segunda-feira, fevereiro 28, 2011

MISSÕES, A “MENINA DOS OLHOS” DE DEUS?


A frase soa bonita, a despeito do lugar comum. Mas será verdadeira? (Sou a favor da missão da igreja!) A questão é que, quando “missões” são compartimentadas, a missão da igreja perde o vigor que Jesus imprimiu na Grande Comissão. Isso ocorre, quando o geral é tomado pelo particular e vice versa. O geral, nesse caso, é a igreja (Porque a porção do Senhor é o seu povo... a menina dos olhos; Dt 32.9a-10c) e o particular a missão da igreja. A visão (pós)moderna de missões copiou o critério de um tipo de sociologia e de antropologia que se opõe a Deus para interpretar sua Palavra. Isso, acrescido de zelo virtuoso e de licença poética, mas não fiel ao texto, que, aproveitando-se de um lapso de tradução, enalteceu o “ide” a ponto de idolatrá-lo. (Se alguém, como neste caso, disser o que direi, certamente perderá a comunhão à pecha de incrédulo, e sem direito  a ser assistido pelo ministério missionário!). Em Mt 28.18-20, o Senhor disse: Indo... fazei discípulos... batizai-os... ensinai-os... Assim, tão importante como ir, é a maneira como o missionário vai sob a autoridade do Senhor; e ele vai com o tríplice propósito de fazer seguidores de Cristo, inseri-los na igreja visível e ensiná-los a obedecer a Palavra de Deus. (Ver meu livro: Em terras dos brasis, Brasília, Refúgio, 1999.)

O problema com o modelo hoje apresentado é que ele, geralmente, torna-se paraeclesiástico, mesmo dentro de igrejas (às vezes, em função de má percepção do texto bíblico, outras, como “estratégia” de mercado). Como poderíamos levantar nossos olhos para os horizontes do mundo que Deus descortina para a missão da igreja? Serei honesto no meu coração para mudar, se necessário, tal como desejo que os corações sejam transformados, mundo afora? O que fazer com a liderança que já conquistei nessa área? Como proceder, se já estou no campo? Lembre disto: barco parado não poder ser guiado (...assim que as plantas dos pés dos sacerdotes... pousem nas águas do Jordão, serão elas cortadas; Js 3.13). Nenhum de nós será perfeito, mas Deus corrige nossos rumos – e isso mesmo é que a igreja e o mundo precisam ver. Pelo menos, meu desejo sincero é pensar após os pensamentos de Deus.

A primeira coisa a pensar é: A igreja é a agência missionária de Deus e sua missão é de testemunhar o evangelho daquele que é a cabeça da igreja. Ora, o corpo da igreja só tem duas dimensões, isto é, a igreja invisível, de todos os tempos, e a igreja local (todos os concílios são de igrejas locais reunidas para fins administrativos e de viabilização da obra). Esse corpo, do qual os membros individuais são inseparáveis do conjunto, é que recebeu o mandado missionário. Isso altera a totalidade do modelo; remove do cenário os franco-atiradores. Muitos desses, pensando calçar as sandálias de Paulo, passam ao largo das reuniões conciliares, em Jerusalém, e das muitas reuniões de orações que foram concluídas com separação e envio de missionários (At 13.1-4). Certamente, ocorrerá o pensamento: “Mas é minha igreja que está ‘fazendo’ missões”. É bem verdade que as igrejas estão fazendo um esforço sansônico, gideônico e paulino para honrar a ordem do Senhor. Mas esse esforço é baseado em fé ou em obras? As obras pretendem conquistar números e apresentar bons relatórios (o que é bom, se não for princípio diretivo). A fé deseja cumprir a missão segundo o modelo bíblico e, só assim, obterá os frutos prometidos (Jo 15).

A segunda coisa a pensar, então, é: como será possível cumprir a vontade de Deus, sem cair no modelo que considera uma ou outra parte do corpo como se fosse “a menina dos olhos” de Deus? A resposta a essa questão é exatamente o ponto funcional da Grande Comissão: discípulos são confirmados nas igrejas (At 18.18- esp. 23), batizados nas igrejas (1Co 12.13) e ensinados nas igrejas (Ef 4.11-12). Note que eu não refiro à casa em que a igreja se reúne, mas ao corpo de Cristo em algum lugar. Vem daí, então, que a única maneira de realizar a missão da igreja será por meio do crescimento da igreja local na unidade de Cristo, na obediência à Palavra e na verdade em amor entre os irmãos. Essa é a plataforma da qual o verdadeiro evangelho será ouvido de modo convincente. A expansão, então, se dará, quando, dessa plataforma, vidas coerentes com as palavras do testemunho, apresentarem uma mensagem pura, um compromisso de lealdade ao Senhor quanto à comunhão dos santos, e uma disposição para mudanças de coração e de comportamento. Serão vidas transformadas, respaldando a palavra anunciada. Em um mundo de comunicação, as coisas têm nome a fim de serem reconhecidas. Como poderíamos chamar isso? Transplante de igreja? Multiplicação de igrejas?

A ideia é uma de exibir, por vida e por palavra, o evangelho da solidão de Cristo na cruz do Gólgota e a unidade da Trindade na sua ressurreição. Isso só poderá ser feito por meio do seu poder exercido sobre pessoas que ele chamou à comunhão de sua morte e ao poder da ressurreição. Ninguém, sozinho, exibe unidade, comunhão e amor. Além disso, sem que alguém seja membro do corpo, amadurecido, experimentado no exercício dos dons conferidos à igreja, não poderá testemunhar os frutos que atestam a fé. Tudo o que poderemos fazer, individualmente, será “jurar por Deus” que existe uma igreja que obedece a Cristo. Mas teremos de nos desculpar que não deu para trazê-la porque... havia outras coisas mais importantes para fazer.

Trocando em miúdos, o diferencial da riqueza do modelo de missão da igreja, neste terceiro ponto, está nesse transplante de igreja (não é só rótulo novo, não). A proposta é uma de os missionários não precisarem levantar sustento, mas serem enviados por uma ou mais igrejas ou denominações cuja disposição para cumprir a missão não se limita a dar dinheiro para a “menina dos olhos” mais bonita. A missão da igreja é fazer discípulos, batizar e ensinar – e expansão é parte dessa missão. Logo, a igreja tem a missão de manter missionários que não precisem levantar fundos para a tal menina.

Outra parte da proposta é que, para transplantar igreja, nenhum missionário vá sozinho, portando fotos da congregação assentada nos bancos do lugar de reunião. Hoje em dia, com “fotochope”, todo mundo duvida da prova; é como comprar carro usado por correspondência. Para testemunhar a ação de Deus na igreja, só uma igreja. Assim, poderia ser que duas ou três famílias de dispusessem a se mudar com o missionário para um local determinado, para viver como igreja. Além da mostra nas reuniões desse pequeno grupo, há o valor do testemunho de profissionais, que dará suporte à palavra pregada. Nesse ponto, a questão logo apontada é: “Missionário até que é fácil arranjar, mas profissionais... é outra história. Que história? Que Deus só chama missionários profissionais e não profissionais missionários? Deixe-me ser franco (com educação): aquela coisa de uns contribuem e outros vão só dá certo quando os corações estão empenhados. Dinheiro sem coração é corrupção. E aquela coisa de consagração, visão missionária, ação de Deus? Só na vida de alguns. Eu sei que há gente das mais diversas áreas –saúde, construção, direito, magistério, comércio, serviços e mais – que só não vão por causa da mentalidade individualista e sacerdotalista que grassa a igreja.  Reúna a igreja ou parte dela (presbíteros, diáconos, homens ou mulheres) e aguarde, em jejum e oração, que o Espírito separe os escolhidos. Só mantenha em mente que jejum significa a disposição de depender de Deus e, oração, a disposição de obedecer à vontade dele.

A terceira coisa é a logística. O missionário pastor terá de treinar os profissionais missionários no conhecimento experimental de Deus e da sua Palavra. O tempo que isso leva será o tempo para que a igreja e ou igrejas (as denominações terão de concentrar esforços na igreja local) formem a visão do projeto missionário. Não bastará realizar um curso bíblico, por melhor que seja, mas terá de haver tanto uma aplicação e implementação desses estudos na vida pessoal e familiar, quanto um entendimento do desempenho profissional dentro de uma cosmovisão bíblica. O profissional não ajudará em nada se não discernir seu trabalho como área teológica. Mecânico cristão? Sim. Mas isso não é coisa neutra? É? Leve seu carro no mecânico que arrebentou o meu e veja só; quase que me arrebento. Além da honestidade, da precisão do serviço e da beleza do tratamento, existe toda uma estrutura que suporta as profissões: disposições do trabalho/descanso e recompensa, doutrina bíblica do corpo e da alma, direito bíblico, motivo econômico financeiro, forma e criatividade, conceito e prática da educação, funções operações domésticas (posso parar?).

A quarta coisa é o alvo missionário. Nos meus dias de neófito, missões indígenas estavam na crista da onda. Depois, vieram as vagas das portas abertas para além das cortinas de ferro, de bambu, da resistência do povo da Bíblia (que foi a minha praia); então, do primeiro mundo (porque o Brasil já podia exportar). Fechadas as portas por causa do marasmo dos contribuintes, veio a janela aberta para os maremotos dos mais difíceis e dos não alcançados. Tudo de conformidade com o poder de Deus que nos usa, mas que não depende de nós e realiza a obra a despeito de nós. Agora, chegamos a um ponto mais abrangente. Muitos perceberam que plantar igreja dá mais resultado do que eucalipto em proximidade de fábrica de papel. O problema é que uma igreja de papel, sujeita às oscilações do mercado, não tem a fibra necessária para ser leal ao Senhor da igreja. A proposta é: permanecer sensível diante de Deus para o que ele considera ser o campo alvo; permanecer em oração, sensível à orientação do Espírito para o lugar e a época adequados; obter conhecimento do lugar e de pessoas onde e com quem serão formados os laços de afeto que propiciam, pela ação do Espírito, a pregação e a recepção do evangelho de Jesus.

