NormanRockweel: Mother and childreen |
Ainda adolescente, quando não
participava, pelo menos, eu ria com os esquetes
humorísticos na “noite dos talentos”, e um que se repetia ano após ano era o de
“mãe, só tem uma!”, trivializando o bordão por meio da constatação, junto à
geladeira, de que só havia uma garrafa de refrigerante para levar à mesa.
Agora madura mãe e avó, rumino
sobre a singularidade e multiplicidade das mães. Mãe, minha, só uma. Há três
anos que ela foi promovida à presença de Cristo (aí vai outro chavão que insiste
em permanecer na mente criança da gente). Chegado o dia das mães, eu teria de
receber uma rosa branca, fossem as comemorações iguais à que mamãe promovia na
igreja. (Vermelha só para quem tivesse mãe viva.) Mamãe era uma pessoa única,
maravilhosa, esquisita no sentido do inglês de “singularmente especial” e do
brasileiro de “estranho e que foge aos padrões da normalidade”. Missionária
educadora, foi parteira nos primeiros anos nos antigos campos de Minas Gerais e
Goiás, e ajudou a trazer à luz a muita gente. A mim, que nasci de seu corpo, e
recebi a Cristo aos quatro anos de idade quando constatei que nunca havia me
convertido e insisti com ela que me “ajudasse” a nascer de novo. Além de dar a
luz, sempre iluminou minha vida apontando para Jesus a quem servia. Minha mãe
era de pedra dura e água fluida, mole e sensível. Os sentimentos batiam fortes
de carinho e aconchego e se misturavam com certa rejeição – por achar que
jamais chegaria aos padrões de perfeição que ela exigia de si e dos outros:
marido, filhas, gente a quem ministrava com orgulhosa humildade. Inseguranças e
incongruências sempre marcaram o relacionamento com minha insubstituível,
notável mãe que me tentava por no colo mesmo quando ela era frágil velhinha e
eu já avó assumida. Sinto falta dela até hoje, embora depois que me casei há
muitos anos, convivemos muito pouco. Sobretudo, sinto falta de suas orações, e
constato que sempre fraqueja a minha resolução de continuar a vida de oração
que ela deixou quando passou à Presença. Sempre soube que quem realmente
intercede por mim é o próprio Espírito Santo, mas sentimentalmente, até hoje sinto falta da intercessão de minha mãe.
Fui ainda abençoada porque
mãe, não tive só uma. Quando conheci a mãe do Wadislau, imediatamente ganhei
outra mãe. Sempre presente em datas marcantes ou comuns, no nascimento de meus
filhos, nos sofrimentos e nas alegrias da vida. D. Eulina era uma clássica mãe
cristã carinhosa, atuante e sempre carente da graça e transbordante do amor de
Cristo. Sempre dando mimos, presentes e atenções a mim, iguais aos que
compartilhava com os filhos do ventre, minhas cunhadas e meu marido. Eu não a
chamava de mãe, mas trazia-a no coração como tal, e sei que ela também me via
como filha caçula.
Em cada igreja em que
estivemos, Deus sempre me presenteou com algumas mães inesquecíveis. Em BH, tia
Aninha foi mãe para mim. Na Ebenezer, Dona Isolina Berthaud me acrescentou à
prole de três filhos homens. Dona Bernardina, com sua ingênua sabedoria
analfabeta, sempre demonstrou carinho por nós e nossos filhos (não existe
melhor modo de ganhar o coração de uma mãe do que amar seus filhos). Em Jaú,
três eram as preciosas e marcantes “mães oficiais”: Dona Hyripsimé (ou
Iracema), dona Wanda e Dona Elpídia – para a jovem, inexperiente e muitas vezes
inepta esposa de pastor, essas três esbanjavam carinho, cuidados e conselhos
vivendo de modo prático o ministério maternal que Paulo recomendou Tito
promovesse para as mulheres mais maduras da igreja.
Hoje eu estou entre as mulheres mais maduras da
igreja, e quando não posso ajudar minha filha que está longe, fico com coceira
na língua para compartilhar com mulheres mais jovens que enfrentam lutas e
vitórias que já vivi. (Aprendi que guardar a língua é um dois exercícios de
amor cristão mais importantes na vida. Mas às vezes ainda dá coceira!). Fato é
que continuo vivendo maternidade, embora meus filhos sejam adultos maduros que
independem de mim e a quem às vezes eu recorro com certa dependência. Ainda
hoje me alegro quando recebo notícia de alguém que conheceu a Jesus por meu
intermédio, ou aprendeu uma receita inesquecível que virou parte do repertório
de sua casa, ou foi edificada por algo que falei ou escrevi. Cada experiência
fez e faz parte de uma vida em que muitos foram os questionamentos, algumas
foram lutas travadas ainda não vitoriosas, diversas as inseguranças e
incertezas – e permanece sempre a certeza de que “Aquele que começou boa obra em
vós a aperfeiçoará até o dia de Cristo Jesus”. Já e ainda não – constatação de nossa salvação e glorificação passada,
presente e futura. Mãe, tenho tido muitas, mesmo que cada uma tenha sido única.
A própria maternidade nos faz considerar a profunda questão filosófica
existencial de unidade e multiplicidade. E, ao lembrar de minha mãe única e de
minhas muitas mães, tenho de aplicar as lições de vida a minha própria
existência para que, ao aplicá-las às vidas de meus filhos e das gerações
futuras, eu sempre esteja firmada na Rocha/Refúgio. Maternidade não é algo
estático nem é apenas simbólico. Gera, nutre e multiplica vida para a
eternidade. Por isso aproprio-me de uma figura materna para falar do
relacionamento dessa criatura caída e restaurada com o todo poderoso Deus dos
Antigos: “como a criança desmamada se aquieta nos braços de sua mãe, como essa
criança é a minha alma para comigo” e confiante, afirmar ainda com o salmista:
“Espera, ó Israel, no Senhor, desde agora e para sempre” (Salmo 131.2 3).
Elizabeth
Gomes
2 comentários:
Muito doce e linda essa homenagem Beth. Mesmo com tão pouco convívio e diálogo, o pouquinho que partilhamos me deixa uma vontade enorme de quero mais, assim como de voltar a saborear a sua comida. Que Deus a abençoe e nos possibilite muitas oportunidades de encontros. Sinta-se abraçada e transmita o meu abraço ao Wadislau. Beijos.Socorro Lima
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