O cristianismo sofre ataques de todo lado, principalmente de bocas que se julgam defensoras de liberdades e direitos. Por exemplo, a “boca rica” das comunicações, a rede de TV Globo, que (des)faz a cabeça do país, e em que bocas pobres de discernimento mastigam insensatez. Se o comentário é sobre a queima do Alcorão em uma pequena igreja que almeja o show, lá vem um que diz, fora de contexto: A ciência já provou que a humanidade nasceu na África. Eu pergunto: em que laboratório a experiência foi realizada, testada e repetida, e qual é o enunciado do fato científico do nascimento da humanidade, em qualquer lugar? O cristianismo, pelo menos, tem respaldo em documentos históricos revelados por Deus. A notícia de que o Brasil foi elevado à categoria BBB na confiança do investimento internacional vem na mesma panela do Big Brother Brazsil e do último quadro da criminalidade, cozida ao molho cínico do comentário: Já houve aquela do aborto na campanha da Presidente e, agora, ainda querem botar mais religião na política? O cristianismo, por sua vez, tem a companhia da boa moral e ética.
O blogueiro Reinaldo Azevedo fisgou o nervo do dente da questão (http://veja.abril.com.br/blog/reinaldo/geral/a-religiao-verdadeiramente-perseguida-no-mundo-hoje-e-o-cristianismo-ou-de-corajosos-e-covardes/; 04/04/11). De onde vem a sanha, essa baba raivosa, essa perseguição canina? Por que ninguém ataca o noel nem o saci? Certamente, essa ira procede de uma rebelião contra tudo que se chama Deus, que reverte a mente e inverte o ponto referencial das coisas (cf. Rm 1.18-32). Como disse o poeta que amaldiçoou a própria alma: “terra maior que os céus, homem maior que Deus” (Bilac). Assim, perdidas as noções de distinção e proporção, só podem falar em termos que sequer são surreais. Como também já foi dito: nem estão errados, pois para isso teriam de ter estado certos.
No entanto, esse negócio de cristão na boca do leão é coisa antiga. Em um sentido, faz parte da luta contra o mal, e, em outro, opera sabedoria (ver Tg 1). É certo que o crente não deveria sofrer por ser transgressor da lei nem por burrice. Muita perseguição seria mais bem enfrentada e muita poderia ser evitada mediante a obtenção de uma boa cosmovisão cristã. Todo cristão deveria entender biblicamente a questão política. Tem cristão de esquerda, de direita, de centro, de cima (caindo de paraquedas), de baixo (do pano) e tem quem invoque a separação entre igreja e estado. Está certo, mas não confunda essa separação sadia com a enfermiça separação entre fé e política. Falta fé na política porque falta muita fé, na política; falta política centrada em Cristo e eleitor cristão consciente da própria fé.
O que o cristianismo crê, é que, primeiro Deus criou um homem e, depois, uma mulher, diferentes na individualidade e iguais na humanidade. Estão aí, assim, duas esferas de atuação humana – a individual e a social. São duas esferas com domínios próprios (autárquicas, isto é, soberanas sob a soberania de Deus) cujas interações formam uma terceira esfera subalterna, a do governo. Indivíduo tem cara, nome e domicílio, e sua atuação compreende três movimentos: para cima (Deus), para dentro (ser interior) e para fora (o próximo e o mundo); sociedade é associação tácita de indivíduos que realizam esses movimentos por meio de deveres e direitos afins.
Governo, por sua vez, não tem realidade em si mesmo, mas sua existência está implícita na relação de indivíduos com a sociedade. Sua preeminência existe não por causa do poder próprio, mas da delegação do Deus que chamou indivíduos para que fossem seus ministros civis com vista ao cuidado da sociedade. Lembra do que Deus disse à mulher, logo após o pecado? O teu desejo será para o teu marido, e ele te governará (Gn 3.16). Essa não foi uma lei, mas uma constatação da triste realidade política de um mundo decaído. Não é importante, aqui, que tenha dito à mulher ou ao homem. O fato é que a política decaída é baseada, de uma parte, em desejos a serem satisfeitos por pessoas insatisfeitas, e, de outra, na dominação de pessoas tendentes a jogos de poder.
Quando é assumido por indivíduos ou partidos que agem como se fossem deuses – mesmo que o discurso seja um de democracia, justiça social, erguimento financeiro econômico da nação e excelência administrativa – o governo se torna déspota e sujeito a corrupção. Por quê? Porque não ministra sob a vontade de Deus nem se sujeita à prevalência dos indivíduos que o elegem, nem cumpre seu papel de protetor do bom cidadão e juiz do homem mau. Antes, entrega-se à luta pela obtenção e manutenção do poder a qualquer custo – muitos, agindo como homens maus.
Para cumprir o papel de ministro civil de Deus, o governo precisaria respeitar e implementar as esferas individuais e sociais, e todos os círculos de autonomia a esses vinculados de diferentes maneiras nos particulares seguimentos da vida. No entanto, ele estará incapacitado para essa tarefa, se assumir que o próprio governo seja a sociedade. Por exemplo, a família é uma esfera em que a preeminência do governo só existe quando a respeita. No entanto, o governo chamado “social” pretende ser chefe de família, pai e mãe – esquecido de que não tem o aparato necessário para gerar ou criar filhos! Dizendo-se povo, arvora-se em legislador da consciência do indivíduo. Assim, fica clara a esterilidade desse tipo de governo. Outros exemplos, como a educação, o comércio, a igreja, são círculos de autonomia dentro das encapsuladas esferas individuais e sociais. Essas esferas deveriam ser livres. Quando pretende ser mestre, proprietário ou papa, o governo excede sua autoridade e anula sua efetividade.
Como disse o blogueiro, a questão é uma de coragem ou covardia. Quando é que nós, de natureza idólatra, deixaremos de nos curvar ante os deuses deste tempo, ante a ignorância dos sábios segundo o mundo e ante as próprias necessidades, para adorar o Deus da Bíblia? Quando é que aprenderemos a votar em quem sabe o que é governo e sabe fazer política segundo a Palavra de Deus? Certamente quando amarmos mais o estudo da Bíblia como regra de fé e prática (incluindo política) e, entre outras coisas, aprendermos a não escolher políticos pelo rótulo, mas pelo conteúdo. Aí, sim, seremos realmente cristãos em termos de abençoar o mundo ao redor.
Quando isso acontecer, não teremos medo de perseguição. Será preciso que não sejamos perseguidos como déspotas, corruptos, falseadores da verdade, odiosos de Deus; nem como quem se omite da luta contra o mal ou da defesa da fé. Mas se formos perseguidos por causa da justiça, que Deus nos fortaleça a boca e os dentes.
Wadislau Martins Gomes
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