Quem faz essas coisas? O missionário (e presta relatório)? O grupo a ser enviado (e volta para entusiasmar a igreja)? A liderança (e volta para determinar a ação)? Sim, mas leva a igreja toda. Não digo todos todos, mas aqueles a quem o Espírito puser no coração o desejo espiritual de se envolverem na obra. Aí, sim, é hora de lançar mão do arado e só olhar para trás quando parar um pouco, só para ver quem vem vindo. Isso é necessário, pois a igreja deverá fazer daquele campo um lugar de férias ou projetos de trabalho (enquanto descansa, carrega pedra). Haverá muito para ser feito, de visitação e labuta no pesado, até lazer, ouvindo e contando “causos” regados a moda de viola ou Vila Lobos.

Finalmente, a nova igreja tem de dar o testemunho de adoção da terra e povo que pretende abençoar com o evangelho. Senão, quem irá acreditar que Jesus Cristo é o Verbo que habitou entre nós. Outro dia, conversando com Davi (Charles Gomes, meu filho), fiquei mais crente e comecei a sonhar com lugares que poderiam ser transformados no contacto com crentes operosos. Lembrei de uns moços (ei! agora, vocês são velhos) que resolveram se preparar para servir a Deus dessa maneira. Eram de três áreas profissionais planejadas para facilitar o testemunho que dariam. Dez anos depois, ainda os encontrei em Santa Catarina, concluindo mestrado e doutorado, firmes no propósito inicial. Em Boston (nos “estadunidos”), junto com o projeto da Igreja New Life, Davi e eu participamos de outro projeto chamado Boston Venture, de cooperativas baseadas na igreja. Hoje, estamos pelejando com a Igreja Presbiteriana Paulistana, junto com os santos Heber e Alderi (com todo respeito, doutores) e um grupo de profissionais, multiplicando uma igreja. Virá o dia em que teremos nosso centro de recursos para a igreja e a comunidade, fornecendo aconselhamento bíblico para áreas como do homem interior (não é só problemas não), saúde, direito e daí em diante. Bem que você poderia pensar em uma cidade no ineriorzão ou na África ou no fim do mundo... (só não que eu mesmo não posso ir, porque estamos fazendo uma obra de peso, aqui!).

Wadislau Martins Gomes

sexta-feira, fevereiro 25, 2011

DOS DIREITOS HUMANOS E DOS PRIVILÉGIOS CRISTÃOS

O papagaio da minha avó não gostava de menino de calça curta. Atacava o incauto aos gritos: “ Laura! Tem moleque da rua!” A parentalha ficava dividida sob o olhar grave/zombeteiro do Venâncio. Eu, é claro, com a barra nas canelas, era contra o louro. O que ficou foi o comentário murmurado do primo Ézer: “Criança tem direito”. É isso aí! O termo “direito” é tão papagaiado que virou palavra de contacto. O primo era mais a favor da pessoa humana do que a favor da “pessoa humana” do penado. Percebe aonde eu vou? Há gente verde que é pró-vida de bicho e pró-aborto de humanos. Ainda bem que os direitos do corpo não têm implicações retroativas, senão, menino de calça curta que se cuide. Um dia, lanço o movimento pró-chupa ovo de psitacídeos, e vai ser aquele angu de caroço. Para fugir das piadas de papagaio, faço uma troca: uso o termo “privilégio”. Assim: Privilégios e responsabilidades da pessoa.

Toda pessoa têm o privilégio de viver! Viver é bom, como disse o Gonzaguinha: “É a vida, é bonita e é bonita...”. Sem falar na outra vida, esta já é boa! Só viver já vale a pena de ter nascido... O que é que é? É que, para ser realista, a gente dói para nascer e continua doendo e com dor até que chegue a hora de enterrar o terno. Mas nos momentos em que a dor passa, a vida se mostra linda, gostosa, (casando passa, soprando alivia, dormindo esquece...). E é Deus quem dá a todos essa alegria: vida, respiração e tudo mais (Atos 17.25). Pois olha: esse privilégio concedido por Deus vem com um pacote de promessas que nos habilitam a viver a vida eterna já aqui na terra (2Pedro 1.3-4). Já pensou, ser feliz que só Deus?  Quanto é que custa? Na verdade, a vida é tão cara que ninguém pode comprar (Salmo 49.8); e, no entanto, é de graça (Deus, sendo rico em misericórdia... estando nós mortos... nos deu vida juntamente com Cristo – pela graça sois salvos (Efésios 2.4-5). Portanto, o privilégio da vida é seu direito adquirido pelo Autor da vida e a efetividade desse direito é contingente à permanência nele (João 15.1-5).

Toda pessoa tem o privilégio de ser amada por Deus e de amar o próximo. O papagaio popular diz que sem amar a si mesmo não dá para amar aos outros. Mentira; você já se ama tanto que, até quando fica bravo, cruza os braços e se abraça. O privilégio de amar é contrário ao direito de ser amado. Para que o amor seja sentido, é preciso que haja amor: sair para o encontro; acolher o outro; fazer o bem (Romanos 12.3, 8-10). Deus já provou seu amor, entregando o Filho eterno para entrar na humanidade e dar a vida por nós (Ninguém tem maior amor do que este: de dar alguém a própria vida em favor dos seus amigos, João 15.13; ver 3.16). O amor ao próximo adquire altura e profundidade no entendimento de que alguém só é autêntico se o semelhante experimentar seu amor. Esse é um privilégio que gera o direito divino (Salmo 89.14). Amor sem justiça é papagaíce, som de metal frio, paixão sem dedicação, assistencialismo sem compromisso pessoal. O verdadeiro amor, às vezes, pode ser duro e forte, mas é sempre paciente, benigno, sem inveja ou ciúme, humilde, convenientemente, altruísta, bondoso, inimigo da injustiça, e verdadeiro; esse amor é um privilégio e um direito: O amor jamais acaba (1Coríntios 13).

Toda pessoa tem o privilégio do acesso à verdade e de ser verdadeira. Foi o Ben Franklyn que saiu com essa de que ninguém poder chegar à verdade, se não for livre para buscá-la. O que Jesus disse, foi: Conhecereis a verdade e a verdade vos libertará (João 8.32). Tente, um dia desses. Com efeito, a verdade está aí, para todo mundo ver. A natureza a proclama com sua ordem inteligente (até papagaio, sem inteligência, repete) e a consciência a sussurra mais que grilo falante (Romanos 1.19 e 2.15); a Bíblia revela seu sistema e Jesus Cristo torna-a experimental (Salmo 19.1 e Hebreus 1.1-4). Só não vê quem cerra o cenho ou olha de lado. No entanto, a verdade merece ser vista. Ela é bonita, quando bem entendida e vivida. Às vezes, usamos a verdade como desculpa para a maledicência e ela fica mais feia que filhote de papagaio “Olha, quero ser franco” (isto é, mal educado); “Sabe, eu falo a verdade: fulano...”. Mas quando a verdade é dita em amor, até injeção na testa a gente aceita. Esse privilégio vem de conhecer o caminho da verdade que conduz à vida, isto é, Jesus Cristo (João 14.6). Ele pagou o preço da verdade para que obtivéssemos o privilégio de sermos verdadeiros. Certamente não será fácil, pois, custou para o Senhor e custará também aos servos da Verdade. O movimento dos “sem Deus” se ocupa de suprimir a verdade (Romanos 1.18), sem perceber o autoengano que existe na mentira. É como o nadador que “colou” na prova de nado livre. Dizem que brasileiro mente “por educação”: se disser que vai, poderá não ir; se disser talvez, é certo que não irá; e se disser que não vai, poderá ser que apareça. Ah! Se conhecesse o privilégio da verdade e de ser verdadeiro, com justiça e em amor! Privilégio que é também direito à habitação segura. O rei Davi descreveu a pessoa que habita na nobreza de Deus: O que vive com integridade, e pratica a justiça, e, de coração, fala a verdade (Salmo 15.2, ver 1-5). Quando este mundo não concede a preferencial à verdade, o privilégio do crente está em manter sua palavra (Salmo 15.4) e em sofrer injustiças em nome do Senhor (Mt 5.10-12).

Toda pessoa tem o privilégio de ganhar sustento para a vida por meio do trabalho honesto. Esse é outro ponto em que há papagaiada. Já ouvi de tudo, de “quem trabalha não tem tempo para ganhar direito” até “bobo é relógio que trabalha de graça”. O princípio bíblico do trabalho reside em quem Deus é: um Deus de obras. Ele criou o mundo e nele opera, incansável. “Mas” – o espertinho vem, de novo – “Ele não descansou, no sétimo dia?” Não de cansaço, mas descansado na essência da criação (Colossenses 1.15-17), o próprio Filho, o qual disse: Meu Pai trabalha até agora, e eu trabalho também (João 5.17). A razão para o trabalho humano é o reflexo do caráter de Deus, em verdade e em amor. Assim, ele é formador do caráter e seu salário é evidência da bondade divina. Como o apóstolo Paulo disse, não roube; trabalhe, fazendo com as próprias mãos o que é bom, para que tenha com que acudir ao necessitado (Efésios 4.28). Se você não pode trabalhar, descanse no Senhor, orando pelo pão do céu e em favor daquele que trabalha de verdade e com amor, pois ele terá o privilégio de repartir com você as bênçãos de Deus. Quando ao descanso, Jesus disse que o sábado foi estabelecido por causa do homem (Marcos 2.27). O binômio trabalho/descanso (tanto no sentido repouso quanto de confiança em Deus) é um princípio sem o qual não bastará redistribuição de terra, casa para todos, auxílio família, bolsas sem fundo e daí em diante. Nem mesmo redistribuição de renda funcionará (tudo justo, justíssimo, mas posto a perder se a preguiça der em cima como infestação de saúva – e olha que ela trabalha!). Por exemplo, quando impedimos a criança de aprender o gosto pelo trabalho, ensinamos a preguiça. Assim, esteja certo de duas coisas: embalo da rede sem ter do que descansar é fábrica de espertinho ladrão; e Melhor é o que se estima em pouco e faz o seu trabalho do que o vanglorioso que tem falta de pão (Provérbios 12.9). Trabalho também é privilégio, e o cuidado com quem não pode trabalhar, é direito dele.

