber que eu sempre soube,
 
Vocês me dão força,
Uma força que sozinho nunca tive,
Quando as coisas ficavam bagunçadas
E eu meio que perdia o rumo,
Vocês me tiravam e moviam
Daquelas situações escuras...
Não tive dúvidas,
Quando pude ver seus rostos.
 
Depois de usar pedaços dessa música para me dirigir a eles eu pedi para orar e isso eu fiz agradecendo por cada um dos meus irmãos presentes ali, agradecendo por suas vidas e agradecendo ao bondoso Deus por momentos específicos de amizade e proximidade com cada um deles, nominalmente.  Terminada a oração ouvi algumas palavras carinhosas e encorajadoras do pastor Heber Carlos de Campos. Então, recorrendo ao humor outra vez, passei a presidência da reunião e daquele colegiado ao Vice-diretor que agora, com minha saída, assumiria o exercício da direção.  Fiz algo que sempre quis fazer, desde os tempos em que me encantava em assistir ao Capitão Kirk ou ao Capitão Jean Luke Piccard ("Star Trek" e "Star Trek, The Next Generation", para os não-iniciados), virei-me para o pastor Mauro Fernando Meister e disse solenemente: "Number one, you now have comand..." [Número um, você agora tem o comando!].  Só faltou ouvir dele: "Warp speed ahead!"

Depois dos abraços fraternos, o restante do corpo docente (a Câmara de Pós-Graduação é composta apenas dos Coordenadores e Titulares) foi chamado.  Vi entrarem na sala os professores mais jovens, cada um deles trazido ao CPAJ debaixo de minha direção -- faltaram apenas dois dos colegas amados, os pastores João Alves e Augustus Nicodemus, ambos membros também da Câmara, mas ausentes naquele momento por motivos de força maior, ainda que tão próximos do coração. Com o corpo docente estavam também nossos valiosos colaboradores, a Sunamita, o Hothir, a Márcia e o Rafael.  

Meu coração já se apertava outra vez, mas o difícil foi quando vi entrarem com uma linda cadeira de madeira clara -- eu já imaginava o que vinha pela frente...  Pastor Valdeci explicou que, seguindo uma tradição de outras antigas escolas teológicas reformadas, eles estavam me presenteando com uma cadeira, a qual representava a minha cátedra no CPAJ e seguiria comigo como lembrança permanente.  Ele leu os dizeres da placa afixada nesta linda cadeira: O selo do CPAJ era acompanhado das seguintes palavras, "Rev. Davi Charles Gomes, PhD. Em honra ao trabalho prestado, com excelência e dedicação, na direção do Centro Presbiteriano de Pós-Graduação Andrew Jumper - 2004 a 2013. Corpo Docente - CPAJ". 

Aí é que ficou difícil segurar as emoções, pois os colegas me fizeram sentar na cadeira e posar para uma foto final com o corpo docente assentado e perfilado ao meu redor.  Ainda que encabulado por estar sendo honrado desta maneira, assenti e senti profunda gratidão por aqueles homens a quem eu desejo tanto honrar neste momento de despedida e que resolveram me fazer aceitar ser honrado por eles de um modo que eu normalmente teria dificuldade em aceitar -- a honra é somente de Cristo e estes são homens que honram sempre a Cristo, mas neste momento eles desejaram honrar, em submissão a Cristo, a um irmão menor cuja maior honra foi servir a eles durante estes dez anos e com eles servir à causa do Reino de Cristo e à Igreja Presbiteriana do Brasil!
 
 

Finda a reunião, ainda embargado, segui com eles até um restaurante bem simples, próximo ao CPAJ, para alguns momentos de comunhão informal.  Juntaram-se a nós ali os queridos pastores Augustus Nicodemus e Fernando Almeida.  O partir do pão, em profunda comunhão, ainda tinha um gosto de despedida, mas, em outro sentido, talvez pela escolha do lugar cotidiano e despretensioso, teve também o sabor gostosamente cotidiano das milhares de vezes em que comemos e comungamos juntos à mesa...

Concluído o almoço, caminhamos juntos de volta ao CPAJ.  Alguns colegas foram tomar um cafezinho melhor em um lugar próximo dali, outros tinham compromissos diversos.  Caminhei de volta com os pastores Mauro, Jedeías, Augustus e Fernando.  Conversei um pouco com o pastor Fernando, que é chefe de gabinete da Chancelaria do Mackenzie e que está auxiliando pastor Augustus e eu na transição de cargo e então seguimos, os dois, para o Edifício João Calvino, aonde nos esperavam o pastor Augustus Nicodemus e todos os capelães do Mackenzie, para um encontro de transição.  

