segunda-feira, fevereiro 09, 2015

POR FALAR EM CASAMENTO, COMO VAI O SEU AMOR?



Lendo e traduzindo biografias de grandes homens na história da igreja, fiquei preocupada com alguns aspectos de suas e nossas vidas. John Wesley, grande avivalista fundador do metodismo, que transformou a face evangélica nos Estados Unidos e na Inglaterra, teve uma vida matrimonial conturbada. A saga de seu casamento é uma história de cautela que deveria ressoar nos dias de hoje para qualquer casal envolvido na vida da igreja—ou com um ídolo—a ponto de não dar espaço um cônjuge para o outro. Nathan Busenitz, cita a Biografia de Wesley, de Stephen Tomkins, dizendo:

“Wesley e Mary Vazeille, viúva rica e mãe de quatro filhos, casaram-se em 1751. Até 1758 ela o havia abandonado— dizem que não aguentou lidar com a competição por seu tempo e devoção ante o sempre crescente movimento metodista. Molly (seu apelido) voltaria para ele e o deixaria de novo, diversas vezes, antes de sua separação final (....) Com as constantes viagens de Wesley, Molly se sentia negligenciada, enciumada e suspeitosa dos muitos relacionamentos de amizade que ele mantinha com várias mulheres que faziam parte do movimento. Wesley pouco fez para acalmar os seus temores.”

Alguns episódios relatados:

- Ao ir para uma turné na Irlanda em 1758, diz Molly que seu marido afirmou: “Espero não mais ver seu rosto malígno”. (p. 155)

- Reunidos na Inglaterra, tiveram violentos atritos—Wesley recusou mudar seu hábito de mandar cartas repletas  de afeto a outras mulheres e Molly acusou-o de adultério e chamou sobre ele, nas suas próprias palavras, ‘todas as maldições de Gênesis ao Apocalipse.’” (p. 155)

- Quase o único documento que sobreviveu a esse casamento, do lado de Molly, é de dezembro de 1760, quando ela disse que Wesley saiu cedo de uma reunião com uma tal de Betty Disine e foi visto ainda com ela na manhã seguinte. Molly “disse-lhe com modo amável que ele desistisse de correr atrás de mulheres estranhas porque seu caráter está em jogo” (p. 159).

Busenitz adverte:“Você pode perder o ministério e manter seu casamento, mas não conseguirá perder seu casamento e manter intacto o seu ministério.”

Na verdade, o fracassado casamento de John Wesley permanece como sóbria advertência para os que são tentados a confundir as prioridades dadas por Deus, e deverá despertar e sacudir poderosamente qualquer que queira ser pastor, presbítero ou líder na igreja. A Palavra de Deus coloca um alto padrão, e essas qualificações são imprescindíveis e incluem a vida conjugal e familiar do presbítero.

É só ler (nas entrelinhas) as notícias sobre pastores, missionários e gente de projeção na igreja cristã, que constatamos um triste fato: todo ano, pastores no mundo inteiro “ganham almas” enquanto perdem suas famílias. Referindo-me a dois axiomas da Palavra de Deus. “O que ganha almas é sábio” e “De que adianta o homem ganhar o mundo e perder a sua alma” a primeira afirmativa deste parágrafo é uma declaração perigosa.

Quando meu marido era Secretário de Apoio Pastoral da IPB, constatou a disciplina e desistência de doze pastores da denominação por causa de casamentos desfeitos, em um só ano. Casamentos desairosos, deficientes, desfeitos de modo vergonhoso, já causaram males que não se limitaram ao casal, mas abalaram as vidas de filhos, amigos, parentes, igrejas e a sociedade em que as pessoas estavam inseridas. Alguns, mesmo pastores, não eram hereges, teologicamente despreparados, nem gente de mau caráter. Muitos figuravam entre os melhores, os doutores e mestres da igreja, os que eram exemplos no conhecimento e ortodoxos na doutrina. Começaram a vida ministerial e matrimonial apaixonados por Deus e pela mulher que ele lhe deu. Terminaram fragmentados em mil pedaços e destroços do vazio, do desamor, da total incompreensão.

Sou grata a Deus pelo meu casamento e diariamente fico maravilhada por Deus ter dado como companheiro um homem que ama a Deus acima de tudo e todos, e demonstra amor por mim “como Cristo amou a igreja”. Isso é pela misericórdia e graça de Deus. Eu mesma sou filha de um casal envolvido no ministério que tinha tudo para ser sucesso, e naufragou—cada um ficando à deriva, perdido na vida (não perdendo a salvação, mas perdendo a alegria de viver), tentando catar os pedaços e remendar cisternas rotas que não tinham como conter água.