Toda pessoa tem o privilégio de ser chamado para conhecer e para cumprir o mandado da educação. A história, aqui, é a mesma do princípio do trabalho. Deus, que tudo sabe, revela o conhecimento dele mesmo e da criação, de maneira que, pelo conhecimento dele e de nós mesmos, experimentemos a vida verdadeira, justa e amorosa (ver Jeremias 9.24; Eclesiastes 7.25; Jó 38—41). Ele não somente nos ensina à distância, mas formalmente na Palavra, informalmente na comunhão de Cristo e não-formalmente na experiência com seu Espírito (João 14—16; 2Timóteo 3.16). Agora, dizem por aí que educação é direito de todos – e vamos ensinando por linhas tortas. Educação é um privilégio, e ainda que seja do direito divino que os filhos sejam ensinados (Deuteronômio 6.6-9), deve ser considerado um privilégio e não um meio “espertinho” de conseguir “diploma” (leia-se cartucho para arranjar emprego). Nesse sentido, o Estado tem o dever de prover educação básica que dê condições para estudos mais elevados; contudo, não podemos perder de vista as diferenças de mérito. Educação subida é para quem sobe, e não elevador de carga montado para a construção da economia nacional. O privilégio da educação segundo o mérito enobrece a nação, mas a massificação do ensino torna o povo medíocre. Quem usufrui o privilégio do verdadeiro conhecimento é como praia banhada pelas ondas da sabedoria (a terra se encherá do conhecimento do Senhor, como as águas cobrem o mar, Isaías 11.9), mas aquele que toma a educação como direito sem dever de sabedoria, é imprudente (Todo prudente procede com conhecimento, mas o insensato espraia a sua loucura, Provérbios 13.16).

Toda pessoa tem o privilégio de cuidar da saúde do necessitado e de ter a própria saúde cuidada segundo as necessidades. O que é que você prefere: ser pobre e doente ou rico com saúde? Mas que dúvida! O problema é quando a saúde vira direito. Se fosse assim, eu aderiria ao sindicato dos enfermos para fazer passeata na porta do hospital: saúde já! Saúde é um privilégio! Aqui, o espertinho tentar explicar: “A proposta é que todos tenham direito ao cuidado da saúde. Ah! mas essa é boa! Então, o mesmo anônimo que fomenta o comércio de remédios é que vai cuidar da minha gripe? Vai nessa! O resultado é esse que está ai. A mulher grávida, no posto de saúde, reclama para outra de bucho inchado: “Com essa merreca do auxílio natalidade nem vale a pena de ter filho”. Esse tipo de mentalidade acaba dando no lugar comum de maus tratos, negligência e abuso de “otoridade” na recepção de hospitais. Depois, vêm as explicações no jornal da TV: falta de verba, de pessoal, de vergonha na cara. Não se engane não. Saúde é um privilégio; o direito de Deus dirá que o Estado é responsável por manter o trem nos trilhos, mas os viajantes são responsáveis pelo bem estar na viagem. No antigo Israel bíblico, o governo era civil e religioso (que não deve ser o caso agora, posto que, em governos não teocráticos, a separação entre a igreja e o estado é coisa saudável e necessária). Contudo, o princípio permanece, cada uma das esferas cumprindo suas funções. Naquele caso, Deus falou, por boca do profeta, que era lamentável que os dirigentes do povo enchessem o pandulho do melhor, vestissem com o melhor, mas se descuidassem do povo. Esse, como ovelhas sem dono, cerca ou aprisco, esperava a hora da degola (depender da previdência pública). A doente não curastes... mas dominais sobre elas com rigor e dureza (Ezequiel 34.4, ver vv. 2-4). Saúde é um privilégio – bênção – e o cuidado com os enfermos incapacitados, especialmente se contribuem para a malha geral da previdência, é direito assegurado pelo privilégio do Estado, de fazer o bem.

Toda pessoa tem o privilégio de andar em bons caminhos com liberdade para ir e vir. Ir e vir são privilégios de quem anda em bons caminhos. Sabe aquele sinal de preferencial que a gente só tem se o caminhão der? Pois é, o privilégio de andar é preferencial. No entanto, eu não posso ir e vir como entender e quiser. Há caminhos que me parecem bons, mas que conduzem à morte (Provérbios 14.2). Eles poderão até parecer puros, mas Deus pesa o espírito (Provérbios 16.2). O fato é que eu devo andar prudentemente, não como néscio, mas como sábio (Efésios 5.15). O néscio pretende ignorar a Deus (Salmo 14.1), mas o sábio considera a Jesus, aquele que disse: Eu sou o caminho, e a verdade, e a vida (João 14.6a). De que me adianta o “direito” de ir e vir, se não for para o lugar que eu quero nem for para voltar inteiro?  Minha origem e meu destino é Deus, para salvação e juízo, e o sinal de preferencial é como Jesus conclui a frase: ninguém vem ao Pai senão por mim (João 14.6b). Isso apresenta dois problemas. O primeiro é que as estradas andam um acidente! Tem seca que cresta a terra, tem chuva que desaba e leva o morro, têm furacão e terremoto roncador, todos atos de Deus, com justiça e amor. Discutir isso é ficar de mal com Deus porque ele é justo (de minha parte, sei onde o calo aperta), e significa abandonar sua casa só por que ele não me permite o que quero. Nesse caso, livre ir e vir é meu direito à inimizade contra Deus e homens (Jeremias 14.17).  O segundo é que o direito de ir e vir anda na contra mão, e não só quando vamos de visita aos parentes nos feriados ou ao nordeste para ver as dunas e tomar banho de suor. Acontece assalto nas esquinas e nos pedágios. De todo lado tem gente competindo, dando trança-pés, cortando a frente, e gritando: “Liberdade !” Liberdade é um privilégio mantido pelas doces cadeias da verdade em amor. O apóstolo Pedro fundamentou a ideia, dizendo que não podemos usar a liberdade por pretexto da malícia; antes, reconhecendo que somos seres dependentes (do ar, de gente, especialmente de Deus), vivamos a liberdade para servir a Deus no serviço aos homens (1Pedro 2.15). Ir e vir bem sucedidos só vivendo sob o temor de Deus, mas jamais sob o temor de homens; honrar ao rei, mas adorar somente a Deus; servir a Deus com humildade, servindo a todos com nobreza, sem servilismo; tratar o bom e o perverso com verdade em amor (um ou outro em primeiro, conforme a situação, mas sempre os dois), principalmente, indo e vindo de consciência limpa (ver 1Pedro 2.16-19).

Toda pessoa tem o privilégio de abdicar de seu direito em função do bem estar de outros. Essa é a parte mais difícil, mas que é o comportamento final que denuncia a crença básica e possibilita tudo dito acima. O direito que eu tinha era o de ser responsável pela minha vida diante de Deus, mas, com a inflação do pecado, só de juros já era um inferno. Contudo, Jesus Cristo pagou as contas e adquiriu o direito sobre minha vida. Minha responsabilidade é, agora, quanto for possível e necessário, abrir mão da impressão de direito que ainda resta, e passar a justificação de Cristo à frente. Isso envolve muita coisa: ler, obedecer e falar da Palavra de Deus, orar por mim, pelos amigos e pelos inimigos; por pernas nessas orações, ser bênção de Deus na comunidade em que ele me colocou e daí em diante. Tudo isso é um privilégio!

Declarações finais (Mateus 5.1-6) – todo cristão tem privilégio de:
1. Exercitar humildade e, assim, viver na terra segundo o direito do reino dos céus.
2. Ser consolado por Deus quando lamenta a natureza decaída deste mundo.
2. Exercer mansidão (entrega de direitos), para herdar a justiça dos céus, na terra.
3. Desejar a justiça de Deus sobre toda a terra em vez de reivindicar justiça própria.
3. Ser misericordioso como Deus é em vez de se sentir miserável.
4. Considerar e confessar os próprios pecados, na justificação de Deus pela fé em Cristo.
5. Buscar a paz com Deus, com as pessoas e entre os homens, e ser chamado filho de Deus.
6. Ter coragem para sofrer perseguição por causa de exercer a justiça de Deus, na terra.
7. Ser luz do mundo e sal da terra, em todas as áreas da vida, para os homens glorifiquem a Deus.

Wadislau Martins Gomes

terça-feira, fevereiro 22, 2011

O QUE O FISCO TEM A VER COM O DECÁLOGO?


