terça-feira, maio 22, 2012

NOSSAS LINDAS CRIANÇAS


Uma velha nova amiga escreveu perguntando sobre nossas “lindas crianças” e eu prontamente escrevi um parágrafo orgulhoso no facebook resumindo a situação e os feitos de cada filho, acrescentando, naturalmente, os netos.

Pouco tempo depois recebi a notícia de que o neto de uma prima, filho único e mui esperado do seu filho caçula, faleceu após dias de luta para sobreviver a um problema no parto, quando a gravidez não havia apresentado ou alertado a nenhum problema.

Fiquei sóbria e meu coração se condoeu pelo sofrimento de amigos com suas “lindas crianças”. Como o pequenino do Guto, a segunda filhinha de Beto e Sílvia – linda e perfeita – lutou e não viveu. Outra amiga viu seu pequenino em morte súbita aos dois meses, sem explicação – e não podia gerar mais filhos.

Amigos também sofreram a perda de crianças e jovens com quem tiveram o privilégio de conviver: conto sobre a linda Laís que dormiu nos braços do Senhor Jesus aos quatro anos, a Gláucia cheia de beleza e vida que em dois dias de “gripe” se foi sem explicações, à linda filha de Telma no primeiro ano de universidade, séria em seu compromisso com Jesus e para o bem, o André que tanto prometia na Seara do Senhor aos pais, irmão e comunidade cristã... Como vão essas lindas crianças? O consolo dos pais e amigos é que estão na presença do Senhor – mas o vazio da sua não-presença na vida terrena desses irmãos jamais consegue ser preenchido.

Lembro ainda perdas mais amargas: a amiga cujo único filho é rebelde e homossexual assumido, ainda carinhoso com os pais – quando não sob influência de drogas ou deslumbramentos anticristãos. Os pais, fiéis obreiros cujo filho morreu de overdose; outros cuja filha não morreu, mas vive na gangorra nefasta da anorexia nervosa a ponto de sua vida estar em constante perigo. Filhos que muito prometiam e tiraram suas vidas. Uma parente querida teve um filho fruto de estupro – criou-o e hoje ele é um homem de Deus. Outros perderam os bebês planejados, esperados, antes de esses nascerem. Alguns irmãos queridos, de excelente caráter e estirpe de pais, não conseguem gerar filhos, e desistem de longos e caros tratamentos, concluindo e assumindo a infertilidade.

Senti-me envergonhada por gabar os filhos. Se estes são fiéis ao Senhor e cidadãos honrados – não será por mérito nosso, mas unicamente pela graça de Deus. E por essa mesma graça, Deus usa de sua severa misericórdia, fazendo com que outros de seus filhos fiéis e amados não tenham filhos, ou os percam em gestações frustradas, infâncias interrompidas, juventudes cortadas pela tragédia de doenças ou acidentes inesperados. Em cada e todo caso, as misericórdias do Senhor são a razão de não sermos consumidos!

O bebê que viveu apenas alguns dias está no colo do Pastor dos Cordeirinhos. A menina que não teve tempo de desenvolver junto ao irmão está cercada de uma multidão incontável de anjos e humanos que louvam ao Senhor. Como disse minha cunhada, Lilian: Essa criança foi feita só para o céu. Os jovens ceifados quando tinham tudo para contribuir para a vida aqui na terra estão dando frutos diante do trono da graça. Seus pais, irmãos, avós, tios, primos e amigos os encontrarão um dia, e os reconhecerão, e saberão por que eles os precederam na presença de Jesus. Por enquanto, só podemos perguntar ao Deus de Toda Graça: Que queres que eu faça com essa dor? Estou em tuas mãos.

segunda-feira, maio 21, 2012

VARIAÇÕES SOBRE AMOR E DOCE DE JILÓ

Deixe o jiló imerso em água, trocando-a 4 vezes (a cada três horas). Junte açúcar cristal e água (ambos na medida de 1/3 da quantidade de  jiló) e deixe cozinhar até que fique no ponto de "furar com garfo". Convença alguém a provar.


Péra aí, existe mesmo! Provei primeiro lá nas Goiás. Foi sem hesitação, pois que faço luxo de uma pratada do amargo com uma colher de arroz. Doce, e com folha de figo, então, até quem odeia o cujo encara um naco. Um amor de doce! É por aí que vai o amor, como doce de jiló.

Alguém, um dia, queria saber o que fazer com um desafeto.

– Ama! – respondi, e logo veio o jiló:

– Mas como amar uma pessoa inamável?

– Ah! – eu disse com gosto – faz um doce.

