segunda-feira, novembro 28, 2011

PONHA UM POUCO DE ARTE NO LOUVOR



Às vezes, escutando um pouco de boa música, fecho os olhos da cara e abro os da alma para louvar a Deus pela graça que cai sobre crentes e incrédulos, como sol e chuva ou nascer e por-de-sol. Meu Deus! Que beleza há na música da tua presença; que sintonia com tua glória – a distonia do canto decaído não consegue prevalecer contra o teu fulgor e só realça tua verdade e teu amor. Olha só com que beleza o incrédulo louva seus ídolos:



Eu fico com a pureza da resposta das crianças / É a vida, é bonita, e é bonita / Viver e não ter a vergonha de ser feliz / Cantar e cantar e cantar / A beleza de ser um eterno aprendiz / Eu sei que a vida devia ser bem melhor e será / Mas isso não impede que eu repita / É bonita, é bonita, e é bonita (O que é o que é? Gonzaguinha).

Não foi uma só vez que o Senhor Jesus usou um exemplo do mundo para nos advertir do mal e nos estimular ao bem. "Eis que eu vos envio como ovelhas para o meio de lobos; sede, portanto, prudentes como as serpentes e símplices como as pombas" (Mateus 10.16) ou "dais o dízimo da hortelã, da arruda e de todas as hortaliças e desprezais a justiça e o amor de Deus; devíeis, porém, fazer estas coisas, sem omitir aquelas" (Lucas 11.42). Paulo também citou um poeta secular: "como alguns dos vossos poetas têm dito: Porque dele também somos geração" (Atos 17.28).

Foi com essas coisas em mente que perguntei ao filho: "Por que é que crente não faz coisa tão bonita para Deus, como os incrédulos fazem para seus ídolos?" A resposta foi pronta: "Eles não tem compromisso com os ídolos, o que lhes facilita a expressão." É certo, e tem mais: alguns dos nossos não têm tanto compromisso com Deus que lhes facilite a arte do louvor. Tem gente que pensa que basta dar um tapa no pescoço do violão que sai corinho. Para cantar louvores a si mesmos, os filhos de iemanjá, de oxalá e de exu gastam horas afinando a arte, o coração e o gesto. Se não vão à escola, dedicam-se ao discipulado aos pés dos grandes compositores ou intérpretes. Principalmente, submetem-se à crítica, às vezes ranzinza, dos que sabem de canto e encanto. Muitos dos nossos preferem o pop (não confunda com popular, que, quando bom, pode ser lindo; pop é a tendência de manter a média para efeito de mercado), de venda fácil e de gosto pobre. Daí vem uma cultura gospel que não é outro evangelho só porque não existe outro.

A experiência de muitos com o louvor costumeiro das igrejas pop vem bem descrita na anedota caricata. Um crente simples, da roça como eu, vai à cidade e, na volta, relata à mulher a visita que fez a uma igreja.

E como é que foi? – arrasta ela.

Iguar aqui – diz ele – iguarzinho só que diferente.

Diferente?

É, cê vê: aqui a gente canta: "Se da vida as vagas procelosas..." Lá, vai uns moço na frente e canta: "A vaca foi pro brejo, foi pro brejo / a vaca foi, foi pro brejo / eu louvarei... a vaca foi pro brejo..."

Só isso?

Eles repete um monte de veis até a gente acreditá que a vaca foi pro brejo.

Não sou contra o louvor nem a participação no culto. Não, sou mais é a favor. Mas, como disse também o Vinícius, "beleza é fundamental". Assim, ouça com graça o que digo. O louvor é a atribuição a Deus de tudo que sua graça nos proporciona em Cristo, e a adoração é nossa rendição à sua vontade graciosa e eficiente. Esteja certo disto: o louvor não liberta – "conhecereis a verdade, e a verdade vos libertará" (João 8.32). De fato, a verdade liberta o louvor, como bem disse o músico poeta: "O meu louvor é fruto do meu amor por ti, Jesus, / de lábios que confessam o teu nome" (Asaph Borba, ver Hebreus 13.15).

