domingo, setembro 30, 2012

PELE PARA FAZER CUÍCA


 
Clélio (nome fictício) veio a O Refúgio trazido de uma cidade vizinha. Não educado, 31 anos, mostrava a natureza do problema na pele afogueada, no cheiro acre e nas juntas inchadas. “Como é que soube a nosso respeito?” – perguntei, e a irmã atalhou: “Ele está bêbado que nem peru em véspera de natal”. O fato era que ele já vinha bebendo por vinte e dois anos e, os últimos dez, entrando e saindo de sanatórios. “Então, será possível ajudar? Podem fazê-lo para de beber?” – ela continuou. A sequidão da alma estava ali, implorando uma talagada de ajuda! Os familiares que cuidam de alcoólicos sofrem ressacas de desespero e mostram síndromes de abstinência de esperança como se fossem eles os escravos da garrafa! Bebem de um cálice de ira que jamais se esvazia e que nunca satisfaz.

Clélio dormiu o resto do dia e a noite toda. No dia seguinte, estava agitado e às voltas como animal enjaulado. Queria conversar, mas, tão logo nos assentamos em um banco de pau, sob as árvores à frente da casa, ele ora era tomado de choro ora de esquecimento. “Como eu poderia penetrar esse peito e alcançar esse coração curtido de álcool e de desgosto?” – pensei. Sobretudo, era difícil manter a atenção na pessoa e na situação, quando as palavras desencontram os gestos. Parecia um jogo de esconde-esconde: agora você me vê, agora não.

Na segunda noite, as coisas explodiram. Foi um pesadelo daqueles de que a gente acorda de susto e de peito arfando. Clélio, aos gritos, rodava no quarto e lançava objetos contra as paredes grossas do casarão antigo. Ao chegar à porta rústica e de gonzos e ferrolho de ferro, vi pelas frestas que ele tinha o cabo do machado erguido à frente e ao alto da cabeça, mãos na extremidade e junto do olho do ferro, pronto para deslizar e rachar a madeira. “Clélio – procurei manter a voz segura e calma – é o pastor. Lembra de mim?” Não estava seguro de que me identificaria, e nem estava calmo. “Sei quem é...” – ele gritou de volta. – “É o homem que vai me ajudar!” “Abre a porta. Vamos conversar.” “Com eles não tem conversa.” “Eles quem?” “Estão querendo tirar a pele da minha mãe para fazer cuíca!” Gastamos o restante da noite, conversando, do lado de fora da casa, no escuro. Clélio ia e vinha, da prostração à alucinação; apontava para as sombras das árvores, e repetia: “Lá vêm! Olhe! Estão chegando... já pegaram minha mãe! Não!”

A cuíca, na mão de um bom tocador, ronca, geme, ri e chora, e quase fala, marcando a cadência do samba. Na terra da minha infância, quando as festas do natal chegavam ao fim, crianças e donas de casa partiam para recolher os gatos, se não, “vira coro de cuíca”. Eu podia sentir o terror de Clélio, impotente para salvar a mãe de virar marcação de enredo no meio da rua. Ele estava totalmente embebido da situação. Percebia, via, pensava, concluía, sentia e se movia no drama pesadelo – e ele estava acordado! Estava?

O álcool altera o estado psicológico de uma pessoa de maneiras estranhas. Uma pequena quantidade reduz a inibição dos impulsos e, por algum tempo, poderá “elevar o espírito”, mas, na verdade, o álcool é um depressivo. Por isso é que a “alegria do copo” deixa a pessoa com aquele ar “bobo alegre” e, depois, rouba-lhe a alegria e deixa na alma um vazio que, ela acha, só será preenchido com mais um copo.

O que é que acontecia com o Clélio? Talvez, tivesse começado a beber para se sentir melhor, superar uma amargura, ira, ou apenas para lidar com uma inabilidade social. Qualquer que tenha sido a razão, ele se sentiu melhor depois de um gole – provavelmente, o mesmo efeito do ansiolítico ministrado no sanatório, da primeira vez que ele “deu uma de louco”. De início, ficava eufórico, até que a bebedeira progrediu para os estados de enevoamento, torpor e, mais tarde, de perda de consciência. “Já passei por todos os estágios” – ele disse – “alegre que nem macaco, bravo que nem cachorro, triste que nem sapo e largado que nem porco.”

De fato, parecia que Clélio mesmo já tinha sido esfolado e os sons que emitia eram os do ronco da cuíca. Não é nada fácil conversar com quem já perdeu as esperanças, ou melhor, com quem põe toda a esperança na próxima rodada. Um bom tocador tira música da cuíca, mas não tem conversa: cuíca “fala” e faz a gente sentir, ainda que o artista se cale quanto aos próprios sentimentos. Você já experimentou falar com uma cuíca? Foi assim que me senti, tentando conversar com Clélio. No entanto, eu estaria bêbado de ceticismo, se perdesse a esperança de varar a pele curtida da sua condição, para atingir a haste da miserabilidade da sua alma chorosa. Certamente, Clélio tinha um problema de apresentação com o álcool, mas, debaixo da pele, dentro do peito macilento, o ronco do coração era o problema verdadeiro: bêbados estão, mas não de vinho; andam cambaleando, mas não de bebida forte (Isaías 29.9).