“Eu porto o nome de cristão: o que fazer, na firma, com a questão do fisco?” A pergunta sincera e genuína saiu engasgada. “Será que um cristão deveria ter esse tipo de questão? É um problema?” Calma, irmão! A questão é boa e, nesta vida, sempre teremos problemas. Quando criou o mundo, Deus fez tudo bom. É claro que um espertinho irá perguntar: mas, se era bom, como é que não é mais? Esse tipo de frase de espora só apressa o passo da mula de Balaão (Nm 22.22-31). Vai a resposta: Deus é o único perfeito, e qualquer coisa criada será menor do que ele (Hebreus 2.5-7). No entanto, o Deus dos impossíveis planejou, de antemão, aperfeiçoar o que era menos perfeito por meio da entrada da Luz nas sombras que o clarão provoca (João 1.1-14 e 2Coríntios 4.6). Por que não mais é bom? Porque os homens amaram mais as trevas do que a luz (João 3.17-21) e decaíram da comunhão da luz para a escravidão do tenebroso, dos pensamentos e atos deste mundo, e dos desejos da carne (Romanos 3.23 e Efésios 2.2-3).

Na criação, a vontade graciosa de Deus dominava o coração do homem e esse usufruía da plenitude do reflexo do caráter (glória) do seu Criador. A palavra do Senhor era lei e promessa de uma vida de criatividade e produtividade (crescer, multiplicar, dominar a terra, guardar e cultivar; Gênesis 1—2). Contudo, depois do pecado contra Deus, o homem se achou sem lei e forçado a ser lei para ele mesmo (Romanos 2.13-15). Isso é ilustrado na decadente “lei da oferta e da procura”: o teu desejo será para o teu marido, e ele te governará (Gênesis 3.16).

Por isso, no traçado do plano gracioso, Deus concedeu sua Palavra, para que fosse luz para a consciência e para o caminho dos homens (Efésios 5.6-13). Primeiro, ele descreveu a nova condição do mundo e fez a promessa da redenção (Gênesis 3, esp. v. 15). Depois, no correr do tempo, falou aos homens de muitas maneiras, e deu por escrito a sua lei (a Bíblia). Essa contém a sabedoria para viver de conformidade com sua vontade em um mundo decaído (Romanos 12.1-3; 2Timóteo 3.16). Note, porém, que Jesus Cristo é essa Lei perfeita, e somente os que são vivificados pelo seu Espírito poderão experimentar uma “novidade de vida” na obediência à lei.

O Decálogo, ou Dez Mandamentos, é um resumo da lei de Deus, da qual a suma é: amar a Deus e aos homens. A função da lei é uma de regular o relacionamento vital do homem com Deus e o consequente relacionamento entre os homens. Aí, exatamente, é que entra a implicação do Decálogo na resposta para questões e nas soluções para os problemas da vida. Para não gastar mais espaço (o de cima foi necessário), deixe-me tentar, em poucas palavras, interpretar e implementar aquilo que a Bíblia trata em 66 documentos escritos por cerca de 36 autores divinamente inspirados, ao longo de uns 1600 anos, e que é resumido nos Dez Mandamentos. Chamo-o de Decálogo para o pagador e o coletor de impostos.

1. Tenha um só Deus. Só o Deus revelado na Bíblia é Deus. Nem o dinheiro nem o fisco são deuses. A lei é a vontade de Deus e nenhuma lei humana que não seja expressão de sua vontade poderá ser legitimamente acatada. Somos criados à imagem de Deus (Salmo 135.15-18) e qualquer outro senhor, como o dinheiro, nos moldará segundo uma semelhança indesejada; seremos, individualmente, produtos de consumo e, corporativamente, mercadores de gente; ficaremos com cara de papel moeda.

2. Cultue a um só Deus. Devemos adorar somente a Deus. Os termos adorar e cultuar significam “servir” e “curvar-se”. Isso quer dizer que nos tornamo-nos escravos daquele a quem servimos. Servir ao dinheiro (ou ao fisco) será ter a vida governada pela ganância, própria ou dos outros (Ninguém pode servir a dois senhores... Não podeis servir a Deus e às riquezas; Mateus 6.24). Todos os problemas derivados do dinheiro e seus comprometimentos serão sem solução (aparentemente) somente se nos colocarmos sob seu poder tirânico. Daí, quando dizemos que não dá para sobreviver com tantos impostos extorsivos, estaremos, de fato, declarando nossa crença em que, em nossa vida, a redenção de Deus não alcança as áreas do trabalho e do ganho, e, assim, amamos o dinheiro e tememos o poder do fisco.

3. Não tenha ídolos do coração. Ídolos que representam o poder de Deus são deuses que nos escravizam. Todo poder redentor que não o de Deus, seja o fisco desonesto seja a sonegação fiscal, é abominação ao Senhor. É abandono, rebelião e imprecação contra o único Deus que, em amorosa providência, já nos deu todas as bênçãos de que precisamos (2Pedro 1.3). O ídolo do lucro, ao invés, cobra as taxas mais altas do que as da ganância e da usura, e do que as do fisco – cobra a própria dignidade da vida.

4. Descanse no Senhor. Deus é nosso sábado, nosso descanso, o que quer dizer confiança em Jesus Cristo que consumou nossa redenção (Hebreus 4). Seu motivo para o homem é o trabalho/descanso baseado na confiança em sua providência e não no esforço humano. O objetivo é que o labor criativo e produtivo do homem imite o caráter criador/trabalhador de Deus, para que a satisfação da obra acabada seja um de contentamento na relação de amor a Deus e entre suas criaturas. Pelo contrário, o objetivo do lucro é culto ao trabalho e configura serviço escravo, sem ganho real e sem reconhecimento de sucesso. O objetivo do lucro gera competição sem vitória, fomenta revoluções – e deixa na boca um gosto amargo de má remuneração. Deus somente provê trabalho e ganho; ele somente dá descanso verdadeiro. Confie que o Deus que dá a força e o trabalho é quem provê para o imposto.

5. Honre as autoridades. Deus é quem controla, está presente e tem autoridade sobre todos em geral, e sobre nossas vidas, em particular: o coração do rei está nas mãos de Deus, e esse o inclina para onde quer (Provérbios 21.1). O mandamento de honrar e obedecer aos pais se estende à sujeição a todas as autoridades constituídas, boas ou más, porque são ministros de Deus para recompensar ao bom e punir ao mau (Romanos 13.1-8). Assim, quando Jesus disse: Dai, pois, a César o que é de César e a Deus o que é de Deus (Lucas 20.25), não colocou os dois em iguais termos de lealdade, mas César sob Deus. Quem não acata as autoridades, não acata a Deus – nem o potencial contribuinte nem o fisco. Entretanto, quando o ministro civil descumpre, passiva ou ativamente, a lei de Deus, é dever e direito do cristão buscar, pela lei, o direito do Senhor. Imposto além do devido ou que sirva a outros propósitos que não o bem da comunidade é atentado contra o Senhor e deve ser combatido; contudo, jamais pela desobediência ou pela revolta. O cristão deverá, então, buscar o amparo da lei humana, um juiz que conceda seu direito para, com deferência de honra, dizer: O rei justo sustém a terra, mas o amigo de impostos a transtorna (Provérbios 29:4)! Imagine aí, milhões de cristãos comprometidos com Deus, zelosos da justiça e do direito, indo às tribunas do povo e aos tribunais para arguir o leão! Ei, cristãos que operam o direito: onde estão os estudiosos e práticos defensores das ovelhas?

6. Não mate a honra e a lei – mate a questão! O mandamento de não matar não significa que a vida e a sobrevivência sejam mais preciosas do que Deus; significa, sim, que só o Autor da vida tem o direito de tirá-la. O Estado recebeu de Deus esse direito, em casos especiais, e nós temos o direto de defender nossa própria vida e a daqueles que Deus colocou sob nosso cuidado. Mas ninguém tem o direito de decidir tirar a vida do seu semelhante. Nem mesmo de “matar” o espírito de vida que há na lei. Impostos promovem o bem estar da comunidade, a alimentação, a saúde, a educação e a liberdade. “Matar” impostos será atentar contra a sociedade. “Matar” o povo com impostos extorsivos será também atentar contra a vida do homem que tem nome e endereço em favor de uma parte da sociedade anônima e rica (dinheiro suado, muito imposto; grandes fortunas, favor posto).

7. Não adultere. Adultério de contas está tão em moda no mercado como no casamento. É um tal de “ficar” (ei! sou ararense, mas não disse fiscar), de pular cerca, de passar nota com valor mais baixo ou de vender sem nota, que ainda vai acabar em divórcio econômico social. Que remédio? – você pergunta. Bem amargo, eu respondo. Até quando? Bem, quanto mais você demorar em tomar uma providência legal, prosseguirá pagando o preço da omissão. Mas não tem jeito? Tem, é claro. Use toda lei dos homens para produzir o benefício que ela deveria proporcionar. Vá à luta em favor da honestidade. Se adulterarmos o direito, além de ficarmos com cara de safados, ainda acabaremos “rodando bolsinha” nas esquinas da vida. Lembre-se, porém, de que, conquanto sonegar seja crime, evitação segundo a lei é sabedoria.

8. Não roube (isso serve para o leão e para as ovelhas). O imposto justo não nos pertence, mas ao Senhor que dá vida, força, lugar de trabalho, salário e descanso; e que concede ao povo a participação nos seus benefícios. Quem “inventa” imposto ou quem falseia a nota fiscal rouba a Deus e aos homens. Por que, em vez de despender tanto esforço dando nó contábil, não investimos na defesa legal do direito? Primeiro, votando em quem não determina o próprio salário, que deveria trabalhar em nome do povo e não em nome do partido (ganhar eleição custa caro à beça!) e, segundo, requerendo deles a conta pelos achados e perdidos nos palanques: acato a justiça da lei, honra e submissão ao ministério civil. Por que permitir que o fisco nos roube o fôlego na produção, no comércio, nas estradas, nos lares, sem esboçar um gesto (em função de medo ou de conforto)? Se nos aplicamos tanto a lesar o compromisso fiscal em nome da abastança, por que não botar o mesmo empenho na obediência à graciosa vontade de Deus? Será preciso exigir que o Estado use os impostos para os fins devidos, provendo justiça pronta e eficaz, segurança, infra-estrutura, proteção da propriedade, saúde, educação e assistência – sem permitir a festança política. Novamente, que sejam processados os ladrões, fisco ou (não)contribuintes.