Como é que é? Simples. Amor é mais do que sentir amor. O sentimento é bom, especialmente quando há troca de amor em calda, mas não é esse o amor que dá o doce da receita original. Para fazer bem um doce de amor, usa-se o tipo de fruto que dá na plantação do Espírito. Um amor que ama porque tem amor pra dar. Esse, no fogo branco das horas boas ou no fogo alto das horas más, sempre dá água na boca.

O poeta, variando sobre o tema, disse que amor bom é o amor intransitivo, não no sentido de que não é transmissível, mas que não requer complemento. Quem ama porque deseja ser amado é um saco sem fundo de insatisfação. Não é um gosto de quero mais, mas fome compulsiva. Amor foi feito para dar e, quando exigido, encaroça na panela e trava a língua.

– Como é que eu vou amar se não consigo gostar dele?

Na verdade, amor gostoso é o amor que ama porque é amor. Vem de Deus. E olha que não é melado, não! Tem um pouco de jiló que é para não enfarar. De fato, amar não é sinônimo necessário de gostar. À vezes, será preciso enfrentá-lo sem doce. Como a amada faz, lá em casa: vai trocando as águas até que fique no ponto. Se a Bíblia mandou amar o inimigo! Quem gosta de inimigo é amigo do cão – bom mesmo é amar o amigo! Mas, como amar é gostar de fazer o bem sem ver a quem, aí dá pra até pra comer jiló no pé. Tenho a certeza de que, quando morreu por mim, Jesus sentiu o gosto amargo dos meus feitos inamáveis, mas gostou de transformar-me com o mel do seu amor ao fogo de sua justiça. De inimigo a amigo, no feito da cruz.

Ninguém tem maior amor do que este: de dar alguém a própria vida em favor dos seus amigos. Vós sois meus amigos, se fazeis o que eu vos mando – disse ele, em João 15.13-14.

Não pense que eu sou uma doçura, não. Estou mais para jiló. Para mim, uma das coisas mais difíceis de tragar é o doce do jiló do amor. Uma mesa posta em que eu sirva o que o outro gosta, e o sirva primeiro, não me traz a ideia de uma boa festa, mas a gente enfrenta, engole o porco espinho com um ou dois goles de água e estende a mão e o riso honesto. Esse tipo de amor não terá pronto reconhecimento senão da parte daquele que o prescreve: o Senhor. Falar dele aos homens será como recomendar doce de jiló para quem não o conhece. Mas é exatamente aí que está a doçura!

Tudo de que necessitamos para fazer o doce é saber de que consiste o amargor, como retirá-lo, e como apurar o doce. Parte do amargor vem da terra em que a afeição foi plantada, parte dos nutrientes com que foi tratado e parte do ambiente em que viceja. Primeiro o meu pecado, segundo o pecado de outros contra mim e terceiro o pecado de outros contra outros. O amor não me vem naturalmente nessas condições. É preciso que as águas da Palavra lavem-me a alma e a obra de Cristo aqueça-me o coração, às vezes, a contragosto.

O fogo da graça de Deus requer que o pecado seja confessado de coração a quem estiver dentro do círculo da ofensa. Assim, eu confesso meu pecado, com arrependimento convincente, a Deus e à pessoa ou pessoas contra as quais eu pequei; se alguém pecou contra mim, confronto-o graciosamente a fim de restaurar a paz de Cristo; e o pecado de outros contra outros, rego-o com a pacificação do Espírito.

É claro que leva um tempo para que o doce fique pronto. O coração viciado em amargura aprecia o gosto acre da ira destemperada, e eu continuo desejando que todos, especialmente meus desafetos, gostem do doce de jiló. Mas quando isso ocorre, lembra-me o Senhor de que sequer consigo discernir minhas próprias fraquezas, quanto mais saborear a dos outros; sobretudo, as coisas do Senhor são mais desejáveis do que ouro, mais do que muito ouro depurado; e são mais doces do que o mel e o destilar dos favos (Salmo 19:10-12).

Wadislau Martins Gomes

quarta-feira, maio 09, 2012

SONHOS DE PRECOCIDADE E FLORESCIMENTO TARDIO


Estive ruminando sobre a vida e a comunicação escrita, e um assunto sempre voltava à boca: o que é que faz um artista precoce e o que é que o define como tardio para florescer. Mozart foi precoce – criou obras inesquecíveis a partir dos cinco anos de idade. Cora Coralina (poeta brasileira) e Grandma Moses (pintora norteamericana) só começaram a ser valorizadas por sua arte depois dos cinquenta anos.