 Clélio era dependente do álcool, mas seria esse o seu problema? Certamente, era um deles. Entretanto, não era o problema básico. Havia mais sob a pele macilenta que somente poderia ser acessado mediante adequado conhecimento dos diversos elementos envolvidos. Para isso, a Palavra de Deus fornece uma grade de escrutínio. Ele atravessou os anos, crendo que havia achado a fonte de satisfação para as suas necessidades. Estava triste? Bebia para se alegrar. Estava alegre? Bebia para comemorar. Culpado? Bebia para esquecer. Bebia até dormir, para acordar e, de novo, beber até que confundisse a noite com o dia. A tolerância desenvolvida dava-lhe a impressão de que o organismo funcionava bem com o álcool no sangue. Depois de descobrir que a bebida relaxava o corpo, aumentava a autoconfiança e minorava a dor, Clélio aumentou o consumo. “Às vezes, me dá um branco na cabeça” – ele disse – “e sequer me lembro do que fiz na última noite”. A família havia tentado de tudo. Internações sob modelo médico, tratamentos psicológicos de contenção, aversão, reuniões e apoio, até então, não haviam dado certo. Havia algo sendo esquecido: o verdadeiro problema. O problema humano. Pessoas desejam, respeitam, abominam e temem o álcool, mas não o compreendem exatamente. O que precisa ser bem entendido é que, antes de ser a causa de um problema, as drogas são sintomas do problema. Muitas pessoas pretendem ignorar o fato de que alcoolismo é, em última instância, um problema do coração, não somente um comportamento externo; e santidade é resultado de arrependimento e fé, não simplesmente de abstinência.

Ninguém ainda havia levado em conta, e nem mesmo poderia sem o conhecimento da graça, que aquele homem – rosáceo e rescendendo a restilo de cana, magro como pau de cerca e balofo como esponja encharcada – fosse uma criatura de Deus, feita para refletir o brilho do seu caráter (a todos os que são chamados pelo meu nome, e os que criei para minha glória, e que formei, e fiz; Isaías 43.7).  Nem mesmo Clélio, no espelho, podia ver dentro da pele o homem que deveria ser. Experimentava a existência em um circulo de morte, mundo afora e no interior (pois todos pecaram e carecem da glória de Deus; Romanos 3.23). Não podia ver porque tinha os olhos toldados para uma vida além do imenso bar em que uns bebem e outros servem a bebida. Como é que pessoas embriagadas de pensamentos e atos inglórios poderiam ajudar aos que creram nelas e beberam de suas fontes? (Porque dois males cometeu o meu povo: a mim me deixaram, o manancial de águas vivas, e cavaram cisternas, cisternas rotas, que não retêm as águas; Jeremias 2.13). Nem Clélio nem parentes nem amigos nem seus ajudadores jamais consideraram que o cálice de pinga teria de ser retirado do coração, e que isso só poderia ser feito pelo único que sorveu o cálice da nossa condenação para nos dar a beber do cálice da sua comunhão. (Porventura, o cálice da bênção que abençoamos não é a comunhão do sangue de Cristo? O pão que partimos não é a comunhão do corpo de Cristo; 1Coríntios 10.16)?

Havia tempos de completo abandono à bebida, com poucas pausas de alguns dias e com sofridas “ressacas”. Por mais de duas décadas, ele viu a mãe e a irmã irem dos rogos ao choro, de promessas a iras, até que a vida familiar foi destruída e reorganizada em torno do seu problema. A preguiçosa dependência contribuiu para a dissolução do seu caráter. Mentia, roubava, fez uma porção de inimigos – até que, um dia, nada mais restou de valor em sua vida.

Clélio não conseguia manter uma conversa coerente. Alucinações lhe assomavam mesmo quando “sóbrio”. Não era uma questão de quanto bebia. Uns goles eram suficientes para lhe trazer ilusões, como ver tartarugas dançando no balcão, ou vacas aladas do tamanho de gatos agarradas aos lustres, no teto. O que lhe ia na mente? Como acessar e prover para as suas necessidades? Estaria apto a entender minhas palavras? Em orações, pedia a Deus que me orientasse e provesse um caminho para penetrar a nebulosidade do seu coração. Estava certo de que somente o espírito de um homem sabe as coisas do próprio homem, e o Espírito de Deus que nele age (cf. 1Coríntios 2.11-12).  Da mesma forma, confiava na promessa de que há um caminho santo pelo qual não passam os imundos, mas que, havendo purificação, quem quer que por ele caminhe não errará, nem mesmo o louco (Isaías 35.8).

