Péra aí,
existe mesmo! Provei primeiro lá nas Goiás. Foi sem hesitação, pois que faço
luxo de uma pratada do amargo com uma colher de arroz. Doce, e com folha de
figo, então, até quem odeia o cujo encara um naco. Um amor de doce! É por aí
que vai o amor, como doce de jiló.
Alguém, um dia, queria saber
o que fazer com um desafeto.
– Ama! – respondi, e logo
veio o jiló:
– Mas como amar uma pessoa
inamável?
– Ah! – eu disse com gosto –
faz um doce.
Como é que é? Simples. Amor é
mais do que sentir amor. O sentimento é bom, especialmente quando há troca de
amor em calda, mas não é esse o amor que dá o doce da receita original. Para
fazer bem um doce de amor, usa-se o tipo de fruto que dá na plantação do
Espírito. Um amor que ama porque tem amor pra dar. Esse, no fogo branco das
horas boas ou no fogo alto das horas más, sempre dá água na boca.
O poeta, variando sobre o
tema, disse que amor bom é o amor intransitivo, não no sentido de que não é
transmissível, mas que não requer complemento. Quem ama porque deseja ser amado
é um saco sem fundo de insatisfação. Não é um gosto de quero mais, mas fome
compulsiva. Amor foi feito para dar e, quando exigido, encaroça na panela e
trava a língua.
– Como é que eu vou amar se
não consigo gostar dele?
Na verdade, amor gostoso é o
amor que ama porque é amor. Vem de Deus. E olha que não é melado, não! Tem um
pouco de jiló que é para não enfarar. De fato, amar não é sinônimo necessário
de gostar. À vezes, será preciso enfrentá-lo sem doce. Como a amada faz, lá em
casa: vai trocando as águas até que fique no ponto. Se a Bíblia mandou amar o
inimigo! Quem gosta de inimigo é amigo do cão – bom mesmo é amar o amigo! Mas,
como amar é gostar de fazer o bem sem ver a quem, aí dá pra até pra comer jiló no
pé. Tenho a certeza de que, quando morreu por mim, Jesus sentiu o gosto amargo
dos meus feitos inamáveis, mas gostou de transformar-me com o mel do seu amor
ao fogo de sua justiça. De inimigo a amigo, no feito da cruz.
– Ninguém tem maior amor do que este: de dar alguém a própria vida em
favor dos seus amigos. Vós sois meus amigos, se fazeis o que eu vos mando –
disse ele, em João 15.13-14.
Não pense que eu sou uma
doçura, não. Estou mais para jiló. Para mim, uma das coisas mais difíceis de
tragar é o doce do jiló do amor. Uma mesa posta em que eu sirva o que o outro
gosta, e o sirva primeiro, não me traz a ideia de uma boa festa, mas a gente
enfrenta, engole o porco espinho com um ou dois goles de água e estende a mão e
o riso honesto. Esse tipo de amor não terá pronto reconhecimento senão da parte
daquele que o prescreve: o Senhor. Falar dele aos homens será como recomendar
doce de jiló para quem não o conhece. Mas é exatamente aí que está a doçura!
Tudo de que necessitamos para
fazer o doce é saber de que consiste o amargor, como retirá-lo, e como apurar o
doce. Parte do amargor vem da terra em que a afeição foi plantada, parte dos
nutrientes com que foi tratado e parte do ambiente em que viceja. Primeiro
o meu pecado, segundo o pecado de outros contra mim e terceiro o pecado de
outros contra outros. O amor não me vem naturalmente nessas condições. É
preciso que as águas da Palavra lavem-me a alma e a obra de Cristo aqueça-me o
coração, às vezes, a contragosto.
O fogo da graça de Deus
requer que o pecado seja confessado de coração a quem estiver dentro do círculo
da ofensa. Assim, eu confesso meu pecado, com arrependimento convincente, a
Deus e à pessoa ou pessoas contra as quais eu pequei; se alguém pecou contra
mim, confronto-o graciosamente a fim de restaurar a paz de Cristo; e o pecado
de outros contra outros, rego-o com a pacificação do Espírito.
É claro que leva um tempo para
que o doce fique pronto. O coração viciado em amargura aprecia o gosto acre da
ira destemperada, e eu continuo desejando que todos, especialmente meus
desafetos, gostem do doce de jiló. Mas quando isso ocorre, lembra-me o Senhor
de que sequer consigo discernir minhas próprias fraquezas, quanto mais saborear
a dos outros; sobretudo, as coisas do Senhor são mais desejáveis do que ouro, mais do que muito ouro depurado; e são
mais doces do que o mel e o destilar dos favos (Salmo 19:10-12).
Wadislau Martins Gomes
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