9. Não dê falso testemunho. Ei! turminha do poder e da força de obra: contas transparentes, hein! Não será muito sacrifício à vista do que temos recebido. Quando pagou o imposto pelos nossos pecados, Jesus não tentou dar um jeito para se safar, mas cancelou, com a taxa de sua vida, o escrito de dívida, que era contra nós (Colossenses 2.13-15). Da mesma forma, nós, que recebemos tão grande testemunho, temos de ter “ficha limpa” para realizar os negócios do Pai celeste. Temos de deixar esse tipo de religião que “não pode dançar”, “não pode vestir assim e assim” e “não pode pagar contas”. Houve um tempo em que impostos maus despertavam zelos; hoje, “eles que reivindiquem muito, que eu desconto na declaração”. Testemunho verdadeiro conta o caso como ele é: os governantes assumem que o jogo está vendido, e os jogadores vestem a camisa. Quem é que vai por um termo no círculo infernal da falsidade?

10. Não cobice. Esse é o resumo de todos os comportamentos acima – mas no coração. Tiago (cap. 5.1-7) prescreveu uma receita rápida para ricos e pobres gananciosos: pode chorar que a dor não passa (obrigado, Chico). Riqueza de corrupção é comida de traça, e, nesse caso, até ouro enferruja. Os bancos da coligação informal, Usura S/A, têm os impostos afrouxados, mas cobram taxas altas para usar o meu dinheiro. Lamentem também aqueles dentre os coletores de impostos que pensam ter o rei na barriga, mas cujo testemunho revela o mau cheiro de suas intenções. Deixa só, que estou clamando diante de Deus, com paciência. Ele, que já rasgou meu escrito de dívida, está ajuntando numa conta os frutos de cobiça dos maus cobradores e pagadores. Não liga não, meu irmão, que Jesus já tirou dinheiro do imposto até da boca de peixe (Mt 17.25-27). A coisa é sair para pescar, pois do outro lado tem peixe a dar com pau (João 21.6-11); tanto peixe que sobra das malhas – e a rede não se rasga! Lembre-se disto: Deus dá toda a riqueza de que precisamos, e sobra para sermos generosos. Deus dá o imposto juntamente com o trabalho. Mas isso não é tudo: Deus está trabalhando o caráter dos seus filhos – e pagamento de imposto ao governo é como o dízimo do Senhor – a intenção é transformar nossa cobiça em criatividade, produtividade, sobriedade e generosidade.

De tudo isso, qual é a resposta direta e prática? Mais prática do que isso? Veja o que Paulo disse:

Pagai a todos o que lhes é devido: a quem tributo, tributo; a quem imposto, imposto; a quem respeito, respeito; a quem honra, honra. A ninguém fiqueis devendo coisa alguma, exceto o amor com que vos ameis uns aos outros; pois quem ama o próximo tem cumprido a lei. Pois isto: Não adulterarás, não matarás, não furtarás, não cobiçarás, e, se há qualquer outro mandamento, tudo nesta palavra se resume: Amarás o teu próximo como a ti mesmo (Romanos 13:7-9).

Wadislau Martins Gomes

terça-feira, fevereiro 15, 2011

CANSAÇO DE POBREZA


Dá para entender como quiser. Já teve o bordão de TV, “detesto pobre”, o quadro do primo rico/primo pobre, no rádio e na telinha, e, hoje, a logomarca do sitcom nacional: “País rico é País sem pobreza”. Mas, qualé? O que eu quero dizer é que há um cansaço de pobre: do pobre, de ouvir tanta promessa vazia; do homem honrado, rico, pobre ou remediado, de ver a exploração da indústria da pobreza; do homem sensível, de ver mal sem remédio; de todo mundo, de se ver explorado pelo engano ou pelo autoengano – uns, pensando que lucram da desdita e, uns e outros, sentindo-se logrados. Como é que a gente deveria entender esse ruído todo, e descansar em uma solução realista com esperança?

Primeiro, será preciso estabelecer essa visão de mundo realista com esperança. Jesus, que rico, se fez pobre, disse: os pobres, sempre os tendes convosco e, quando quiserdes, podeis fazer-lhes bem, mas a mim nem sempre me tendes (Mateus 14.7). Dois aspectos da realidade estão aí:

(a)     Pobreza não é coisa que acaba, pelo menos, neste lado da vida. Isso é fácil de ver, de todo lado. Pobreza e riqueza não são categorias exatas. Um centavo a mais e sou rico e um centavo a menos e sou pobre? Suponha que eu bamburre na fezinha: 500 bi! É muito? Mas é ficção e sonhar não custa. Compro uma casa em Maiame, de frente pro mar, e boto carro de verdade entre eu e a praia. O que não é ficção e sempre custa caro, é que, no dia seguinte, vem um desses tios patinhas da vida e compra a casa do lado. Do dia para a noite sonhei rico e acordei pobre. Outra suposição é mais conhecida: a sanha de lucro imediato: o ladrão rouba de casaca, de colarinho, de camiseta e até de uniforme de presídio; a traça anuncia mais comilança do que o pregão da bolsa, e a ferrugem corrói mais do que as ideologias românticas.

(b)     Jesus não disse que os pobres estariam sempre ali, e que ele queria a atenção agora. O que ele disse foi que, sem ele no coração, nada poderíamos fazer pelos pobres. Confira isso com outro dito de Jesus: Não acumuleis para vós outros tesouros sobre a terra... mas ajuntai para vós outros tesouros no céu...; porque, onde está o teu tesouro, aí estará também o teu coração (Mateus 6.19-21). A realidade é que riqueza e pobreza são afeições do coração, e não, afeitos a conforto e abastança. Tem rico miserável, pobre irado, vice-versa etc., como tem rico e pobre de boa vontade. O que faz a diferença é o contentamento do coração.

A esse respeito, Paulo disse: Digo isto, não por causa da pobreza, porque aprendi a viver contente em toda e qualquer situação (Filipenses 4.11). Não é o caso do estulto de Provérbios 30, que pediu a Deus que não lhe desse riqueza nem pobreza porque, rico, o abandonaria e, pobre, blasfemaria. Como muitos de nós, atolados até o pescoço de tanta miserabilidade rica ou pobre, vamos pedindo baixinho que ninguém faça ondas.

Qual é a solução? Dá uma olhada em Deuteronômio 15.4-5, de onde Jesus citou o “pobres sempre tereis”. A passagem trata da responsabilidade dos pobres e dos ricos em face da realidade de que nem todos têm as mesmas condições nem passam pelas mesmas situações que lhes permitam autossuficiência. Isso é verdadeiro em termos materiais e, muito mais e principalmente, por causa da miserabilidade do coração humano. Assim, Deus trabalhou com o povo hebreu no sentido de arrancar do seu peito a maldita raiz de ganância que bota as ramas da miséria nos corações de pobres e ricos.

O primeiro passo foi o de instituir um imposto “de contentamento”. Nos brasis, em que estamos mais para jaburús do que para bravos, os impostos estão mais para as partes das hienas do que para a nobreza do leão. Não era assim com o dízimo de Deus – nem como é hoje, nas igrejas. O membro do povo de Deus deveria separar 10% dos seus ganhos para, uma vez por ano, levá-lo ao santuário do Senhor. Se morasse distante dele, poderia fazer o câmbio por moeda, em sua cidade, e trocá-lo por produtos, no santuário. Então, vem o que é importante notar: o contribuinte e sua família tinham de proceder a uma refeição de confraternização, diante de Deus. O restante ia para a manutenção do sistema e para a ajuda aos necessitados do povo e, até mesmo, para os estrangeiros. Foi assim que Deus planejou transformar o coração das pessoas, fazendo-os trabalhar para seu próprio sustento e para acudir ao necessitado (cf. Efésios 4.28: Aquele que furtava não furte mais; antes, trabalhe, fazendo com as próprias mãos o que é bom, para que tenha com que acudir ao necessitado.)
               
Você pode imaginar um povo brasileiro de coração transformado (contribuintes e fisco), aprendendo o princípio do imposto? Pode imaginar, com realismo e não como o beatle, um povo contente com o trabalho e com a generosidade? Pode imaginar um sistema de imposto em que nós, de salário minguado, e as indústrias de produtos e de dinheiro, todos pagássemos 15% (olha, hein! É mais do que dízimo)?  Para isso será preciso retirar do coração tanto o conservadorismo quanto a revolução legalistas. O imposto de Deus tinha essa característica que o “dízimo” da igreja de hoje despreza: a cada ciclo de sete anos, quando a terra teria de descansar e não haveria colheita, as dívidas eram suspensas até que viesse nova safra, e o devedor acertasse com seu credor. A cada três anos dentro desse ciclo, o imposto era dedicado ao socorro do necessitado a fim de que ele e a família tivessem suprimento para suas necessidades, e partilhassem aquela refeição contente na presença do Senhor.