Clélio trazia consigo toda sorte de problemas físicos. O menor deles eram os pés com perfurações devidas à falta de sanguificação. Havia desenvolvido cirrose, enfisema pulmonar, dilatação do coração, além do fato de seus problemas orgânicos terem-lhe causado disfunções cerebrais. Graças a Deus, Clélio não parecia ter sido afetado em todas as áreas do corpo – mas só Deus sabia quanto teria sido afetado no corpo e na alma. Pela mesma graça, Clélio não estava além do alcance da comunicação. À medida que o tempo passava, ele se mostrava mais capaz para entender as coisas e reagir a elas em termos mais tangíveis. Ele diria, por exemplo: “Eu sou um homem bom... Não sei porque eu bebo... Eu... eu... Olhe essa mangas aos pés das árvores... elas... hã... Tenho saudade de casa...” Obviamente, ele estava alcançando o mundo exterior – indo além de sua própria pele. Mas não parava aí. Suas melhores condições para apreensão de tempo e circunstâncias se mostravam durante os períodos de adoração e louvor. Ele pedia que cantássemos um dado hino, e, depois, dizia: “Podem orar por mim?”

Um dia, em sua primeira semana em O Refúgio, depois de sofrer as alucinações com a cuíca, Clélio não me reconheceu. Ele entrava em casa no mesmo instante que eu saia pela porta: “Quem é você?” – havia pânico em sua voz. Fui a única pessoa que ele admitiu em seu quarto durante as alucinações provocadas pela abstinência do álcool. Como não me reconhecia? “Você está bem?” – a pergunta era retórica – “Sou o pastor Lau, você se lembra?” “Quem é você?” – ele estava realmente transtornado com a situação. Horas mais tarde, Clélio era outra pessoa. Veio a mim, chamou-me pelo nome, sem jamais mencionar o lapso de memória.

Nos catorze dias que Clélio passou conosco, testemunhamos todas as faces de que ela havia falado: macaco, cão, sapo e porco. Acaso não vemos essas mesmas faces em todo pecado – e uma dúzia de outras faces? A menos que alguém seja convencido pelo Espírito todos nós, quer bêbados de pecado quer renovados dele, jamais poderemos entender a insídia do pecado. Contudo, uma vez que reconheçamos na Palavra de Deus que a raiz do problema não está naquilo que entra pela boca, mas aquilo que flui do coração (Provérbios 4.23) – então, abriremos as cortinas do grande mistério revelado. Como Paulo disse, não deveríamos nos embriagar com vinho, mas sermos tomados pelo Espírito, mudando nossa maneira de pensar e falar (Efésios 4).

Era disso que Clélio precisa saber, e saber além da compreensão humana, em termos de compreensão espiritual: que o álcool não era um libertador, mas um senhor de escravos. Observe por exemplo, como Paulo se interpôs na “bebedeira” de Onésimo e de Filemom. Havia um escravo, Onésimo, preso de todo tipo de pensamento e ação dirigido a uma liberdade pessoal. Tanto se devotou ao deus-liberdade que se tornou bêbado dos próprios desejos. O coração obcecado obrigava o corpo à miséria do que seriam suas riquezas. Logo, possivelmente, apropriou-se de bens que não eram seus e fugiu do seu mestre. Filemom, um cristão, senhor de escravos, estaria bêbado de frustração. Desejoso de senhorio, tinha o coração tomado de pensamentos a respeito de Filemom. Algo mais ou menos assim: “Aquele a quem eu dei de comer...”, ou “ele me roubou...” ou ainda, “esse ingrato... eu era bom para ele”. Somente Deus sabia de sua bebedeira de justiça (sempre autojustiça!) resultantes em suas mãos, sentida na pele. Como foi que Paulo lidou com os dois? Foi como dizer: Não se embriaguem com desejos do coração, os quais transparecem na pele através do comportamento de cada um. Antes, ponham para fora toda espécie de “espírito” (como eflúvios alcoólicos) tanto da “liberdade” como do “poder”, e ponham para dentro o dom do Espírito de Deus, o qual é selo dos Filhos de Deus e irmãos entre si, em Cristo.

Ah! Se apenas Clélio pudesse ver seu desejo do coração, de libertação do jugo da pobreza, da insignificância, da inabilidade para se relacionar com pessoas, e sua sede para “dar o troco” à monstruosidade que lhe fora perpetrada e que o formara em quem ele pensava ser... Se apenas ele visse que os próprios desejos do coração eram grilhões da mesma escravidão, e sua condenação... Mas, como dizer-lhe? Certamente, como Paulo fez: abrir-lhe os horizontes para contemplar o bem maior, mais alto, profundo e extenso, do amor de Deus (cf. Efésios 3.14-21)!