Fui carinhosamente recebido pelo querido Augustus, que me apresentou cada um dos capelães e então fez uma apresentação de um relatório dos últimos dez anos de seu trabalho como Chanceler do Mackenzie. Ainda que eu tenha estado tão próximo do Augustus e da Chancelaria nestes anos, e que tenha regularmente substituído o Chanceler quando de suas ausências, estando, portanto, bem inteirado das ações que ele sempre desenvolveu, confesso que assistir àquela apresentação me deixou orgulhoso de meu amigo, colega e predecessor no cargo.

A apresentação, que resumiu as principais ações, desafios e vitorias para o Reino, desenvolvidas na chancelaria nos últimos dez anos, me fez lembrar o quanto foi feito, admirar a fidelidade com a qual Augustus desenvolveu seu ministério ali, e concordar com os membros do Conselho Deliberativo do Instituto Presbiteriano Mackenzie que na semana anterior também receberam este relatório com tanta apreciação e respeito. Também fiquei muito feliz em lembrar como o meu querido amigo Augustus deixa seu cargo diante de tantos protestos de admiração e respeito, da parte de seus chefes (o Conselho de Curadores e o Conselho Deliberativo do Instituto Presbiteriano Mackenzie), de seus colegas na direção do IPM e da UPM, e de seus colaboradores.

Pastor Augustus Nicodemus Gomes Lopes deixa seu cargo por iniciativa sua e sob os afetuosos protestos de seus chefes, seus colegas e seus colaboradores. Também sob os meus protestos.  Mas não  protestos negativos ou carentes de compreensão. Ele segue em frente porque deseja novos desafios, porque ouve o canto atraente e saudoso de seu trabalho pastoral-acadêmico, porque sente de Deus a tranqüilidade de que sua tarefa, pela graça maravilhosa de Deus, foi fielmente cumprida -- eu creio que conheço bem esse sentimento, pois é assim que deixo o CPAJ. Ao menos, isso é o que eu percebo claramente, mesmo que não presumindo falar por ele!

Após a apresentação pelo Chanceler Augustus Nicodemus, ele solicitou que cada capelão fizesse uma apresentação de dez minutos, relatando a mim e aos colegas os ministérios que eles têm desenvolvido nos diferentes campi e nas diferentes áreas de atuação da capelania do Mackenzie.  Fiquei contente em ver o quanto eles fazem, e a importância que seus ministérios têm para a comunidade Mackenzie, para a Igreja Presbiteriana do Brasil, em nome de quem eles atuam, e para o Reino, sob cuja autoridade maior eles ministram.

Como não poderia deixar de ser, ao término das apresentações, o pastor Carlos Henrique (capelão institucional), escolhido por seus pares para falar em nome deles, manifestou-se com palavras de honra e gratidão ao amigo Augustus -- em momentos ele estava claramente comovido...  Foram palavras bonitas de admiração, respeito e afeto -- tudo isso claramente visto nos olhares e nas palavras de todos os outros capelães. Presentearam Augustus com uma linda lembrança e deram a ele a oportunidade de também manifestar-se.  Então, pastor Carlos Henrique concluiu com palavras que eu creio resumiam todo o sentimento.  Ele disse: "Pastor Augustus, estamos muito tristes com a sua saída..."  Mas graciosamente adicionou algo que fez bem ao meu coração, e ao do pastor Augustus também, "...mas estamos também felizes que é o pastor Davi que vem para continuar conosco o que o senhor, e sobretudo, O Senhor, tem feito."

Isso tudo foi antes de ontem, na quinta-feira, 23 de maio de 2013. Após a reunião com o chanceler e os capelães, fiquei alguns minutos com Augustus em seu gabinete e então descemos os dois para a garagem, juntos com o pastor Fernando.  Dirigi até minha casa e chegando lá fui com minha querida até a casa de meus pais para um pouquinho mais de conforto do coração. Pastor Wadislau me ouviu falar do dia, expressou seu apoio paterno e então nos despedimos.

