Conversávamos
outro dia, minha amiga e eu, sobre pessoas que passam necessidades de sustento
e manutenção, sem opções para resolver suas carências. Algumas amigas passam
por doenças implacáveis e devastadoras. Outros passam por necessidades
financeiras que jamais sonhariam quando, mais jovens, eram profissionais bem
pagos. Será que temos na Bíblia uma orientação saudável e segura para agir e
ajudar a amigos que passam por provações financeiras, de saúde e de natureza
familiar?
No
último capítulo de Filipenses, o tipo de coisa que Paulo escolhe enfatizar,
inclui: integridade nos relacionamentos, fidelidade para com Deus, confiança
calma nele, pureza e salubridade nos pensamentos, e piedade na atitude do
coração. Em toda área, Paulo quer produzir firmeza, estabilidade, perseverança,
persistência, e fidelidade diante de Deus—diante do Deus que se revelou tão
maravilhosamente em Jesus Cristo seu Filho. Isso depois de escrever três
capítulos sobre generosa gratidão a pessoas que possuíam muito pouco, que em
nossas igrejas de hoje seriam vistas como desprovidas e empobrecidas. Portanto, Paulo lembra em dedução
lógica, o que havia dito antes sobre a soberania de Deus, conclamando seus
leitores a permanecer firmes no Senhor. Ele implora que essa firmeza seja
demonstrada na prática, com a solução de uma discussão entre duas mulheres
líderes: pensem concordemente. O
apóstolo não insiste em que sejam iguaizinhas no pensamento, que tenham cabeças
idênticas, mas que vivam em harmonia.
Isso torna possível a segunda ordem: Alegrem-se no Senhor (v 4)!. Tal alegria
se demonstra na moderação pela qual os crentes todos devem ser conhecidos—isso,
porque o Senhor está aí. “Seja vossa moderação conhecida de todos os homens.
Perto está o Senhor” (4.5). Perto está o
Senhor não é tanto que Deus esteja vigiando tudo que fazemos e dizemos,
embora inclua isso, mas que a sua proximidade nos incentiva a imitar a vida de
Paulo e outros pastores, em contraste aos inimigos do evangelho.
Creio
que, mais provavelmente, que Paulo quisesse dizer que o Senhor está espacialmente, ou melhor, pessoalmente perto. Deus não está longe; está bem perto de nós, junto a nós. Como
então poderíamos ceder à autocomiseração?
Suponhamos,
por um momento, que o Senhor ressurreto e exaltado entre na sala em que você e
os seus amigos estão sentados. Suponhamos que não haja dúvida na mente de
qualquer pessoa quanto a sua identidade. Como você responderia? Será que
correria imediatamente para ele, pavoneando
a sua própria excelência? Quando Jesus lhes mostrasse um vislumbre da sua
glória e virasse as mãos com as marcas dos pregos, será que você seria rápido
para desfilar as suas virtudes cristãs? Pode a autopromoção fazer parte do seu
pensamento?
Paulo
começa o parágrafo comentando novamente o carinho dos filipenses a suprir para as
suas necessidades, enviando-lhe socorro: “Alegrei-me, sobremaneira, no Senhor
porque, agora, uma vez mais, renovastes a meu favor o vosso cuidado; o qual
também já tínheis antes, mas vos faltava oportunidade” (4.10). A frase “agora,
uma vez mais” neste contexto não tem tons rogatórios culpando os filipenses por
serem vagarosos como se dissesse “até que enfim” vocês o fizeram. Pelo
contrário, quer dizer que, agora, depois de um extenso hiato, eles renovaram a
preocupação com o apóstolo, como haviam demonstrado há dez anos. Percebemos que
isto é o que Paulo está dizendo, baseado na próxima frase: “também já tínheis
antes, mas vos faltava oportunidade” (4.10).
Com
perspicácia, Paulo percebe como a sua exuberante gratidão aos filipenses
poderia ser mal compreendida. Ele insiste que suas palavras não sugeriam pedido
de mais um donativo. Se existe alguma coisa que deseje, diz ele: “o que
realmente me interessa é o fruto que aumente o vosso crédito” (4.17). Noutras
palavras, Paulo está principalmente contente que os filipenses tenham sido tão
generosos no trabalho do evangelho. Não porque ele fosse o receptor dessa
generosidade, mas porque, com a generosidade, eles estariam agindo como
cristãos. E Deus, que nada deve a ninguém, os recompensaria. Paulo está mais
alegre com as bênçãos que eles experimentarão por demonstrarem ser uma igreja
doadora e generosa do que com a própria oferta que veio às suas mãos.