Teria de mostrar-lhe o quadro do arrependimento e fé a fim de dar-lhes as formas, as cores e a impressão de como Cristo poderia redimi-lo efetivamente. Assim, ele teria de entender que a redenção de Cristo é diferente das redenções propostas pelo mundo. Que não é como o círculo vicioso do alcoolismo, em que cada tentativa de libertação afunda mais na escravidão de um senhor pior e em que cada tentativa de autojustificação resulta em maior injustiça. Ele teria de ouvir e crer na redenção que promove o homem a um alto nível de relacionamento com Deus e com o próximo. Mas como?

A irmã de Clélio veio pela manhã, e simplesmente disse: “Prefiro ver meu irmão bêbado do que como um crente”.
 
Wadislau Martins Gomes

quarta-feira, setembro 26, 2012

CARATER, PESSOA E PERSONAGEM



Caráter, no Aurélio, inclui o conjunto de qualidades de um indivíduo (boas ou más) que determinam sua conduta e concepção moral, firmeza e coerência de atitudes, domínio de si. Já as pessoas de língua inglesa, além dessas qualidades de conduta e concepção, vêem o caráter de forma mais lassa – a personagem de uma história ou peça teatral é sua character; e sobre alguém de índole ou atitude jocosa fala-se “He’s quite a character” – com sentido totalmente diferente de “He is a person of character and integrity”.

Estive pensando no que forma o caráter de uma pessoa e como as personagens de meus contos, por exemplo, precisam ser construídos para ser não apenas verossímeis, mas também verdadeiros. Quando o cristão escreve, é necessário que construa um pensamento que revele algo verdadeiro – mesmo quando escrevendo ficção – e ilumine e norteie a vida do leitor, comunicando graça e verdade. Pelo menos, é isso que idealizo ao pensar nas pessoas e personalidades que invento – para que edifiquem as pessoas verdadeiras que lêem, a fim de que a Jesus seja, em primeira e última instância, a Pessoa glorificada. Parece complicado – e é! Na verdade, muitas vezes, nós aprendizes de escritor não chegamos a entender nossa própria pessoa, quanto menos compreender o que seja um caráter coerente de fala (ou escrita) e vida.

O único jeito de começar a entender isso é compreender, com todos os santos, qual é a largura, e o comprimento, e a altura, e a profundidade e conhecer o amor de Cristo, que excede todo entendimento, para que sejais tomados de toda a plenitude de Deus” (Ef 3.18). O que essa profunda verdade teológica tem a ver com uma verdade da comunicação escrita? Cremos em um Deus que é Verbo e Vida (Jo 1.1,4) e não dá para separar o que comunicamos daquilo que vivemos; assim como não podemos separar o Verbo de Deus, Jesus, da Vida que está nele. A comunicação de palavra e de procedimento em Jesus é multifacetada – inclui largura, altura, profundidade e todos os demais aspectos, excedendo todo o entendimento, para que sejamos tomados de toda a plenitude de Deus! Não pode ser apenas uma parcela do pensamento – é toda a vida para a vida toda!

Ao mesmo tempo em que esse ideal apresenta múltiplas complexidades, é também simples como pão e água – como as metáforas mais simples que Jesus usou para comunicar às pessoas simples de vidas complicadas pelo pecado: “Eu sou o pão da vida” (Jo 6.35) e “tu lhe pedirias, e ele te daria água viva” (Jo 4.10).

O compilador de Provérbios engloba em sua introdução os diversos aspectos da sabedoria e da comunicação inteligente:

Para aprender a sabedoria e o ensino; para entender as palavras de inteligência; para obter o ensino do bom proceder, a justiça, o juízo e a eqüidade; para dar aos simples prudência e aos jovens, conhecimento e bom siso. Ouça o sábio e cresça em prudência; e o instruído adquira habilidade para entender provérbios e parábolas, as palavras e enigmas dos sábios. O temor do Senhor é o princípio do saber, mas os loucos desprezam a sabedoria e o ensino. Filho meu, ouve o ensino de teu pai e não deixes a instrução de tua mãe. Porque serão diadema de graça para a tua cabeça e colares, para o teu pescoço (Pv 1.2-9).

Parece-me esta uma descrição dinâmica de como o caráter é formado e firmado! O mesmo Koheleth, o pregador e sábio Salomão, descreveu a busca por palavras que exprimam caráter, concluindo que “debaixo do sol – quando visamos apenas o que é terreno – a produção intelectual é enfado da carne”. Mas quando as palavras e os pensamentos são conforme a Pessoa que inventou comunicação e comunhão, elas valem e transformam.