Com um dia tão cheio de emoções, Adriana e eu resolvemos esticar um pouco a noite e fazer um pouco de trabalho braçal ali no sítio aonde moramos... Com botas de borracha e capas de chuva, carrinho de mão, pás e enxadas, gastamos um pouquinho de tempo e energia espalhando algumas pedras na lama de nossa estrada interna que tinha sido danificada pelas chuvas do dia anterior. Esse trabalho duro e braçal faz bem ao corpo e à alma de vez em quando, especialmente quando emoções estão à flor da pele.  É claro que a Adriana só empurrava o carrinho de mão quando estava vazio, e que eu não deixei que ela pegasse na enxada ou na pá... Quando cansei fomos dormir, eu e aquela que é a minha recompensa pelo trabalho com o qual me afadigo debaixo do sol (Ecclesiastes 9).

De volta ao começo, ontem acordei mais tarde, 8h da manhã, ao invés das 5:30h dos dias anteriores. Escrevi logo no início sobre os rostos amigos que encontrei quando cheguei ao CPAJ para meu último dia de expediente à frente da instituição.  Entrei em meu escritório e busquei conforto na lembrança de que o CPAJ não pertence a mim, não pertence nem aos meus colegas, nem mesmo aos seus alunos, à JET ou à IPB -- pertence a Cristo, Aquele que é Senhor meu, de meus colegas, de meus alunos, do Mackenzie, da JET, da IPB e de todas as coisas...  Assim, não há, realmente, despedida, pois prossigo, prosseguimos, servindo ao mesmo Senhor e na mesma seara.

Logo que cheguei, fui ao escritório do pastor Mauro, chamá-lo para o escritório que deixaria de ser meu naquele dia...  No caminho de volta encontrei o pastor Emílio Garófalo Neto, primo querido, pastor abençoado e professor de mãos cheias -- ele estava se despedindo após uma semana ministrando aulas de pós-graduação como professor visitante do CPAJ.  Um cafézinho com Mauro, saudações fraternas e afetuosas do Hothir e da Sunamita, um abraço apertado do Valdeci... Aí chegou a hora de prosseguirmos para uma churrascaria para o almoço oficial de despedida.  Chegando lá, qual não foi a surpresa, além de todos os parceiros no CPAJ, ali se ajuntaram a nós o presbítero Solano Portela, amigo e Vice-presidente da Junta de Educação Teológica, e o pastor Roberto Brasileiro, amigo e presidente do supremo concílio da Igreja Presbiteriana do Brasil. Só faltaram o amigo Tarcízio, preso em afazer familiar, e o amigo Augustus, no Recife, pregando o evangelho, como sempre, e o Jedeías, na Paraíba, cuidando da expansão de nossa igreja...

Que gostoso estar à mesa com todos os colegas!  Mas que difícil segurar o coração quando Mauro começou seu breve discurso, seguido do presbítero Solano e do pastor Roberto.  Cada um disse palavras pessoais, afetuosas e reconhecendo supostos méritos e qualidades em mim que eu mesmo não reconheço -- palavras de que não sou digno, exceto que em Cristo e usado por Ele, passamos a receber dele uma dignidade que em nós nunca teríamos. Ao mesmo tempo, os três oradores aquietaram meu coração ao deixar claro que aquilo não era senão o término de uma fase do ministério que juntos executamos no Senhor e para o Senhor -- nossa luta e nossa colaboração continua!  Isto é o que, em resumo, eu ouvi deles, e isso confortou meu coracão!
 
Voltamos ao CPAJ e o pastor Mauro e eu fomos ao seu escritório escrever uns últimos documentos que deveriam levar as nossas duas assinaturas.  Então chegou a hora de partir, com pressa, pois estava atrasado para uma consulta no final da tarde.  Falei ao telefone com pastor Roberto Brasileiro, despedi da Sunamita e do Hothir, daí do Rafael e da Márcia, e o amigo Mauro, agora respondendo sozinho pela direção do CPAJ, resolveu me acompanhar nesta última longa caminhada deixando a instituição na qual tive a honra de servir nos últimos dez anos.  Ele carregou a cadeira que eu levava comigo e fomos até o estacionamento. Lá nos abraçamos e dissemos palavras de irmandade em amor, as quais ficam só para nossos corações.  Apressamos a despedida e dissemos, "até a semana que vem..."

No caminho de volta para casa, falei ao telefone com vários desses queridos (usando o hands-free do carro, é claro, pois não ia quebrar a lei...). Conversei com Solano, com Mauro, com Valdeci e Jedeías, falei com Sunamita também.  Cheguei em casa e encontrei o carinho da Adriana, dos filhos Daniel e Rafael, dos pais, Wadislau e Elizabeth e do mano Daniel.  Todos me aguardavam prontos para ouvir sobre esse último dia e para me encorajar e confortar: celebração e emoção.

