terça-feira, novembro 22, 2016

ALEGRIA, GENEROSIDADE E GRATIDÃO


Conversávamos outro dia, minha amiga e eu, sobre pessoas que passam necessidades de sustento e manutenção, sem opções para resolver suas carências. Algumas amigas passam por doenças implacáveis e devastadoras. Outros passam por necessidades financeiras que jamais sonhariam quando, mais jovens, eram profissionais bem pagos. Será que temos na Bíblia uma orientação saudável e segura para agir e ajudar a amigos que passam por provações financeiras, de saúde e de natureza familiar?
No último capítulo de Filipenses, o tipo de coisa que Paulo escolhe enfatizar, inclui: integridade nos relacionamentos, fidelidade para com Deus, confiança calma nele, pureza e salubridade nos pensamentos, e piedade na atitude do coração. Em toda área, Paulo quer produzir firmeza, estabilidade, perseverança, persistência, e fidelidade diante de Deus—diante do Deus que se revelou tão maravilhosamente em Jesus Cristo seu Filho. Isso depois de escrever três capítulos sobre generosa gratidão a pessoas que possuíam muito pouco, que em nossas igrejas de hoje seriam vistas como desprovidas e empobrecidas. Portanto, Paulo lembra em dedução lógica, o que havia dito antes sobre a soberania de Deus, conclamando seus leitores a permanecer firmes no Senhor. Ele implora que essa firmeza seja demonstrada na prática, com a solução de uma discussão entre duas mulheres líderes: pensem concordemente. O apóstolo não insiste em que sejam iguaizinhas no pensamento, que tenham cabeças idênticas, mas que vivam em harmonia.
 Isso torna possível a segunda ordem: Alegrem-se no Senhor (v 4)!. Tal alegria se demonstra na moderação pela qual os crentes todos devem ser conhecidos—isso, porque o Senhor está aí. “Seja vossa moderação conhecida de todos os homens. Perto está o Senhor” (4.5). Perto está o Senhor não é tanto que Deus esteja vigiando tudo que fazemos e dizemos, embora inclua isso, mas que a sua proximidade nos incentiva a imitar a vida de Paulo e outros pastores, em contraste aos inimigos do evangelho.
Creio que, mais provavelmente, que Paulo quisesse dizer que o Senhor está espacialmente, ou melhor, pessoalmente perto. Deus não está longe; está bem perto de nós, junto a nós. Como então poderíamos ceder à autocomiseração?
Suponhamos, por um momento, que o Senhor ressurreto e exaltado entre na sala em que você e os seus amigos estão sentados. Suponhamos que não haja dúvida na mente de qualquer pessoa quanto a sua identidade. Como você responderia? Será que correria imediatamente para ele, pavoneando a sua própria excelência? Quando Jesus lhes mostrasse um vislumbre da sua glória e virasse as mãos com as marcas dos pregos, será que você seria rápido para desfilar as suas virtudes cristãs? Pode a autopromoção fazer parte do seu pensamento?
Paulo começa o parágrafo comentando novamente o carinho dos filipenses a suprir para as suas necessidades, enviando-lhe socorro: “Alegrei-me, sobremaneira, no Senhor porque, agora, uma vez mais, renovastes a meu favor o vosso cuidado; o qual também já tínheis antes, mas vos faltava oportunidade” (4.10). A frase “agora, uma vez mais” neste contexto não tem tons rogatórios culpando os filipenses por serem vagarosos como se dissesse “até que enfim” vocês o fizeram. Pelo contrário, quer dizer que, agora, depois de um extenso hiato, eles renovaram a preocupação com o apóstolo, como haviam demonstrado há dez anos. Percebemos que isto é o que Paulo está dizendo, baseado na próxima frase: “também já tínheis antes, mas vos faltava oportunidade” (4.10).
Com perspicácia, Paulo percebe como a sua exuberante gratidão aos filipenses poderia ser mal compreendida. Ele insiste que suas palavras não sugeriam pedido de mais um donativo. Se existe alguma coisa que deseje, diz ele: “o que realmente me interessa é o fruto que aumente o vosso crédito” (4.17). Noutras palavras, Paulo está principalmente contente que os filipenses tenham sido tão generosos no trabalho do evangelho. Não porque ele fosse o receptor dessa generosidade, mas porque, com a generosidade, eles estariam agindo como cristãos. E Deus, que nada deve a ninguém, os recompensaria. Paulo está mais alegre com as bênçãos que eles experimentarão por demonstrarem ser uma igreja doadora e generosa do que com a própria oferta que veio às suas mãos.