Procurou o Pregador achar palavras agradáveis e escrever com retidão palavras de verdade. As palavras dos sábios são como aguilhões, e como pregos bem fixados as sentenças coligidas, dadas pelo único Pastor. Demais, filho meu, atenta: não há limite para fazer livros, e o muito estudar é enfado da carne. De tudo o que se tem ouvido, a suma é: Teme a Deus e guarda os seus mandamentos; porque isto é o dever de todo homem. Porque Deus há de trazer a juízo todas as obras, até as que estão escondidas, quer sejam boas, quer sejam más (Ec 12.10-14).

O próprio Salomão foi uma pessoa e uma personagem de múltiplas camadas, que conheceu a sabedoria mais que outro qualquer da história humana, teve inteligência e resultados ilimitados de suas atividades intelectuais – no entanto, faltou-lhe caráter na hora de aplicar à vida conjugal e, enfim, à vida comum em seus mais diversos aspectos.

As palavras dos sábios são aguilhões, são lanças – jogadas para um objetivo que está mais longe do escritor – assim também desejamos alcançar além de nós mesmos e de nosso círculo restrito de conhecidos. Porém, são também pregos bem firmados – fincam fundo, unem e coadunem “as sentenças coligidas dadas pelo único Pastor”. Em essência, quem nos faz escrever é Deus, que apascenta-nos e dá-nos música e movimento. Não somos inspirados da mesma forma que a inspiração da Escritura – que é toda e única (2Tm 3.16). Porém, o que nos move a escrever, a comunicar – é o Criador de toda criatividade!

Não é fácil escrever – exige planejamento, elaboração e buriladas constantes. Mas também não é difícil a comunicação – exige a simplicidade da graça, verdade, sintonia com o Autor da vida e consumador da fé.

Elizabeth Gomes

sexta-feira, setembro 21, 2012

A LEI DOS MEDOS E DOS PREÇOS


 
“Chegou a cachoeira”, diz um. O outro gritou: “É a queda!” “É cascata”, comentou o gaiato, falando de lado. O político condenado, circunspecto como vela a barlavento, declarou: “Vou ao supremo”. Alguns, mais sagazes, perguntaram: “O que é o supremo?” E perguntam com razão. É que nesta terra macunaíma, tudo vira tudo e nada muda. Quer dizer, há aparentes mudanças como as de um rio, com revoluções, enchentes e secas, mas sempre no mesmo leito. Mudam o nome de coisas, de políticos, de partidos, de orientação da mídia e de movimentos dos tempos – mas permanece o quadro do cavaleiro emplumado, espada desembainhada, na moldura dourada: “Independência ou morte”. Nem o grito foi original – coisa da humanidade vinda de outros milênios de luta pelo poder. Nessa toada, passam as águas ipirangas, as canoas viram, os náufragos se desesperam e as margens plácidas do traço de água ouvem os passantes que prosseguem sem entender o grito heróico, entoando: “A canoa viro por deixá-la virar...”

A cena é lugar comum em uma terra em que reinóis à cata de ouro distraiam os românticos otimistas com a lengalenga de que “em se plantando tudo dá”. Enquanto o casario e a mesa punham ares de trabalho no solo, o subsolo era minado e os rios, poluídos. Não tenha dúvida – nada é incidental quando se trata de luta pelo poder.

Onde a razão suprema? Onde o problema recorrente? A razão está em que não se constrói uma nação livre sobre uma base de liberdade à parte de um compromisso. O problema está em que não se conquista essa liberdade “no grito”. Nossa história se resumiu a “canetadas”, da Lei Áurea até os golpes de 64 e de 02. A primeira, promulgada em favor dos senhores de escravos – pondo na rua os que não cresceriam para servir, depois, os que não prestariam como força de trabalho, e, então, todos os que gerariam encargos sociais. A segunda, as tomadas do poder na força bruta aos gritos de diretas já, mas sem direção moral. Com tudo o que ocorreu entre essas pontas, jamais ficamos sem escravos nem senhores de escravos e jamais vimos imperar a honestidade. É claro que aqui e ali surgem homens de bem, mas tudo o que conseguem é apanhar uns magros bodes expiatórios que recorrem à supremacia da lei.

Supremacia do quê? É isso mesmo: suprema ditadura da lei – às expensas da justiça. Claro que isso precisa de explicação! Não está em nenhuma cartilha nacional, em nenhum foro adequado nem na cultura do povo. Este, coitado, aceita a propina do peixe que lhe é dado pelos senhores dos rios sem nunca aprender a pescar. “Pra quê, se o peixe nem é deles? Está aí, é só pegar. Não é essa a lei de Gerson?” A explicação é: toda a lei deveria ser gerada e mantida na base da justiça, e não a justiça ser derivada da lei! Esta sempre acaba sendo a lei dos medos e dos preços!