Tem mais: o louvor pop parece querer nos convencer de que o culto público, da maneira requerida pelo Senhor, estaria indo para o brejo em termos de não atingir o objetivo de ganhar pessoas para a cantoria. Daí, uma "equipe de louvor", como levitas extemporâneos esquecidos do sacerdócio universal dos crentes, põe um cultinho dentro do culto, com "nova" palavra profética, oração poderosa e novo cântico: "Há momentos em que palavras não resolvem". Depois dessa, coitada da pregação sobre a palavra criadora do mundo, a Palavra escrita e a Palavra Viva, a palavra a ser dita a tempo e fora de tempo e as sete palavras da cruz. "É jeito de dizer", diz alguém sem jeito. Mas há jeito certo para dizer a verdade em amor! Outros cantam: "Deus não é Deus de longe... mas de perto." E como ficam as palavras de Deus: Acaso, sou Deus apenas de perto, diz o Senhor, e não também de longe (Jeremias 23:23)?"

Para por um pouco de arte do louvor, Vinícius dá a receita, ainda que num uso pervertido: "Ponha um pouco de amor numa cadência" (Samba da bênção, Vinícius de Morais). Ponha um pouco de amor a Deus e aos homens, fornecendo o que Deus quer e que é o de que o povo realmente necessita: a verdade em amor, e com beleza! Em vez de tentar ser o show do horário nobre da igreja, busquemos ser nobres em regime de 24 horas por dia. Apliquemo-nos à vocação e aos dons da maneira como Deus quer e como o povo precisa, com sabedoria, com diligência, transmitindo graça aos que nos ouvem! Umas lições de Bíblia, de teologia e de arte fariam que a "banda de cá" fosse coerente com a "banda de lá" e que proporcionassem o verdadeiro "louvor da glória de sua graça" (Efésios 1.12), tornando a igreja toda em um verdadeiro "espetáculo ao mundo, tanto a anjos, como a homens" (1Coríntios 4.9).

Wadislau Martins Gomes
a

quinta-feira, novembro 10, 2011

MEMÓRIA DE ELEFANTE


De saída do Brasil por algum tempo, Beth e eu fomos nos despedir do irmão cuja idade chamava esse cuidado. Depois de quase meia hora de aguardo veio ele, levantando o braço num tic característico. “Que bom vê-los... estava orando por meu filho” – os olhos do Dr. Fanstone estavam úmidos de rogo – “e o tempo passou... a única coisa que aumenta com a idade é meu forgetfulness...”

Comigo ocorre coisa igual, de maneira diferente. Sou esquisito. A falta de memória vai crescendo para muita coisa boa, mas consigo me lembrar até mesmo do endereço do Manezinho que me bateu quando eu era menino. Memória de elefante.

Hoje, meio esquecido dos males que posso e devo ter causado, estava lambendo feridas de leão sem dente. É que mágoas novas fazem arder cicatrizes antigas, irritando a pele da alma com possibilidade de brotoeja que se mal cuidada pode até virar pelagra. Lembrei da palavra má que não foi contida, da verdade dita sem amor, da mentira que foi estouro de manada, da ingratidão que cuspiu no prato em que comeu. Ia por aí, quando me dei conta de que qual cachorro abusado, eu estava latindo para as sombras da noite que já havia passado.

            Confessei a Deus e continuei a lembrar. Um dia, antecipando a chegada do pastor Ary, implorei a Deus que pusesse um pouco de óleo na panela lá de casa. À época, pior do que passar fome era não ter o que servir ao amigo. Na rua, entre trabalho e oração, ouvi: “Pastor!” Era um diácono da igreja batista, secretário de estado, que continuou: “Bom encontrá-lo. Achei em casa um cheque do ano passado que deveria ter passado... aqui está em espécie”. Bem da espécie do que eu precisava.