                Sei lá como é que o Estado poderia aplicar a verdade de Deus, quando sequer crê nele para usufruir seu contentamento! O que sei é que a chuva e o sol que Deus dá, caem sobre crentes e incrédulos, e que as bênçãos de Deus podem ser estendidas pelos cidadãos do reino de Deus também aos estrangeiros. Se houvesse essa transformação do coração para amar a Deus sobre todas as coisas e ao próximo como a nós mesmos, ninguém sairia no carnaval de ano inteiro, vestido de Dom Quixote na escola de samba de Macunaíma, cantando o refrão: “País rico é País sem pobreza”. Seria mais uma refeição de contentamento na presença do Senhor feita possível para todos, ao som de reco-reco, pandeiro e bandolim: “Feliz é a nação cujo Deus é o Senhor”.

Wadislau Martins Gomes

sexta-feira, fevereiro 11, 2011

MEU AMOR PELO CAMELO

Lá de casa, eu ouvia o carregado sotaque italiano do sacerdote, através do autofalante da igreja: “Tenho certeza que esse casamento vai dar certo e torço para que o amor fique aceso, a fim de que vocês possam habitar juntos”. Então, eu pensei: “aí (tchan!), o contorcionista mental dá um salto, mete os pés na boca e se engole”! Não ria não; poucos pensam de maneira diferente.

No entendimento popular, fé tem o sentido de “poder de um pensamento positivo”, esperança é o mesmo que torcer (por exemplo, pelo Corinthians) e amor significa um desejo que “pega” a gente de paixão. Se fosse assim, a fé seria uma crença e uma confiança no próprio entendimento pessoal, a esperança seria um desejo romântico de que as coisas fossem como imaginadas, e o amor seria um sentimento, no máximo, de autogratificação. Por quê?

Ora, a fé tem de ter um ponto de partida; se esse for o da própria fé, será como o cachorro que corre atrás do próprio rabo. Ninguém jamais se eleva do chão, puxando os cordões dos próprios sapatos. Por sua vez, a esperança é sempre baseada na expectativa de que a realidade do mundo corresponda à “verdade” dessa fé. Se o que se espera não tem base na realidade, será como segurar a chave da porta enquanto aguarda a casa passar nas voltas que o mundo dá. Esse tipo de esperança romântica só sabe esperar, sem certeza de que algo aconteça. O amor, então, é consequência dessa “verdade” e dessa “realidade”. Se formos involuntariamente “pegos” por ele, será como montar um rabo de foguete até que exploda em faíscas coloridas... se não der chabu.

Tudo começa com esse negócio de habitar juntos. Se o amor fosse como querem, as pessoas não teriam de soprar o fogo da paixão que as assalta nem torcer para não chover na fogueira. O poeta não desejaria somente que ele fosse eterno enquanto durasse nem nós mesmos diríamos: “É, o amor acabou” ou “tenho de amar a mim mesmo para poder amar a outros”. Não se trata de habitar em si mesmo (você não é caramujo!), mas com o outro. Uma casa bem construída tem alicerce e telhado. Essa habitação não é uma quitinete divida para dois. Habitar é morar na mesma vida, fazê-la hospitaleira para o outro. Habitar junto é mais do que estar junto; como diz minha alma caipira, “a gente se achega junto para pensar, conversar e fazer a vida”. Eu sei que pensar é algo que dói, que conversar é como parir ideias, e que atuar em favor do outro em detrimento de si mesmo é como oferecer o último pedaço de goiabada com queijo. Mas Deus mesmo é o ambiente de nossa habitação, e isso faz tudo mudar de cenário.

Nele [Deus] vivemos, e nos movemos, e existimos... que fez o mundo... de um só fez toda a raça humana para habitar sobre toda a face da terra (Atos 17.28,24,26); E plantou o Senhor Deus um jardim... e pôs nele o homem (Gênesis 2.8); Quem, Senhor, habitará no teu tabernáculo? Quem há de morar no teu santo monte?  (Salmo 15.1); E o Verbo se fez carne e habitou entre nós (João 1.14); Não sabeis que sois santuário de Deus e que o Espírito de Deus habita em vós (1Coríntios 3.16)?”

Quando o apóstolo Paulo escreveu o poema do amor melhor do que o sino, maior que do que o monte e mais quente do que a fogueira (ver 1Coríntios 13), depois de dizer que o amor atua e jamais acaba, terminou com esta expressão: Agora, pois, permanecem a fé, a esperança e o amor, estes três; porém o maior destes é o amor (v. 13). No conceito da passagem bíblica, esses três termos – fé/esperança/amor – formam uma unidade inseparável e sem diferentes graus de valor (logo você vai saber por que o amor foi enfatizado).

 Lá no fundo do coração de todo mundo, consciente ou inconsciente, palpita uma crença básica de que alguma verdade existe (até mesmo, a crença de que não exista nenhuma verdade absoluta é uma crença básica). Não é um salto mortal tentativo, mas uma crença ou uma descrença que fornece chão firme para a vida. Essa crença tácita é aquilo que é chamado de . Para ilustrar o sentido do termo “tácito”, é como quando você acorda, ainda carregando o peso do sono, e não para e pensa: “Será que eu me acordei ou acordei meu irmão?” Nem é preciso olhar no espelho; você tem fé que é você mesmo. Também não vai pela casa, se perguntando se as coisas são reais ou se são sonhos... senão a água não ferve e você fica sem café. Você sabe que alguma coisa existe, especialmente, se tropica no banquinho.

Pois é, essa fé, consciente ou inconsciente no coração de crentes e incrédulos, é um movimento para o alto, em busca de duas coisas principais. (a) Uma ideia de Deus (ou ele existe, com todas as implicações na vida, ou não existe e, aí, a gente é que se implica); o que não dá para evitar é o fato de que crer ou não crer é um ato de fé (ver Romanos 1.18-32; Hebreus 11.6,3). (b) Uma ideia de tempo sem fim; sabemos que a morte é certa, mas será que dá para mais umas respiradas? Dez anos, vinte? No fundo do coração, nós bem que queríamos permanecer. Não dando, porém, sempre poderemos virar nome de rua ou de escola municipal (ver Eclesiastes 3.11). O certo é que essa fé – que busca alguém ou alguma coisa além de nós mesmos e além do tempo – habita o nosso coração. E nosso coração procura lugar em que habitar (Salmo 84.3-4). Quando alguém é chamado para habitar “em Cristo”, sua fé é vivificada pelo Espírito Santo e se torna a certeza de coisas esperadas, porque reveladas, e convicção de fatos que explicam a aparência de tudo que é visto por olhos humanos (Hebreus 11.1).

No mesmo lugar do coração, os óculos da esperança observam a vida e o mundo e segundo o que ela crê, assim vê e assim espera. Se as coisas não forem como se crê, então, os óculos não bastarão para reconhecê-las. Será como disse o cético, considerando o camelo, no zoológico: “Esse bicho não existe”. Eu, por exemplo, “amo” camelos. Já escrevi até poema para um deles: Tem lá suas manias / como todos os camelos que conheço / com a mesma função que o meu/ numa casa que me encerra / que me enterra e me agita / e ressuscita... (O camelo, 1971). Só quem não tem olhos para essa beleza de camelo interior é que o acha feio! Se habitarmos no Senhor, toda a sua criação espelhará a beleza do criador (até mesmo, eu e meu camelo!).

Realmente, encarapitado na raiz do nariz, os óculos enfocam linhas, sombras e cores, tal como a esperança interpreta o mundo aos olhos da fé. A esperança é, portanto, um movimento para dentro. É o espelho que reflete a luz que a todos esclarece (ver 1 Coríntios 13.12; João 1.4-5) e a luz da glória que a tudo ilumina (Salmo 19.1-4). Essa esperança anseia pelo conhecimento da realidade aí fora; quer saber o sentido do mundo, dos outros e da própria vida. De onde vem a esperança que alenta o filho, o pai e o avô? Que dá força na fraqueza e enfraquece a prepotência incrédula? Que prossegue, positiva ou negativamente, quando tudo mais acaba? De onde, senão da fé? E para onde vai a esperança? Se não for a esperança que provém da fé será para o desespero. Mas a esperança da fé tem um objeto (é como dar um beijo na namorada – estando ela presente!).

Aqui é que se explica a grandeza do amor. As afeições do coração brotam da fé alçada, recolhem no lago da esperança as águas que chovem sobre crentes e incrédulos e, em seu tempo, dão de beber amor ao mundo e às gentes sedentas. Amor não é um sentimento, nem inato nem aprendido – e se ele existe como sentimento é só por que sua dádiva mexe com o coração. A fé atua pelo amor e a esperança coerente o motiva à ação. O amor é a atuação da bondade movida pela esperança de que todas as coisas sejam como o coração crê (ver Gálatas 5.6). É um movimento para fora. Amor é crer no coração que alguém fora de nós vale a pena de ser conhecido, e é capaz para receber nosso afeto e nosso empenho. Quem não crê em Deus como ele quer ser crido (Hebreus 1.1-4) não tem esperança de conhecer ou de ser conhecido e, assim, em vez de atuar em amor, deseja apenas ser amado e sentir o gosto da fruta roubada. (ver Romanos 5.1-5). Mas aquele que ama a Deus também ama ao que é criado por Deus (1João 2.8-11).

De tudo, o que fica, é: o amor é a finalização da fé expressa na esperança e, por isso mesmo, é maior, pois é a expressão da verdadeira fé, da real esperança. Tanto é assim, que a única maneira para saber o que cremos realmente, é pela constatação de nossa expectação de vida por meio de nossa atitude e comportamento. Não podemos fugir a esta verdade: fazemos segundo o lugar em que habita nossa fé, o que cremos fica patente naquilo que esperamos, e o que cremos e esperamos é sempre traduzido naquilo que fazemos. Círculo vicioso? Não, antes, círculo virtuoso! (Eu “amo” o “meu” camelo porque creio que ele foi criado pelo Deus que me fez e me amou, e que me deu a esperança para amar todas as coisas e aprender o dom de seu amor. Eta! camelo importante entre as ricas bênçãos do Senhor; ver Gn 24.35.)