No tempo de Dario, rei da Pérsia, o reino foi dividido em cento e vinte seções governadas por presidentes e sátrapas, uns sábios e justos, outros nem tanto. Daniel – hebreu cativo sob domínio persa, homem de Deus, sábio e justo – excelia em espírito sobre os demais, sendo cotado pelo rei para presidir sobre toda a terra. Os políticos buscavam ocasião para cassá-lo, mas o homem tinha ficha realmente limpa. Não deu outra. Dos cochichos nos corredores do palácio aos toma lá, dá cás atrás das portas dos escritórios e das casas, surgiu a ideia: usar a fé de Daniel como instrumento para acusação. Assim, munidos de bajulação e lei, disseram:

Ó rei Dario, vive eternamente! Todos os presidentes do reino, os prefeitos e sátrapas, conselheiros e governadores concordaram em que o rei estabeleça um decreto e faça firme o interdito que todo homem que, por espaço de trinta dias, fizer petição a qualquer deus ou a qualquer homem e não a ti, ó rei, seja lançado na cova dos leões. Agora, pois, ó rei, sanciona o interdito e assina a escritura, para que não seja mudada, segundo a lei dos medos e dos persas, que se não pode revogar (Daniel 6.6-8).

Decreto assinado, foi só plantar escuta. Pegaram o contraventor, vejam só, orando! O rei, a contragosto, obrigado a supremacia da lei, condenou Daniel à cova dos leões: O teu Deus, a quem tu continuamente serves, que ele te livre. Daniel, que não se fiava na lei, mas na justiça daquele que a dispensa a lei com graça, recorreu ao único Supremo. Três dias depois, o rei encontrou vivo ao amigo fiel: O meu Deus enviou o seu anjo e fechou a boca aos leões, para que não me fizessem dano, porque foi achada em mim inocência diante dele; também contra ti, ó rei, não cometi delito algum. Se era assim, por que não livrou ao amigo da condenação. Ah! A lei dos medos e dos persas não dava lugar à justiça! Mais uma vez, prevaleceu a lei sobre a justiça.

É louvável que o nosso Supremo tenha agido. Lei para eles! Mas, onde a justiça que alcança a todos? Onde os demais? Que camas acomodam, que panos, que lençóis encobrem os grandes e só deixam à mostra os pés dos pequenos? Os que sofremos torturas no golpe de 64 sabemos como é fácil entregar até o amigo! Será que há medos e preços, dedos e pressões que enluvam as mãos e protegem o poder da vez? Será que nos venderemos somente por salário família, casa própria e promessas de vida boa? Nem que fosse manjar do rei da Pérsia ou da feiticeira do C. S. Lewis! Os benefícios sociais são bons e necessários, mas não à custa da honra a Deus. Se com a boa vida vêm cabrestos heterofóbicos, usurpação do poder familiar, impostos extorsivos, monopólio da educação e desgaste do instituto da fé, então, é chegada a hora de Deus calar as bocas dos leões. A honra às autoridades, requerida por Deus, inclui o privilégio do zelo nos círculos de autoridade da consciência, da família, da escola, da comunidade.

Certamente não clamo justiça como quem reivindica direitos, que não os tenho em mim mesmo. O parecer político do cristão não dá lugar para rebelião, mas obriga à justiça que procede de Deus. Desejo graça que concede a verdadeira justiça. Graça que chove sobre todos como gotas divinas, que lava e purifica, que transforma e frutifica em todo bem. Exatamente por crer assim, não acredito que a lei dos homens promova essa paz. Essa, só Cristo pode conceder do alto da cruz, do alto em que ressurreto reina soberano sobre reis e vassalos!

Ainda que haja trevas neste mundo, elas não prevalecerão contra a luz da glória de Deus. Sempre poderemos sair em passeata, com a cara descoberta, andando na vida comum de modo digno da vocação, portanto cartazes de fé: Encontraram-se a graça e a verdade, a justiça e a paz se beijaram (Salmos 85.10).

Wadislau Martins Gomes

terça-feira, setembro 18, 2012

MAIS DOIS FILHOS, QUERO DIZER, LIVROS


 
Pai e avô coruja, delicio-me em mostrar a cara dos pequenos de ontem e dos já não tão pequenos de hoje. O mesmo depois de parir livros. Desta vez, vieram gêmeos: Força para a família, da Editora Monergismo, e Quem cuida de quem cuida?, da Editora Cultura Cristã. Olha só a carinha deles.

 
Temos de cuidar do caráter e deixar que Deus cuide da situação. Entretanto, não pense que não temos responsabilidades em relação à situação. A Escritura fala de boas obras e de deveres calcados na ordem edênica de cultivar e guardar e de crescer e multiplicar. E sobre esse ponto: “Enganoso é o coração, mais do que todas as coisas, e desesperadamente corrupto; quem o conhecerá” (Jeremias 17.9)?