            Outra vez, a casa cheia na fazenda de O Refúgio, recebi um hóspede com honra de empresário de proa. Como sempre, vai oração. O que tínhamos era farinha, e ovos e verdura de quintal. Já quase na hora de cumprir a obrigação de comer, ouvi os gritos do Chiquinho, mirrado como sagui molhado: “O pai tá chamano; o boi infiô os chifre na furquia e ta morreno e pricisa abatê”. Rápido que nem vôo de andorinha, atendemos o chamado. Davi preparado para carnear o bicho, Deborah e Daniel de olhos acesos, Beth meio assustada, eu disposto a brandir a marreta, e o visitante experiente de muitas caçadas, com faca curva na mão. Deu carne para todo mundo; ao colono, as carnes duras, “melhor pra charque”, e, a nós, as carnes “moles”.

            Depois, como para macaco que muito pula, veio o chumbo. O acidente em que atropelei um burro (o outro burro morreu) – eu, desmaiado e dado como morto, falei: “Porque ele vive, eu também viverei” (obrigado, Gioia Jr.); os olhos do Davi, o AVC da Beth, a faísca elétrica do Daniel e o afogamento do neto, Jonathas. De tudo, o que ficou mais foi a certeza de que já não oro a oração do covarde que prefere deixar as coisas como estão a fim de não dar mais trabalho: “não me dês nem a pobreza nem a riqueza; dá-me o pão que me for necessário; para não suceder que, estando eu farto, te negue... Ou que, empobrecido, venha a furtar e profane o nome de Deus (Provérbios 30:8-9). Antes, aprendi a oração do servo:

porque aprendi a viver contente em toda e qualquer situação. Tanto sei estar humilhado como também ser honrado; de tudo e em todas as circunstâncias, já tenho experiência, tanto de fartura como de fome; assim de abundância como de escassez; tudo posso naquele que me fortalece (Filipenses 4:11-13).

Ó meu Deus, continua a trazer à minha memória os teus ensinamentos em todas as situações e que eu não me esqueça de nenhum dos teus benefícios, sejam as feridas sejam as glórias de Cristo!

Wadislau Martins Gomes

domingo, novembro 06, 2011

O MOMENTO E A FOTO DE AMOR E ARTE

            (foto e comentário de Rev. Allen Porto)

Como um pai educa um filho?
O Rev. Tarcizio F. Carvalho faz isso trilhando caminhos com a pequena Joana. Às vezes pisando na água e em territórios inexplorados, às vezes supreendendo-se com a criança em face de novas cores, árvores, ou pássaros. Ele está ao lado na caminhada, de uma forma dizendo: "descubra! vá além!"; e de outra demonstrando: "estou aqui, logo ao seu lado".
Esta imagem me faz pensar sobre uma série de elementos da paternidade, não apenas do estrito ponto de vista familiar, mas ampliando para a família da fé, e me lembra ainda mais sobre como Deus nos acompanha em toda a vida. — with Tarcizio F. Carvalho at Praça Gonçalves Dias, São Luís, Maranhão.


Fiquei extremamente tocado ao ver a foto. Por duas razões: uma, repetindo meu filho, Davi Charles Gomes, “é a melhor foto que vi este ano”; outra é que os reflexos da beleza do amor no momento do encontro do pai e da filha com o artista proclamam a glória de Deus. Daí, quis “poemar” em forma de louvor:

O momento e a foto de amor e arte

A filha olha os reflexos surpresos
e o pai olha surpreso seus reflexos
de vida e de afetos, ambos presos
de círculos, de imagens e de nexos.
A filha reflete sobre luz e cores
que aos pés agita e que recria a vida;
cuidoso, o pai reflete sobre amores
agitados na alma refletida.
Os céus, as árvores e as pedras alvas,
calam palavras que o coração
ouve e reflete altas como salvas.
Paz de pós chuva que a vista coça
como um tremer de ninho e de oração
– de pai e filha chapinhando a poça.

Wadislau Martins Gomes