terça-feira, setembro 10, 2013

SUPERABUNDANTE GENEROSIDADE


"Generosidade de Deus" -- ao lado de nossa casa (foto de Tércio Garófalo).

Uma amiga que trouxe à nossa casa bandejas de guloseimas da festa de natal de sua empresa, quando um missionário e professor querido chegou para ser hospedado em nossa casa e nossa dispensa e geladeira estavam vazias. Um irmão que poupou as críticas e nos encorajou na caminhada com Cristo em um momento especialmente difícil de nossa vida. Uma judia que eu conheci em um encontro para futuros escritores e convidou a seis de nós colegas para comer (a suas expensas) em um restaurante fino de Philadelphia, simplesmente porque “recebi uma herança generosa e quero compartilhar com outras pessoas”. Um casal que, sendo Wadislau seu pastor anos antes, quando batalhava por cada centavo que recebiam como faxineiros, agora, financeiramente prósperos, ao contemplar uma viagem de sonhos para Israel, deu-nos passagens e ainda um dinheiro para eventuais despesas, “por simples gratidão”. Uma irmã em Cristo de grandes posses, sabendo que eu não tinha ajudante e estávamos prestes a hospedar um grupo de pessoas em nossa casa/Refúgio para um curso, veio com três faxineiras e suas próprias mãos e “deu uma geral” de cima a baixo em tudo, das janelas aos banheiros ao chão, por amor. Irmãs que compartilham sacolas de roupas, acessórios, sapatos e bolsas (às vezes ainda com etiquetas da loja de origem) para missionárias e velhas amigas como eu, multiplicando o compartilhamento com muitas outras servas do Senhor. Minha ajudante de uma vez por semana que faz questão de me presentear carinhosamente com trufas e artesanatos produto de suas mãos. Uma irmã que ao comprar cremes e maquiagens de griffe faz questão de mandar algo muito especial a outra irmã que não tem recursos para gastar em “superficialidades” que fazem tanto bem e perfumam a vida.

O parágrafo acima podia se estender por páginas para descrever alguns dos atos de generosidade com os quais fui contemplada. Contudo, por natureza, tenho de admitir que me esqueço rapidamente de favores recebidos, lembrando com muita presteza aquilo que fizeram de ruim ou não fizeram de bom por mim. Isso ocorre embora eu tenha sido agraciada com muitas coisas boas. Desde menina, testemunhei e fui e alvo de grandes e pequenos e gestos de generosidade.

Quanto ao assunto da generosidade, a Palavra de Deus é muito clara. Quero destacar dois aspectos: 1) A generosidade de Deus e 2) Deus deseja que o imitemos, e em nossas limitações humanas, desenvolvamos coração, mãos e vidas generosas.

Se procurarmos na chave bíblica o vocábulo “generosidade”, depararemos com algumas situações descritas como “generosidade” de reis que não exemplificam a bondade cristã e sim a abundância de presentes como forma de garantir favores ou estabelecer alianças. Mesmo o patriarca Jacó, queria comprar o perdão de seu irmão mandando bandos de camelos e gado, presentes afirmando que “agora sou próspero e quero garantir um acordo pacífico” (Gn 32); Esaú, que trocou seu direito de primogenitura por um guisado de lentilhas, foi mais nobre que seu irmão e generosamente o perdoou (Gn 33.4). Muitas vezes, nossa própria generosidade é motivada por um secularismo profano de “levar vantagem” ou assegurar acordos como nos acordos entre nações atuais.

Mas a generosidade de Deus é diferente. Benignidade e bondade são reveladas por Deus em todos os seus feitos. Ele é longânimo e assaz benigno (Sl 103.8) em todas as suas obras (Sl 145.17) – até mesmo com os ingratos (Lc 6.35). É o que nos conduz ao arrependimento (Rm 2.4) e, por sua generosidade, Deus nos perdoa segundo a abundância de sua misericórdia (Ne 13.22). A provisão de Deus é prova de sua bondosa generosidade (Sl 68.10) e por generosa bondade Deus nos consola (Sl 119.76). Na verdade, o Senhor nos dá tudo de que precisamos para a vida e a piedade (2 Pe 1.3-11).