Aparentemente,
Paulo procura redirecionar algumas das doações futuras: “Recebi tudo e tenho
abundância; estou suprido, desde que Epafrodito me passou às mãos o que me veio
de vossa parte como aroma suave, como sacrifício aceitável e aprazível a Deus”
(4.18). Qualquer que seja o caso, quer os filipenses enviem esses donativos
generosos a Paulo quer a outros, os donativos eram oferecidos primeiramente a
Deus: “como aroma suave, como sacrifício aceitável e aprazível a Deus” (4.18).
Estas são importantes lições de cortesia e generosidade cristã. Examine
como Paulo agradece aos crentes em suas cartas; leia e releia as “ações de
graças” de abertura que marcam todas as epístolas com exceção de uma (Gálatas).
Seu modelo é agradecer a Deus por
aquilo que os crentes têm feito ou pelos sinais de estabilidade espiritual que
ele percebe neles. É uma atitude duplamente sábia. Precisamente porque Deus não
é devedor a ninguém, os seus filhos podem confiar nele para suprir as suas
necessidades: “E o meu Deus, segundo a sua riqueza em glória, há de suprir, em
Cristo Jesus, cada uma de vossas necessidades” (4.19).
Volto ao comentário do início, de que alguns irmãos passam necessidades
e parece que não são socorridos. Nossos amigos, no passado, auxiliaram muitos
pastores e missionários, tal como pessoas desprovidas dentro e fora da igreja,
e nunca reivindicaram o que deram. Existe gente que pensa que “merece” ajuda. A
meritologia está tão embutida em nossa cultura que a vemos em dizeres das
diversas psicologias que enfatizam auto-ajuda, autopromoção,
auto-assertividade, e nas sociologias dos movimentos sociais como as do MSTs. A
verdade é que eu não mereço nada. Pecadora indigna, eu nada mereço senão a
condenação eterna de um Deus justo e bom. Tudo o que ele fez por mim, tudo que me
dá e faz a cada dia, é exclusivamente pela sua graça mediante a obra redentora
de Jesus Cristo. Nossos amigos que hoje sofrem necessidade e não merecem passar por isso, não é porque
Deus tenha declarado que todo crente será sempre vitorioso e próspero. O pecado
existente no mundo, as más escolhas que porventura fizemos, às vezes, até a
ingratidão e displicência de outros fizeram com que essas coisas que fazem
parte da existência humana, acontecessem e tornaram a sua vida ficasse
injustamente desprovida. Também não cabe a nós julgar os méritos de quem sofre—
a nós que somos participantes da graça de Deus (Fp 1.7) cabe imitarmos a Cristo
e a seus servos, sendo generosos co-participantes da graça de Cristo, que,
reconhecido em figura humana, a si
mesmo se humilhou, tornando-se obediente até a morte, e morte de cruz. Pelo que também Deus o exaltou
sobremaneira e lhe deu o nome que está acima de todo nome, para que, ao nome de
Jesus se dobre todo joelho nos céus, na terra e debaixo da terra, e toda língua
confesse que Jesus Cristo é Senhor, para glória de Deus Pai (Fp 2.7-11).
Qualquer generosidade
que exerçamos será em obediência ao Deus que tudo nos dá. Tem de ser com
humildade, e é desenvolvida com temor e
tremor, com alegria e cautela. É esta a mensagem que Paulo escreveu à
igreja formada por ele em meio a grande perseguição e entrega de vida. Nesse
espírito, temos motivo constante de gratidão que se demonstra em continuada generosidade.
Nossos amigos não deverão passar por provações insuportáveis. Todos nós
poderemos viver sem ansiedade; conhecidas diante de Deus nossas orações. Paulo
pode dizer com sinceridade: Posso tudo naquele que me fortalece (Fp 4.13) e
concluir “O meu Deus, segundo as sua riqueza em glória, há de suprir, em Cristo
Jesus, cada uma de vossas necessidades” (Fp 4.20).
Elizabeth Gomes
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