Cultuar a Deus e cultivar a terra, guardar os mandamentos do Senhor e a herança da vida temporal, crescer em estatura e graça, e multiplicar filhos de sangue e espirituais, tudo isso é tarefa ordenada por Deus, mas que nosso coração subverte. Preferimos cultivar nossa personalidade, guardar nossos direitos, crescer em abastança e poder, e multiplicar feitos que assegurem a memória de nosso nome. O apóstolo Paulo adverte contra a insídia do autoengano: “no sentido de que, quanto ao trato passado, vos despojeis do velho homem, que se corrompe segundo as concupiscências do engano” (Efésios 4.22).

Enganamo-nos, até mesmo, quanto à origem das nossas motivações. Lemos, em Provérbios (ver 4.18-27) que a vereda dos justos é como a luz da aurora, que vai aclarando até ser dia perfeito.  Somos informados que o caminho dos perversos é escuro. Ouvimos o apelo do Pregador para dar ouvidos às suas palavras e guardá-las frente aos olhos e no coração, pois significam vida e saúde. “Sobre tudo o que se deve guardar, guarda o coração, porque dele procedem as fontes da vida” (v. 23).  O que fazer diante da sabedoria? O Pregador continua, dizendo: desvia a maldade da boca e a falsidade dos lábios, olha direto à frente, para as coisas louváveis, considera onde pisa e escolha andar em retidão, desviando os pés do mal.

Nós também pregamos isso. No entanto, falamos mal uns dos outros, às vezes, a mentira, às vezes, a verdade, mas de maneira a destruir o caráter da pessoa de quem falamos. Atentamos contra o caráter de pessoas criadas à imagem de Deus! Não ponderamos palavras nem olhares nem gestos nem atitudes e, depois, alegamos não saber de onde vêm os problemas. Não obstante, sob o peso de culpa não diferenciada, temos medo de Deus e homens, e a vida se torna tensa, os amigos parecem insensíveis, e a vida, toda descolorida. Isso, só para ilustrar, pois há tanto mais que nos pesa e faz sofrer. (QCQC, p. 35.)

 
Na verdade, o passado não determina o futuro. Não adianta querer analisar lembranças, achando que os problemas residem no passado e que têm de ser resolvidos lá. A Bíblia diz, sim, que devo me lembrar de onde caí, arrepender-me e voltar às práticas de boas obras. Isso foi dito a uma igreja, e tem aplicação universal (ver Apocalipse 2.5). Às vezes, é dito que pecado perdoado é pecado esquecido. Que Deus prometeu que não se lembraria mais de nossos pecados. Isto é certo, mas no sentido legal. Por causa da justificação em Cristo, somos revestidos de sua justiça e nossos pecados não nos são mais cobrados. Deus mesmo advertiu seu povo: “...não endureçais o coração, como em Meribá, como no dia de Massá, no deserto, quando vossos pais me tentaram” (Salmo 95.8-9a). Porventura, poderia Deus sofrer de amnésia? E quanto a nós, não podemos esquecer o perdão nos nossos pecados de outrora sem correr o risco de sermos cegos para o aprendizado da história (2Pedro 1.9).

Lembranças podem ser úteis, sim, para mostrar um padrão em nossos problemas, traços de pecado ou peso. O passado lembrado fala mais dos pensamentos e sentimentos de hoje. É como se comunicássemos coisas que estão ali, no coração, sem palavras, sem definições, mas latentes, renitentes. Muitas das coisas que experimentamos na vida vão sendo mudadas nas lembranças, para justificar alegrias e tristezas. Nem sempre pensamos nelas, mas sempre que algo acontece, acordamos velhas reações já conhecidas.

O “velho coração” é obstinado. Até mesmo, as imagens de quando ainda não sabíamos falar, ficam enroscadas na ideia, alterando valores e percepções. Joana e João, certamente, tinham coisas para dizer sobre seus pais. Bons ou maus, eles teriam algo a ver com o tipo de “personalidade” que, hoje, João e Joana exibiam. Responsabilidade dos pais. Ou do professor fulano de tal. Ou de Deus. O quinto mandamento continua vivo e vigente. Honra teu pai e ta mãe não diz respeito apenas ao papai e à mamãe. Diz respeito a quem lhes deu honra, cuja autoridade maior é fisicamente conhecida na relação parental.

Ninguém, ao ser tentado, diga: Sou tentado por Deus; porque Deus não pode ser tentado pelo mal e ele mesmo a ninguém tenta.Ao contrário, cada um é tentado pela sua própria cobiça, quando esta o atrai e seduz. Então, a cobiça, depois de haver concebido, dá à luz o pecado; e o pecado, uma vez consumado, gera a morte (Tiago 1.13-15).

– Antes de casar, ele parecia ter todas as qualidades boas que eu reconhecia  em meu pai; depois de casar, ele passou a exibir os defeitos que vi em meu pai, e que eu queria evitar.