Menina ainda, eu sabia que escreveria. Datilografei treze capítulos do meu primeiro romance quando tinha treze anos – e aos sessenta e três ainda não terminei. Aliás, esse ficou no baú dos não publicáveis – mas estou sonhando com a publicação de outros dois (ah! desejados bestsellers!) mais maduros – para ontem! As pessoas me viam como literariamente precoce: devorava livros e minha mente estava infestada de ideias para múltiplas personagens, tramas novas, situações singulares em cinco continentes e duas línguas com igual habilidade.

O paraninfo de minha formatura do ginásio foi Érico Veríssimo, de quem eu lera tudo antes dos quatorze anos. A cena ficou na memória como menina como incentivo à florescência. No imaginário, escrevi milhares de contos, ensaios, poemas – alguns, cheguei até a colocar no papel – flores precoces.

Minha primeira publicação (que ajudaria a pagar certas contas) foi quando estava noiva. Recebi pelo artigo publicado nos Estados Unidos a grande quantia de quarenta dólares, com os quais comprei peças para o enxoval: toalhas de banho, lençóis e panos de crochê. Mas minha atividade literária verdadeira só começou depois que eu era casada e nossa família se expandia: comecei a traduzir para a Editora Mundo Cristão, recebendo em cruzeiros por aquilo que eu que passava do inglês para o português. Hoje em dia, continuo passando de uma para outra língua, recebendo menos reais por um livro do que receberia por uma tradução juramentada de cinco laudas. Já são quase cem livros cristãos – o que certamente indica mais produtividade e progresso literário meio incerto.

Não levem a mal esta menção a progresso literário incerto. Sou forte defensora da literatura cristã, e grata a Deus por participar ativamente dela desde os anos setentas. Claro, não obtive valorização literária no mundo fora de nosso gueto evangélico. Sei que meu valor não está nas coisas do mundo, mas no Senhor que criou não só o nosso mundo como também todo o universo – meu Criador e Salvador Jesus Cristo.

Contudo, já pensou se uma escritora cristã, realmente cristã, conseguisse vender livros como Paulo Coelho ou Augusto Cury?! Recentemente soube que Zíbia Gasparotto, que escreve livros espíritas psicografados (de um prisma bíblico são ensinos de demônios!) já vendeu mais de 16 milhões. E não precisa ser má literatura como a dela – o jornalista Laurentino Gomes já vendeu mais de 1,4 milhão de livros sobre história do Brasil. Já pensou se algum cristão conseguisse tornar aplicável e fascinante o conhecimento da vida cristã como esse jornalista faz ao recontar a história de nosso país? Há, sim, alguns grandes nomes cristãos na literatura: João Calvino e Martinho Lutero no Século 16, Blaise Pascal no Século 17, C. S. Lewis no século 20. Um ou dois a cada cem anos?

Diz a historia que Dwight L. Moody declarou: “O mundo está para ver o que Deus pode fazer com um homem inteiramente em suas mãos – pela graça de Deus, eu serei esse homem”. Moody foi, e Billy Graham reiterou o mesmo pensamento. Ambos foram homens que transformaram o mundo evangélico. Não aspiro a tanto, nem pretendo usurpar o ofício de grandes servos de Deus na vida da igreja e do mundo atual. Mas quero comunicar a verdade eterna de Deus – não como pregadora (a pregação da Palavra é para homens fiéis e idôneos que liderem a igreja visível) – mas como alguém que deseja atender o chamado de Jesus de Mateus 28.18-20, indo, por onde estiver no mundo, comunicando a verdade de Jesus Cristo a toda criatura, ensinando a guardar... Será o cumprimento do mandato cultural dado em Gênesis de cultivar e guardar!

Quero comunicar o amor de Deus com graça (em todos os sentidos), tocando e transformando vidas. Não estou atrás da produção apenas de uma boa leitura, mas de uma leitura transformativa e transformadora. Não preciso ser popular, conhecida ou respeitada como escritora – mas tenho necessidade de transmitir a mensagem que mudou minha vida e continua moldando meu caráter ainda tardio em florescer!

A meus amigos que partilham desses sentimentos, digo: continuem falando, cantando, proclamando, escrevendo – comunicando a tempo e fora de tempo. Algumas pessoas vão ouvir e ler – e como João, devorar o livro.

Desde que meus livros do passado ou para o futuro conduzam ao Livro dos Livros, valerá a pena. Nem precisará ser campeão de vendas – pode ser até de graça, se a graça do Senhor for vista e aplicada naquilo que escrevi.

Elizabeth Gomes