Wadislau Martins Gomes

segunda-feira, fevereiro 07, 2011

ACONSELHAMENTO E PORCO NO OMBRO

Aconselhamento, essa palavra comprida demais para “pegar” tem sido usada, aqui na terrinha, como sinônimo de psicologia de “meia sola”. Psicólogos e psiquiatras, psicanalistas pastores e uma multidão de seguidores da plausibilidade só aceitam por que é a gente que fala, mas olham com cara de quem viu bicho sem cabeça. Na verdade, o termo conselheiro é muito usado para descrever funções em diversas áreas: tutela, autarquias, psicologias, em Machado de Assis, nomes de ruas, – e bota conselho nisso. No entanto, que negócio é esse de aconselhamento cristão? Teologia aplicada? Psicologia aplicada? “Uma mão lava a outra?”

Para dizer o que é e o que não é aconselhamento cristão, primeiro será preciso ver o que vem antes do termo, isto é, antes da descrição funcional. De modo geral, aconselhamento é um termo que sinaliza um relacionamento pessoal. Isso, a menos que você goste de conversar com seus botões; daí, você tem um conselheiro, precisando de aconselhamento. Portanto, aconselhamento envolve pessoas e palavras; e pessoas e palavras são os grandes motivadores de pessoas – primeiro Deus e sua palavra e, segundo, nós e nossas palavras.

Ora, quando você se aproxima de mim, deve haver um propósito e algo para conversar, se não, fica meio engraçado (na fila do cinema ou na porta do elevador, a intenção é clara). Até mesmo o “oi, tudo bem” tem um propósito consciente ou subconsciente baseado em uma visão da vida. É toda uma estrutura de pensamento, umas “de nascença” e outras, aprendidas: Deus (Romanos 1.18), eternidade, beleza e desejo de saber (Eclesiastes 3.11), e, de maneira particular para nós, aqui, uma autoconsciência (1Coríntios 2.11a). No contexto dessa última referência há informações interessantes: (a) essas coisas são reveladas por Deus, o qual não pode ser conhecido a partir da observação humana (v. 10); (b) há dois tipos de estrutura de pensamento, a saber, o do Espírito de Deus e o do espírito do mundo, sendo que o primeiro tem condições para discernir os dois, e o outro não pode entender o que é revelado (v. 12-16).

Portanto, aconselhamento cristão é uma construção do pensamento sobre uma base de conhecimento, como Salomão descreve em Provérbios 8.1-30: conselho e sabedoria são coisas de cima, eternas, e também do dia a dia, das ruas, que podem ser intencionalmente vistas ou ignoradas. Um ladrão de porco foi pego no ato, e interpelado: “Que é isso aí no seu ombro?” Com um olhar para o lado, o matreiro foi pronto: “Ai! Tira esse bicho daí”. Verdadeiramente, o conhecimento de Deus e o que a pessoa tem de si mesma está aí, no ombro da gente. É coisa pessoal. O texto acima referido diz: Meu é o conselho e a verdadeira sabedoria, eu sou o Entendimento, minha é a fortaleza (v. 14). “Eu sou” foi a expressão que Deus usou para se descrever a Moisés, em Êxodo 3.14, e, em Atos 5.38-39, o mestre judeu não cristão disse que o conselho de Deus entre os homens sempre permanece, mas os dos homens não tem permanência. Assim, esses textos apontam para o aconselhamento como sendo entendimento em ação no relacionamento do homem com Deus, refletido no relacionamento entre os homens.

O relacionamento entre Deus e os homens e entre os homens decorre do conhecimento, mas não é baseado nele. De fato, é anterior a ele. Vem do coração (figura usada na Bíblia para descrever o amado e a totalidade da pessoa). É importante notar como o Sábio, em Provérbios 4.20-27, identifica as fontes do coração com os atos do corpo. Essa distinção do coração é significante por duas razões: mostra que nossa escolha por uma linha de aconselhamento é coisa do coração, antes de ser intelectual, e que nosso propósito é atender à sabedoria de Deus ou de provar a sabedoria segundo o mundo (cf. 1Coríntios 1.18-31).

Paulo enfatizou esse aspecto, dizendo que Deus tem um propósito e faz todas as coisas conforme o conselho da sua vontade (Efésios 1.11). As pessoas, criadas por Deus, refletem essa disposição relacional e, sobre isso, o Sábio de Provérbios também disse que sem conselho fracassam os projetos, mas com bons conselheiros há bom êxito. O homem se alegra em dar resposta adequada, e a palavra, a seu tempo, quão boa é! (Provérbios 15.22-23). Dessa maneira, aconselhamento é parte da função humana quantos às relações do mundo do homem interior (coração) com o mundo exterior (você nunca receitou um melhoral contra dor de cabeça?). Dado que o coração humano, por coerência, só poderá ter dois movimentos, de amar a Deus ou de odiá-lo, os aconselhamentos humanos só podem exibir direcionamento bondoso ou malicioso. Paulo disse assim: existe um caminho, trilhado por aqueles que obtiveram vida por meio da obra de Jesus Cristo, que é caracterizado por obediência e amor a Deus que lhes permite agir com misericórdia para com o próximo; existe outro caminho, em que estávamos e em que muitos continuam, o qual é segundo o curso deste mundo, segundo o príncipe da potestade do ar, do espírito que agora atua nos filhos da desobediência (cf. Efésios 2.1-10).
As questões são estas: Como andar com o coração no caminho da vida, se os pés – e os olhos, os ouvidos, a boca e as mãos, ainda contemplam os caminhos deste mundo? O que é que temos sobre os ombros: a vocação e a fé na força que Deus supre ou um porco que pretendemos ignorar, mas que está aí, à mostra?

Onde está posto aquilo que é o tesouro do nosso coração, pois Jesus disse: onde está o teu tesouro, aí estará também o teu coração (Mateus 6.21).  Os aspectos que devem ser considerados nem sempre estão claros para todos, mas certamente estão envolvidos, em algum nível de consciência. A resposta tem dois aspectos: o segundo é que temos de saber quem somos e quem são os outros (senão, seremos cegos, guiando cegos); e o primeiro, que quem somos depende do que pensamos sobre Deus. Esse é o discernimento necessário para o bom aconselhamento, como o salmista divinamente inspirado cantou em prosa e verso, no Salmo 1 (interessante, exatamente o primeiro): [o conselheiro] bem sucedido não anda no conselho dos ímpios nem se detém no caminho dos pecadores nem aprova os escarnecedores do conselho de Deus (ver Salmo 14.6); o futuro de um é frutífero, o dos demais é palha no vento – e um e outros prestarão conta a Deus de suas andanças.

Quanto aos que se aborrecem de Deus, a Bíblia é clara em dizer que não temos de nos preocupar, pois Ele apanha os sábios na sua própria astúcia; e o conselho dos que tramam se precipita (Jó 5.13). Meu foco, aqui, são aqueles que, dizendo-se cristãos, deixam-se levar por psicologias só humanas, dos quais Deus diz: Porque o meu povo é gente falta de conselhos, e neles não há entendimento. Tomara fossem eles sábios! Então, entenderiam isto e atentariam para o seu fim (Deuteronômio 32.28-29). A diferença entre o conselho de Deus e o dos homens foi expressa por um judeu não cristão, acadêmico professor de Paulo: se este conselho ou esta obra vem de homens, perecerá; mas, se é de Deus, não podereis destruí-los, para que não sejais, porventura, achados lutando contra Deus (Atos 5.38-39).

Quanto a nós, que sabemos que nada poderemos saber se Deus não nos manifestar, Jesus, a manifestação de Deus, aconselha que compremos: ouro refinado pelo fogo, que é a Palavra de Deus, a fim de compor nosso tesouro; vestiduras alvejadas em seu sangue para que não seja manifesta a vergonha de nossa nudez, e colírio para ungir os olhos, a fim de que vejamos com clareza (Apocalipse 3.18; ver 7.14). Deus ordenou claramente, por meio do profeta, que déssemos ouvido à sua voz, acatando o pacto de ele ser nosso Deus e nós, o seu povo; esse compromisso do coração tem um rumo (andai em todo o caminho que eu vos ordeno), uma promessa (para que vos vá bem) e uma advertência: os que não deram ouvidos, mas  andaram nos seus próprios conselhos e na dureza de coração, esses andaram para trás e não para diante.

Essas coisas são mais antigas do que andar para frente e, no entanto são novas como sapatos fortes em pés bonitos (Quão formosos são os pés dos que anunciam coisas boas! Calçai os pés com a preparação do evangelho da paz – Romanos 10.15 e Efésios 6.15). São coisas do coração, antes de na cabeça, nos pés, nas mãos. No entanto, muitos de nós preferimos seguir a cabeça de homens que andaram para trás, para as velharias, porque nosso coração está com eles. Aquilo que chamamos de pesquisa científica moderna não é verdadeira ciência, sabedoria. Antes, é baseada na intuição de um coração rebelde que deseja retirar Deus do mundo que ele criou para, em troca, governar seu próprio ser decaído, rebelde, dissoluto, contencioso, e governar o próprio mundo.

Assim é que todas as psicologias – com pressuposições e métodos divergentes, contraditórios, brotam do abandono da matriz psicológica que Deus criou à luz sua imagem, para outras que jamais encontraram suporte empírico inequívoco. São teorias sem base senão as das observações – às vezes, geniais sim, mas ainda sem comprovação – de homens cuja imagem original se encontra distorcida, observando reflexos distorcidos, em espelho embaçado.