Quando digo que foi pela misericórdia de Deus, tenho de admitir que mesmo os desastres de vida de que falo são ecos da graça divina—e nenhum de nós pode dizer “eu jamais faria isso”; “estou acima de tais problemas”; “meu casamento é blindado pelo Espírito Santo e jamais cairei”! Fato é que todos nós somos pecadores, passíveis de imaginar e cometer grandes e pequenos pecados. Por mais envolvidos que estejamos na obra do Senhor, nós que fomos chamados para ser santos—não apenas líderes na igreja de Deus, mas qualquer crente em Jesus Cristo, do mais sábio ao mais estulto—vivemos a ambiguidade de sermos santos pecadores.

Um livro de ajuda para casais cristãos com uma perspectiva realista com esperança é Quando pecadores dizem sim, de Dave Harvey (Editora Fiel). Problema é quando pessoas pecadoras, salvas por Jesus, acham que estão acima das vicissitudes da vida comum e enxergam o outro como inferiores ou indignos de seu amor. Geralmente o desvio, a desonestidade e a desonra  no casamento começam com “pequenas” incoerências, cedendo a concupiscência—seja ela da carne, dos olhos ou soberba da vida 1Jo 2.16, com orgulho em vez da humildade própria de quem veio do pó da terra—o conceito bíblico de “preferir em honra uns aos outros”. Em um blog de duas páginas não podemos começar a enumerar as mil e uma razões por que um casamento “não deu certo”, nem ter a prepotência de achar que entendemos e que estamos isentos de culpa. Porém, podemos delinear algumas diretrizes para andar “de modo digno da vocação a que fomos chamados”.

1.       Tenha sempre em mente as PRIORIDADES certas. Quer você seja pastor famoso, missionário em campos distantes, ou crente sem títulos ou atribuições ministeriais—lembrando que todo cristão é sacerdote e tem um ministério, um serviço cristão: Deus em primeiro lugar (Mt 5.33); cônjuge em seguida (1Tm 3.4); filhos (se os tiver); trabalho (temos de obter bom testemunho dos de fora); sociedade em que vive; igreja  e  todas as outras coisas. Note que Deus está em primeiro lugar, mas nosso papel na igreja vem depois da família, do trabalho e do lugar em que vivemos, porque se alguém não cuida dos de sua casa, como pode cuidar das coisas de Deus? Um estudo simples e mais detalhado está em Força para a Família..., (Ed. Monergismo), p. 76-77, do Wadislau, e no meu livro Esposa pela graça mediante a fé, capítulo 3.

2.       Guarde na mente e no coração os AFETOS certos. Se sou casada, meu melhor amigo tem de ser meu marido—tenho de ter prazer e pensar sobre ele. Até o amor aos filhos está subordinado ao amor do casal—o melhor presente que os pais podem dar aos filhos é a segurança de saber que eles são unidos em amor.

3.       Entenda bem quais os MOTIVOS por trás do que fazemos ou não fazemos. Em Força para a família na crise moderna, Wadislau delineia três motivos bíblicos por expressão: 1) Motivação da fé; 2) Motivação da esperança e 3) Motivação do amor. Esses estão em contraposição a motivações por necessidade: idolatrias (“Eu preciso disso para ser feliz”, “Isso é mais importante que tudo para mim”), pecado (“Eu sou mais eu; se não cuidar de mim ninguém mais vai fazê-lo”- Gl 5.13-21) e culpa que nos faz esconder de nós mesmos (“Não quero nem saber”), do outro (“ele/ela teve a coragem de...)” e de Deus (“Foi a mulher que TU me deste”), produzindo medo e atribuindo a outro o erro.

Existem N fatores que impedem a harmonia do casal, mas suponho que, se começarmos a consertar nossas prioridades, afetos e motivações, poderemos iniciar (ou retomar e consertar) saudável uma caminhada a dois, que acrescentará descendentes impactados positiva ou negativamente por nossa vida. Influirá sobre vizinhos, amigos, parentes, colegas...

Com certeza você já ouviu fofocas sobre pessoas que cometeram deslizes—é provável que você já tenha participado de maldizeres no face ou outros meios, disseminando contendas em vez de guardar a boca. Muitas pessoas que possuem o dom da palavra são igualmente hábeis no vício de usar palavras para ferir, abalar e destruir o caráter do próximo. Há algo, sim, em que nós somos totalmente responsáveis para cuidar:

Sobre tudo que se deve guardar, guarda o coração, porque dele procedem as fontes da vida. Desvia de ti a falsidade da boca e perversidade dos lábios; os teus olhos olhem direito, tuas pálpebras diretamente (...) pondera a vereda dos teus pés, e todos os teus caminhos sejam retos (...) retira o teu pé do mal (Pv 4.23-27).

Elizabeth Gomes