– Claro, Joana. Tal como, no Éden, o bem era a qualidade reconhecida e, o mal, a quebra de qualidade, a ser evitada. Assim também, fora do Éden, nossas qualidades, quando quebradas, exibem seu lado avesso. (FPF, p. 86.)

Wadislau Martins Gomes

sexta-feira, setembro 14, 2012

FOTOS, IMAGENS, REFLEXOS E REFLEXÕES


Girl in the mirror, de Rockwell
 
 
Recentemente, mudei a fotografia do meu facebook e mais de oitenta pessoas escreveram, comentando positivamente. A foto agradou de verdade, porque não obstante minhas rugas, manchas e visível sobrepeso, estava olhando para meu marido (que também revelava semblante amável) com amor, jeito maroto e de cumplicidade constante – características capturadas em cores pelo jovem artista fotógrafo que é nosso primo Tércio. Raramente saio bem nas fotografias e, assim, esta fez uma feliz diferença. Fiquei pensando na imagem que desejo transmitir – se é verdadeira, se edifica e se transmite graça aos que vêem.

Tem gente que é fotogênica por natureza. Pode até estar zangada, irritada ou cheia de maus pensamentos, mas dá um sorriso e dissipa qualquer dúvida quanto a sua beleza. Alguns astros e ídolos de cinema e da mídia conseguem transmitir serenidade e segurança quando na realidade poderão estar entre as pessoas mais perturbadas desse mundo tenebroso. Neste tempo pré-eleições isso se vê muito na distribuição de “santinhos” dos candidatos a vereador. Algumas fotos foram tão maquiadas que não dá para reconhecer a pessoa ao vivo.

Ao falar do amor, Paulo não deixou de mencionar que “agora vemos por espelho, obscuramente” (1Co 13.12) mas um dia veremos face a face. Você já esteve em um parque de diversões onde um espelho de distorção deixa-nos exageradamente gordos ou magros, compridos ou baixos? Os espelhos de bronze da antiguidade eram assim: refletiam algumas características da pessoa – mas não apresentavam a imagem como era realmente.

Como é que fomos feitos imagem de Deus, se Deus é invisível e não tem corpo (exceto no Filho encarnado, Jesus)? Como é que somos imagem de Deus se somos mortais e qualquer beleza que tenhamos é efêmera e desvanece? O ser humano é diferente dos animais, não por maior inteligência ou capacidade de fala ou habilidade de usar instrumentos para criar outras coisas – mas por ser imagem de Deus, feito para refletir e glorificar o Criador. A pessoa humana é capaz de espelhar as características divinas em escala proporcional a sua finitude diante daquele que é infinito.

Quando escolhemos qualquer coisa como digna de culto e apreço mais que Deus, nós estamos formando ídolos. Geralmente esses ídolos são valores e conceitos que em si mesmo poderão ser bons – mas se tomados em lugar do Criador, são vaidade idólatra. Isaías comparou a filha de Sião com “choça na vinha, palhoça (ou espantalho!) no pepinal, cidade sitiada” (Is 1.8) por causa de sua idolatria; Jeremias afirmou que “suas imagens são mentira e nelas não há fôlego” (Jr 51.17). No entanto, muitas vezes preferimos tais imagens – miragens de oásis inexistentes – à realidade papável do Deus eterno.

Tenho o  sonho de escrever ficção que enterneça e mova os corações a amar mais a Deus. Mas minha ficção precisa transmitir a realidade. Quer nas mídias sociais quer em escritos literários quer manchetes populares, temos de perguntar, quanto às imagens que mostramos, se elas são verdadeiras – não apenas verossímeis – mas parte da realidade que Deus nos deu.

Outra característica da imagem de Deus no ser humano é que ela jamais é destruidora, mas sempre edificante. Interessante que Deus deu muita ênfase à destruição dos ídolos como característica de pertencer  a seu povo de exclusiva propriedade. Todo avivamento começava com a destruição de ídolos – e se firmava na edificação: da cidade (Neemias), do templo (Josias e Esdras) e da igreja (Mt 16.18; At 16.5). Como pessoa criada para criar e construir, minhas atitudes, minhas palavras e meus atos têm de ser edificantes.

Finalmente, ser criada à imagem de Deus significa que transmito graça ao que toco. Fui tocada pela graça de Deus – generosa, abundante, multiforme, infinita – e pela graça mediante a fé, toda minha vida deverá ser vivida, na certeza de que “todos nós, com o rosto desvendado, contemplando, como por espelho, a glória do Senhor, somos transformados, de glória em glória, na sua própria imagem, como pelo Senhor, o Espírito” (2Co 3.18). Nessas coisas todas não sou fotogênica, e minha imagem é ainda um desenho infantil de quem começa a segurar o lápis e apenas usa um círculo para a cabeça e linhas tortas para os membros. Mas um dia, pelo Espírito que habita em nós, serei transformada de glória em glória na imagem de Cristo!

Elizabeth Gomes