Deus requer de seus servos essa mesma espécie de generosidade de forma geral (Pv 11.25;  Pv 22.9; Zc 7.9) como também especificamente – porque é o sentimento semelhante ao de Cristo (Fp 2.2; 5; 3.15; Rm 15.5; 2 Tm 6.18).

Ao estudar esse tema da generosidade, fiquei tocada pelo exemplo da igreja de Corinto, cuja generosidade em angariar oferta para os crentes da igreja perseguida de Jerusalém foi além do imaginável para gente cuja cultura gentílica era anteriormente egoísta. Eis aí, algumas de suas características marcantes (2 Co 8.2-15):

a) no meio de muita prova de tribulação, manifestaram abundância de alegria;
b) na profunda pobreza deles superabundou grande riqueza da sua generosidade;
c) na medida de suas posses—e mesmo acima de suas posses—se mostraram voluntários;
d) imploraram a graça de participarem da assistência aos santos;
e) deram a si mesmos primeiro ao Senhor, e em seguida, “a nós”; e
f) demonstraram suberabundância  na fé, na palavra, no saber, em todo cuidado, no amor mútuo.

De maneira totalmente contrária à do “evangelho da prosperidade”, Paulo não ordena aos crentes de Corinto, mas recomenda, como consequência da vida em Cristo, que provem “pela diligência de outros a sinceridade do vosso amor”, completando a obra começada “segundo vossas posses”. Ele ainda enfatiza que Deus aceita nossa oferta generosa quando de boa vontade conforme o que a pessoa tem – não segundo o que não tem, com a motivação de outros terem alívio e quem foi generoso não ficar sobrecarregado! O alvo dessa generosidade: para que haja igualdade entre os irmãos (vv 13, 14), para que a presente abundância supra a presente escassez deles, para que a abundância deles venha a suprir vossa falta, e assim, haja igualdade.

Fiquei impressionada com o reforço da repetição de termos contrastantes, como abundância/escassez, riqueza/pobreza. Em vez de destacar o lucro quando somos generosos, Paulo joga com palavras lembrando que Jesus, sendo rico se fez pobre por amor de nós, para, por sua pobreza, nos tornar ricos! Ele Jesus, sendo Senhor do universo, esvaziou-se, tomou forma de servo até a morte, e morte de cruz – para nos enriquecer com toda sorte de bênção espiritual nos lugares celestiais! Isso não é questão de “torta no céu”, mas sim, no passado e para o presente e o futuro. Viver baseado na obra de Cristo, aprendendo a “estar contente em toda e qualquer situação... humilhado, exaltado, tendo tudo, nada tendo...”, experimentando sempre “O que muito colheu não teve demais e o que pouco colheu não teve falta”, é uma lição de generoso céu.


Você e eu, quer sejamos agentes quer receptores da generosidade, podemos, sim, devemos ser ambos – agindo por bondade em abundante graça na vida de dar e receber! Não me lembro o autor, mas lembro desde menina de cantar:
 
 
Que te darei meu Mestre,
            Meu tudo é nada em si
            E se eu te der o quanto eu tiver
            Serei devedor a ti.
                     Cristo, meu tudo é nada diante da imensidão
                     De tua graça demonstrada em nossa salvação.
                     Mas o meu nada é tudo se posto a teu dispor.
                     Haja o que houver, e venha o que vier, sou todo teu, Senhor!

Elizabeth Gomes
 
 
(Veja ainda, de Elizabeth Gomes, “Generosidade e gratidão”, Ética (nas pequenas coisas); São Paulo: Editora Vida, 2010, p. 126).