Aí,  antes de dormir fiquei pensando em compartilhar com quem tiver interesse este relato.  Mais que isso, quis uma oportunidade de honrar e agradecer as várias pessoas que têm feito parte de minha história, e de fazer isso em meus termos, em registro escrito, neste momento de transição. 

Vou ter três dias de descanso na próxima semana e daí o feriado.  Estarei fazendo preleções no encontro Fiel Jovem durante o próximo fim de semana.  Na segunda-feira, dia 3 de junho próximo estarei junto com Augustus celebrando seus dez anos na chancelaria com ação de graças a Deus e então tomando posse como o XIII Chanceler da Universidade Presbiteriana Mackenzie. A cerimonia de ação de graças e posse ocorrerá às 12h naquele dia.  

Se você está lendo esse relato, não procure nele e não veja nele mais do que uma mera expressão de um coração grato a Deus, repleto de afetos e emoções, pronto para os novos desafios, mas, sobretudo, dependente da graça do Senhor!  Graça esta que me faz levantar a voz a Ele em gratidão pelas muitas pessoas que têm sido para mim bênçãos e companheiros nesta maravilhosa aventura de viver coram deo!

A Ele a glória, o poder e a honra, sempre!

Davi Charles Gomes

Mogi das Cruzes, 25 de maio de 2013

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A Deus, pelos irmãos, irmãs e colegas, minha gratidão...
  • por  minha esposa e filhos: Adriana, Rafael e Daniel;
  • por meus pais, Wadislau e Elizabeth;
  • por meus irmãos, Deborah e Daniel;
  • por meus familiares, Joarez e Marisa, John, Márcia, Flavio, Bianca, Andrea, Deborah e Claudio;
  • por meus sobrinhos: Matthew, Felipe, Timothy, Leticia, Davizinho, Nicoli, Ruth, Jonathan, Luca;
  • por minha igreja, família IPP, e meus colegas de conselho, Wadislau, Heber, Alderi, Márcio, David e Rinaldo;
  • pelo pastor Roberto;
  • por toda a JET, a de agora e as duas anteriores;
  • por Solano, Eli, Jaime, Damócles;
  • pela CRIE: Eliezer, Solano, Ludgero, Roberto;
  • pelo Conselho de Curadores do IPM e pelo Conselho Deliberativo;
  • pelo chanceler Augustus;
  • pelos gestores do Mackenzie: Mauricio, Solano, Anaor, Jose Paulo; Wallace; Benedito e Marcel;
  • pelos colaboradores no CPAJ: Sunamita, Andrea, Marcia, Hothir e Rafael,
  • e hoje, especialmente pelos colegas, irmãos e companheiros -- meus pares:
Alderi,
Augustus,
Daniel,
Fabiano,
Heber,
Heber Jr,
Jedeías,
João Alves,
João Paulo,
Leandro,
Mauro,
Tarcízio,
Valdeci.

sábado, maio 18, 2013

MÃE, SÓ TEM UMA!


NormanRockweel: Mother and childreen
 
Ainda adolescente, quando não participava, pelo menos, eu ria com os esquetes humorísticos na “noite dos talentos”, e um que se repetia ano após ano era o de “mãe, só tem uma!”, trivializando o bordão por meio da constatação, junto à geladeira, de que só havia uma garrafa de refrigerante para levar à mesa.

Agora madura mãe e avó, rumino sobre a singularidade e multiplicidade das mães. Mãe, minha, só uma. Há três anos que ela foi promovida à presença de Cristo (aí vai outro chavão que insiste em permanecer na mente criança da gente). Chegado o dia das mães, eu teria de receber uma rosa branca, fossem as comemorações iguais à que mamãe promovia na igreja. (Vermelha só para quem tivesse mãe viva.) Mamãe era uma pessoa única, maravilhosa, esquisita no sentido do inglês de “singularmente especial” e do brasileiro de “estranho e que foge aos padrões da normalidade”. Missionária educadora, foi parteira nos primeiros anos nos antigos campos de Minas Gerais e Goiás, e ajudou a trazer à luz a muita gente. A mim, que nasci de seu corpo, e recebi a Cristo aos quatro anos de idade quando constatei que nunca havia me convertido e insisti com ela que me “ajudasse” a nascer de novo. Além de dar a luz, sempre iluminou minha vida apontando para Jesus a quem servia. Minha mãe era de pedra dura e água fluida, mole e sensível. Os sentimentos batiam fortes de carinho e aconchego e se misturavam com certa rejeição – por achar que jamais chegaria aos padrões de perfeição que ela exigia de si e dos outros: marido, filhas, gente a quem ministrava com orgulhosa humildade. Inseguranças e incongruências sempre marcaram o relacionamento com minha insubstituível, notável mãe que me tentava por no colo mesmo quando ela era frágil velhinha e eu já avó assumida. Sinto falta dela até hoje, embora depois que me casei há muitos anos, convivemos muito pouco. Sobretudo, sinto falta de suas orações, e constato que sempre fraqueja a minha resolução de continuar a vida de oração que ela deixou quando passou à Presença. Sempre soube que quem realmente intercede por mim é o próprio Espírito Santo, mas sentimentalmente, até hoje sinto falta da intercessão de minha mãe.

