Postei
uma foto da nossa casa e uma pessoa que já nos visitou diversas vezes comentou:
“Que lindo! Onde fica?” Realmente, a perspectiva era a de uma daquelas fotos
incríveis do internacional Partage d’Images ou outra fonte, dessas que a gente
não consegue deixar de “curtir”. De fato, uma foto caseira tirada por um
hóspede, Felipe Sabino, numa manhã ensolarada, quando ele ia pelo caminho de
pedras, às vezes escorregadias, que liga a casa ao escritório, cem metros pra
lá. Havíamos posto na capa do “facebook” outra foto do mesmo local, tirada
alguns meses atrás, quando as bougainvillas
em flor coloriam o cenário. Nossa casa nada tem de extraordinária: pequena, avarandada,
dois quartos, uma sala de jantar, de estar e cozinha conjugadas, dois banheiros e
um closet. Modesta, simples, fácil de cuidar – própria para um casal de pastor
e esposa prá lá dos sessenta que compartilha desde a juventude o gosto por
estudar, escrever e ensinar.
Lembrei da pergunta de uma
criança de três anos: Onde cê mora? –
e da dos discípulos de João, quando conheceram e seguiram a Jesus depois de ele
ser identificado como Cordeiro de Deus: Onde
assistes? (Onde resides–Jo 1.38?). Estes, que se tornaram seus discípulos,
constataram onde Jesus morava, apesar de ele ter afirmado que As raposas têm seus
covis, e as aves do céu, ninhos; mas o Filho do Homem não tem onde reclinar a
cabeça (Mt 8.20; Lc 9.58).
E eu, que sempre sonhei com uma casa no campo e que havia morado em vinte e três casas diferentes antes de me casar, aos dezoito anos (isso já faz um bom tempo...), e mais algumas sem conta nos anos de estudo, ministério/trabalho em Belo Horizonte, São Paulo, Jaú, Bocaina, Brasília, Estados Unidos, em Brasília novamente, primeiro num apartamento e, depois, numa chácara, antes de mudar para o sítioem
Mogi das Cruzes...
E eu, que sempre sonhei com uma casa no campo e que havia morado em vinte e três casas diferentes antes de me casar, aos dezoito anos (isso já faz um bom tempo...), e mais algumas sem conta nos anos de estudo, ministério/trabalho em Belo Horizonte, São Paulo, Jaú, Bocaina, Brasília, Estados Unidos, em Brasília novamente, primeiro num apartamento e, depois, numa chácara, antes de mudar para o sítio
A propósito, quando estudantes
(Wadislau e os três filhos) nos Estados Unidos, sem condições de pagar aluguel
de um apartamento, Deus nos colocou numa mansão incrível nos subúrbios de Filadélfia, num parque com faisão dourado
cantando debaixo de nossa janela e gansos canadenses no lago no coração do
jardim,
Hoje, moramos onde cantam
sabiás, joão-de-barros, pintassilgos, e onde tucanos bicudos e escuros jacus de
papo vermelho enfeitam e bicam as primícias das goiabas e jaboticabas, e
pica-paus martelam o vidro do escritório exatamente quando nos pomos a
trabalhar ao computador. Certa vez, um beijaflor se aproximou de mim, deixando
o simples e costumeiro tufo de dálias monocromáticas para averiguar a minha
blusa de estampas multifloridas. É certo que tenho de cuidar onde piso, pois a
natureza traz surpresas e nem todas são agradáveis ao olfato: cachorros e sapos
têm a digestão profusa e biologicamente sadia. Mas não me importo com o
cocozinho dos passarinhos que entram em casa para ciscar possíveis migalhas no
chão se ainda não varri. Aliás, onde eu moro moram outros habitantes de tamanho
mais humildes: formigas pequeninas, aranhas enormes (às vezes do tamanho de
formigas!), de vez em quando uma fera maior que vem beber água no lago. Tem uma
lagartixa que compartilha meu escritório e dá sua cara pelo menos uma vez por
dia no canto entre a Fides Reformata, os dicionários e a cortina.
Tenho de admitir que minha
casa não é um exemplo de limpeza – não passaria jamais o teste da luva branca,
pois poeira é profusa, não só de pó de terra, como também de pólen e pó de
serra, e às vezes, cinzas das queimadas de vizinhos incautos. Já tivemos de
correr e pular fininho para proteger nosso lar da insensatez de quem ainda acha
que o jeito mais fácil de carpir é botar fogo na mata! Nosso lar é tudo que
sonhamos, mas dá trabalho! Descobri que não sou hábil em fazer faxina, lavar e
passar, em organizar e arrumar casa ou arredores – carpir, arcar-me ao chão
para plantar – só consigo por meia hora antes que as costas gritem por socorro.
Colher já é mais fácil. Falo de boca cheia: colhi esse feijão verde uma hora
atrás; aquela abóbora tava pedindo para vir pro cozido; essa jaboticaba não era
geléia há duas horas: tava salpicando os pés de fruta. A castanha portuguesa
custa mais de vinte reais o quilo no mercado – a de nosso pomar custa enfrentar
os espinhos para colher essa fartura – como foram as cerejas e os pêssegos (e
sem espinhos!) no natal passado.
Onde moramos? No lugar que
Deus nos colocou, onde ainda não conseguimos construir tudo, reformar ou pintar
a gosto, onde “não deu tempo” para fazer tudo o que queremos.. Onde estamos? Numa casa no campo, com bons livros para
ler, nosso amor a se renovar, bons amigos para nos visitar, música ao fundo
quando não conseguimos mais soltar a voz, mente prenhe de idéias das quais não
conseguimos concatenar quanto mais escrever nem uma fração, rede a balangar, prosa boa, horas de gratidão e
boa indagação com Deus.
O mais importante numa casa
não é o quanto ela é bem projetada, bem decorada, bem visitada – é quem mora
nela. Lau e eu temos inúmeros defeitos de fabricação e de percurso (não pela
“fabricação” que Deus fez de maneira assombrosamente maravilhosa, mas por
sermos gente: decaída, confusa, comum).
Temos memória falha, mas Deus traz à memória aquilo que nos traz esperança: Grande é sua fidelidade (Lm 3.23). Temos
como vizinhos mais próximos filhos, noras e netos.
Compartilhamos com o apóstolo
Paulo uma meta: “esquecendo-me das coisas que para trás ficam e avançando para as que
diante de mim estão, prossigo para o alvo, para o prêmio da soberana vocação de
Deus em Cristo Jesus” (Fp. 3. 13,14). Num sentido, continuamos ainda de mudança contínua. Conhecendo e
prosseguindo em
conhecer Jesus. Em outro, permanecemos seguros na habitação que Deus nos deu – não apenas a casa no campo,
mas a presença de quem mora conosco. Pois ele, Jesus Cristo, Senhor da Vida,
veio habitar entre nós. Nós habitamos nele (Sl 91.1) e ele habitará para sempre
conosco, seu povo (Ap 21.3).
E
você, onde mora? Espero que sua casa, apartamento, mansão, kichenete, choupana, taba ou rancho seja
daquelas cujos habitantes dão ouvidos ao Senhor e, portanto, habitam seguros (Pv
1.33: Mas o que me der ouvidos habitará seguro, tranqüilo e sem temor do mal).
Em gratidão, teremos sempre habitação com quem habita ricamente em nós – e
provar as belezas da sua morada!
Elizabeth
Gomes