Não estou dizendo que todo estudo secular seja sem sentido, mas que esse ouro precisará ser refinado no fogo da Palavra de Deus para livrá-lo de muita ferrugem, terra e palha; o laboratorista precisará de vestes purificadas no sangue de Cristo a fim de não contaminar o processo; e o observador precisará de colírio da luz da comunhão com Deus para clarear a vista. Noutras palavras, se não usarmos o conselho de Deus como crivo para exame das teorias de homens (que, pela graça comum, recebem genialidade tal como recebem chuva e sol) não poderemos fazer mais do que disfarçar o porco no ombro por meio de enfeitá-lo com um piercing no focinho (cf. Pv 11.22).

Para aqueles que descobrem que o relacionamento de ajuda é mais do que ação humanitária, vindo do propósito de Deus ao coração humano, e que brota do coração do homem para o coração do outro, o aconselhamento é como óleo na ferida e docilidade e alegria para a alma (Provérbios 27.9). Esse propósito pessoal não é somente psicológico, social ou antropológico – ele é centrado na Pessoa de Cristo, em quem habita o Espírito do Senhor, o Espírito de sabedoria e de entendimento, o Espírito de conselho e de fortaleza, o Espírito de conhecimento e de temor do Senhor (Isaías 11.2).

Wadislau Martins Gomes

quinta-feira, fevereiro 03, 2011

DE PALMAS E PALMADAS



O filho botou o pé na soleira da porta e olhou de rabo de olhos para checar minha atenção. Dei uma franzida na testa que deveria ter soado como apito de advertência para o trânsito. O pequeno, com o meu mesmo cenho, cabeça baixa como despercebido, avançou o pé para fora da soleira. A transgressão era grave. O sinal de ultrapassagem proibida estava enroscado na cabeça como se estive no umbral. Ah! Não houve titubeio nem contar a até três: lá foi a palmada no acolchoado sem rabicho. Anos depois, o menino amadurecido acompanhava a irmã na volta da escola, quando, ao atravessarem a rua, apareceu um carro dirigido por um desses “sem palmadas”. Do alto da escada, gritei: Para! O “com palmadas” deteve a irmã a centímetros do infortúnio. Palmas para a palmada!

Hoje, dei de cara com a notícia: deputados da nova legislatura declaram suas posições sobre punição de pais que adotam castigos físicos a criança e adolescentes (http://www.hojenoticias.com.br/tecnologia/punir-pais-que-batem-nos-filhos-140-deputados-a-favor-207-contra/ 29/01/11). Palmas para os 207 contrários e palmadas nos pais dos 107 favoráveis. É, não é fácil não. A conhecida como “lei da palmada”, do ECA, alterado no art. 18, é matéria para ser discutida na esfera de autoridade da família e não decidida por uma sociedade anônima. Família tem nome, sobrenome e domicílio conhecido. Não tem essa de filho da nação nem mãe do estado. Isso é conversa de “sem palmada”. No entanto, essa é minha opinião, não minha argumentação. Essa última, a visão objetiva, tem perguntas para as quais só há uma resposta. Primeiro, as perguntas:

a) O Estado decide quais sejam os direitos do indivíduo identificável em nome de uma sociedade de quem só se ouve gritos na turba: “Meus direitos, deveres dos outros”? (Você já pensou que seríamos bons vizinhos, se nós pensássemos mais em termos de “meus deveres e direitos dos outros”?)
b) O Estado assume a responsabilidade de educar os filhos, ditando aos pais o mérito e o método da educação, enquanto furta aos pais a autoridade pátria e os meios para a disciplina? (O que é pretendido – que filho seja bom cidadão sem noção da autoridade necessariamente gerada no relacionamento familiar?).
c) Quem pregava a revolução armada, agora, vai dizer que toda dor é má? (Não, não sou sádico nem masoquista; a questão é que, se parar de sentir dor, eu viverei uma experiência como de hanseníase, incapaz de prevenir danos físicos; e, ainda, insensível à dor dos outros. Dores são amigas quando controladas por um espírito gracioso, honesto.)
d) O Estado não ensina aos pais, mas poderá puni-los se não lerem a cartilha dos desarmamentos e da submissão à ditadura da “lei do ventre livre com efeitos retardados”? (Lembre-se de que a Lei Áurea foi desdobramento político da Lei do Ventre Livre, que jamais produziu liberdade; a verdadeira liberdade requer remissão mediante preço e restauração efetiva.)

A resposta, como eu disse, é uma só: recompensa e punição somente serão instrumentos efetivos se forem realmente afetivos.

A realidade de tal disposição afetiva é coisa do coração e não poderá ser apreendida sob influência do ambiente, quer material quer social. Indivíduos são as pinceladas corretas que compõem a beleza do quadro. Por isso, quando Deus diz por meio do autor de Hebreus (ver Bíblia), que uma nuvem de testemunhas nos rodeia, não fala de um conjunto nebuloso e amorfo, mas de pessoas e de relações interpessoais (v. 12.1; ver cap. 11). Especialmente, a Bíblia diz que, estimulados pelo exemplo de fé e disciplina dessa sociedade, o indivíduo deveria se desembaraçar de todo peso e pecado, a fim de correr com perseverança a boa carreira proposta. Contudo, que carreira?

Como a coisa é pessoal, Hebreus diz, ainda, que a boa carreira é aquela em que olhamos para nosso Criador, o Verbo Jesus (12.2). Ele ditou que, neste mundo de servidão (a homens, ao dinheiro, ao poder, ao prazer, ao egoísmo etc.), a remissão só ocorre com base em sua obra de encarnação, vida de obediência, morte, ressurreição e ascensão. E disse mais, que seria necessário que sofresse a dor do aguilhão do pecado em nosso lugar a fim de que, para nós, conquistasse a vitória e garantisse a perseverança (12.3). Vitória sobre o quê? Permanência em quê?

Certamente, vitória sobre tudo que é mau e perseverança em tudo que é bom. Mal é todo comportamento que não procede dos bons propósitos de Deus para nossa vida e bem é todo ato de culto racional traduzido em obediência à bondade de Deus (ver Romanos 12.1-3). Assim, Hebreus diz que ainda não temos dado o sangue para viver por aquele que deu seu sangue por nós, da maneira como vivido para os compromissos com homens e coisas (12.3-4). Assim, vamos desmaiando em nossas almas diante de crimes e abusos, social e economicamente descriminados, em uma carreira de direitos que não podem ser cobrados e deveres a que não nos dispomos. “É para a disciplina que" perseveramos (12.7), a fim de sermos como aquele que nos criou para sermos à sua imagem (12.10b).

Por isso, Hebreu continua, dizendo que não podemos nos esquecer que Deus nos trata como filhos, e que, quando somos reprováveis, ele nos corrige, pois, de outra forma não haveria afeição genuína (12.6). Quem não é corrigido não é filho, é bastardo (12.8). Finalmente, o Espírito Santo diz que, por que dói, a disciplina não parece ser motivo de alegria, mas que seu fruto é de justiça e de paz (12.12) – como manga madura chupada no pé, da árvore que meu pai plantou.

Uma pergunta dentro da resposta é: “Mas tem de doer?”. Não; nem sempre. Há o que cai da bicicleta e precisará de encorajamento e disciplina para montar de novo a magrela; há o que rouba bicicleta e uma repreensão poderá ser disciplina bastante. Mas, até que amadureçamos, quer aos seis quer aos sessenta, nossa falta de capacidade de abstração para o mal será tão grande que não aprenderemos suas consequências a não ser por meio de uma dor. Se o piloto de velocípede começar a roubar bicicleta, precisará de disciplina mais severa, senão, o tombo será pior. Nesse caso, a dor de uma palmada quase sempre reflete na consciência e cria grandes ciclistas.

O Sábio de Provérbios diz que os pais deveriam “criar um gosto” pelo caminho em que os filhos deveriam andar e, assim, eles perseverariam nele (22.6). Na mesma linha, Paulo diz que os pais não deveriam criar um senso de injustiça no coração dos filhos; e, da mesma forma, os filhos deveriam honrar aos pais e obedecê-los (Efésios 6.4). O problema é que, pretendendo criar filhos em um ambiente de irrestrito conforto e ausência de dor, criamos neles um gosto pela reivindicação de direitos sem nenhum compromisso com a verdade – que dizer com a própria lei! A disciplina paterna não somente retira a estultícia, mas concede saberia, e quem não a recebe vem a se envergonhar dos pais. (ver Provérbios 13.14; 29.15.)

É claro que ninguém deve dizer, com falsa piedade: “Meu filho, uso palmadas porque o amo”. Nós disciplinamos por que amamos. A palmada é um instrumento que repreende e ensina o resultado da transgressão, como símbolo da dor maior a ser evitada. Em Provérbios 23.13,14 diz ainda que a disciplina dentro dos limites da afeição, sem abuso, não só não mata quanto dá vida.

Daí, dá para ver por que é que creio que não é missão do Estado dar palmadas nos pais que bem procedem e que é missão dos pais aplicar palmas e palmadas aos filhos, segundo a necessidade e regras do bem querer. É missão do Estado, sim, dar palmas e palmadas aos pais que obedecem ou transgridem a lei, abusando ou não exercendo corretamente o poder pátrio. Mas, veja bem: palmada afetiva não configura abuso. O Estado, sim, comete abuso quando vai contra a lei de Deus. Palmas à palmada e palmada no de quem a retém.

Wadislau Martins Gomes