Fui ainda abençoada porque mãe, não tive só uma. Quando conheci a mãe do Wadislau, imediatamente ganhei outra mãe. Sempre presente em datas marcantes ou comuns, no nascimento de meus filhos, nos sofrimentos e nas alegrias da vida. D. Eulina era uma clássica mãe cristã carinhosa, atuante e sempre carente da graça e transbordante do amor de Cristo. Sempre dando mimos, presentes e atenções a mim, iguais aos que compartilhava com os filhos do ventre, minhas cunhadas e meu marido. Eu não a chamava de mãe, mas trazia-a no coração como tal, e sei que ela também me via como filha caçula.

Em cada igreja em que estivemos, Deus sempre me presenteou com algumas mães inesquecíveis. Em BH, tia Aninha foi mãe para mim. Na Ebenezer, Dona Isolina Berthaud me acrescentou à prole de três filhos homens. Dona Bernardina, com sua ingênua sabedoria analfabeta, sempre demonstrou carinho por nós e nossos filhos (não existe melhor modo de ganhar o coração de uma mãe do que amar seus filhos). Em Jaú, três eram as preciosas e marcantes “mães oficiais”: Dona Hyripsimé (ou Iracema), dona Wanda e Dona Elpídia – para a jovem, inexperiente e muitas vezes inepta esposa de pastor, essas três esbanjavam carinho, cuidados e conselhos vivendo de modo prático o ministério maternal que Paulo recomendou Tito promovesse para as mulheres mais maduras da igreja.

Hoje eu estou entre as mulheres mais maduras da igreja, e quando não posso ajudar minha filha que está longe, fico com coceira na língua para compartilhar com mulheres mais jovens que enfrentam lutas e vitórias que já vivi. (Aprendi que guardar a língua é um dois exercícios de amor cristão mais importantes na vida. Mas às vezes ainda dá coceira!). Fato é que continuo vivendo maternidade, embora meus filhos sejam adultos maduros que independem de mim e a quem às vezes eu recorro com certa dependência. Ainda hoje me alegro quando recebo notícia de alguém que conheceu a Jesus por meu intermédio, ou aprendeu uma receita inesquecível que virou parte do repertório de sua casa, ou foi edificada por algo que falei ou escrevi. Cada experiência fez e faz parte de uma vida em que muitos foram os questionamentos, algumas foram lutas travadas ainda não vitoriosas, diversas as inseguranças e incertezas – e permanece sempre a certeza de que “Aquele que começou boa obra em vós a aperfeiçoará até o dia de Cristo Jesus”. Já e ainda não – constatação de nossa salvação e glorificação passada, presente e futura. Mãe, tenho tido muitas, mesmo que cada uma tenha sido única. A própria maternidade nos faz considerar a profunda questão filosófica existencial de unidade e multiplicidade. E, ao lembrar de minha mãe única e de minhas muitas mães, tenho de aplicar as lições de vida a minha própria existência para que, ao aplicá-las às vidas de meus filhos e das gerações futuras, eu sempre esteja firmada na Rocha/Refúgio. Maternidade não é algo estático nem é apenas simbólico. Gera, nutre e multiplica vida para a eternidade. Por isso aproprio-me de uma figura materna para falar do relacionamento dessa criatura caída e restaurada com o todo poderoso Deus dos Antigos: “como a criança desmamada se aquieta nos braços de sua mãe, como essa criança é a minha alma para comigo” e confiante, afirmar ainda com o salmista: “Espera, ó Israel, no Senhor, desde agora e para sempre” (Salmo 131.2 3).

Elizabeth Gomes