Aparentemente, Paulo procura redirecionar algumas das doações futuras: “Recebi tudo e tenho abundância; estou suprido, desde que Epafrodito me passou às mãos o que me veio de vossa parte como aroma suave, como sacrifício aceitável e aprazível a Deus” (4.18). Qualquer que seja o caso, quer os filipenses enviem esses donativos generosos a Paulo quer a outros, os donativos eram oferecidos primeiramente a Deus: “como aroma suave, como sacrifício aceitável e aprazível a Deus” (4.18).
Estas são importantes lições de cortesia e generosidade cristã. Examine como Paulo agradece aos crentes em suas cartas; leia e releia as “ações de graças” de abertura que marcam todas as epístolas com exceção de uma (Gálatas). Seu modelo é agradecer a Deus por aquilo que os crentes têm feito ou pelos sinais de estabilidade espiritual que ele percebe neles. É uma atitude duplamente sábia. Precisamente porque Deus não é devedor a ninguém, os seus filhos podem confiar nele para suprir as suas necessidades: “E o meu Deus, segundo a sua riqueza em glória, há de suprir, em Cristo Jesus, cada uma de vossas necessidades” (4.19).
Volto ao comentário do início, de que alguns irmãos passam necessidades e parece que não são socorridos. Nossos amigos, no passado, auxiliaram muitos pastores e missionários, tal como pessoas desprovidas dentro e fora da igreja, e nunca reivindicaram o que deram. Existe gente que pensa que “merece” ajuda. A meritologia está tão embutida em nossa cultura que a vemos em dizeres das diversas psicologias que enfatizam auto-ajuda, autopromoção, auto-assertividade, e nas sociologias dos movimentos sociais como as do MSTs. A verdade é que eu não mereço nada. Pecadora indigna, eu nada mereço senão a condenação eterna de um Deus justo e bom. Tudo o que ele fez por mim, tudo que me dá e faz a cada dia, é exclusivamente pela sua graça mediante a obra redentora de Jesus Cristo. Nossos amigos que hoje sofrem necessidade e não merecem passar por isso, não é porque Deus tenha declarado que todo crente será sempre vitorioso e próspero. O pecado existente no mundo, as más escolhas que porventura fizemos, às vezes, até a ingratidão e displicência de outros fizeram com que essas coisas que fazem parte da existência humana, acontecessem e tornaram a sua vida ficasse injustamente desprovida. Também não cabe a nós julgar os méritos de quem sofre— a nós que somos participantes da graça de Deus (Fp 1.7) cabe imitarmos a Cristo e a seus servos, sendo generosos co-participantes da graça de Cristo, que,
reconhecido em figura humana, a si mesmo se humilhou, tornando-se obediente até a morte,  e morte de cruz. Pelo que também Deus o exaltou sobremaneira e lhe deu o nome que está acima de todo nome, para que, ao nome de Jesus se dobre todo joelho nos céus, na terra e debaixo da terra, e toda língua confesse que Jesus Cristo é Senhor, para glória de Deus Pai (Fp 2.7-11).
Qualquer generosidade que exerçamos será em obediência ao Deus que tudo nos dá. Tem de ser com humildade, e é desenvolvida com temor e tremor, com alegria e cautela. É esta a mensagem que Paulo escreveu à igreja formada por ele em meio a grande perseguição e entrega de vida. Nesse espírito, temos motivo constante de gratidão que se demonstra em continuada generosidade. Nossos amigos não deverão passar por provações insuportáveis. Todos nós poderemos viver sem ansiedade; conhecidas diante de Deus nossas orações. Paulo pode dizer com sinceridade: Posso tudo naquele que me fortalece (Fp 4.13) e concluir “O meu Deus, segundo as sua riqueza em glória, há de suprir, em Cristo Jesus, cada uma de vossas necessidades” (Fp 4.20).
Elizabeth Gomes

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